Como as Redes Sociais Afetam Nossa Sociedade

Ele me pergunta o dia inteiro no que estou pensando. Pede pra enviar fotos bonitas e selfies bem feitas. Rastreia minha localização. Me manda mensagens o tempo inteiro e sempre faz chamadas de vídeo. Vive perguntando o que está acontecendo, quer saber da minha rotina, onde estou, o que estou comendo, com quem estou saindo e qual é minha opinião sobre todos os assuntos do momento.

Este poderia ser o depoimento de uma moça a respeito de um relacionamento abusivo. Mas, não. É apenas uma descrição de como ocorre o uso comum dos aplicativos Facebook, Instagram, Whatsapp, Telegram e Twitter, respectivamente. Pensando bem, não deixa de ser um relacionamento um tanto quanto abusivo, não acha? Sem que percebamos, o controle e o registro de nossos dias está disponível nas redes sociais como um diário escancarado, com ou sem filtros, do tipo que não mostraríamos para ninguém além de nosso círculo de intimidade, se não fosse pela tela do computador ou do celular. O custo desta relação “ferramenta versus usuário” tem sido alto, mesmo que não percebamos.

Como já foi tratado no primeiro artigo desta série, é superficial demonizar as redes sociais. A sociedade não é como é ou está como está por culpa da tecnologia, da internet e das redes sociais. Todo e qualquer efeito que incide sobre a sociedade é, em primeiro lugar, decorrente da degradação espiritual, física, mental e emocional causada pelo pecado. Sendo assim, devemos atrelar o mau uso das redes, seja em relação a vícios, manipulação ou busca por aprovação, a este inimigo mortal que a todos privou da glória de Deus (Romanos 3:23).

Dito isto, gostaria de abordar duas áreas que sofrem severos efeitos colaterais das redes sociais na sociedade do século 21: relacionamentos e motivações.

A ótica do que é comunidade

Chamath Palihapitiya, ex-alto executivo do Facebook, confessou que as ferramentas desenvolvidas por meio das redes sociais estão dilacerando o tecido social. “É um problema global, está corroendo as bases fundamentais de como as pessoas se comportam consigo mesmas e com as outras”. É muito curioso que um dos responsáveis por aumentar o número de pessoas que usam as redes sociais tenha chegado ao ponto de admitir que as interações humanas estão limitadas a corações e polegares para cima (símbolos utilizados no Instagram e no Facebook, respectivamente, para o botão “curtir”). 

Os relacionamentos adquiriram um formato líquido, passageiro, instantâneo. Podemos nos conectar com pessoas de todo o mundo, visualizar fotos pessoais de alguém que acabamos de conhecer, ao passo que também é possível excluir alguém da lista de contatos com apenas um clique. Passamos a validar nossa vida, nossa família, nossas escolhas e até nossa comida pela quantidade de curtidas e visualizações de nossos posts. Privacidade é um conceito que passa longe do ambiente virtual, mesmo com as atuais iniciativas de proteção de dados.

De acordo com a Bíblia, fomos criados para viver em comunidade. Somos seres relacionais e herdamos essa característica do próprio Criador, o Deus triuno. Em toda a Escritura há comandos diretos e inquestionáveis a respeito do amor, do cuidado e do perdão. Mas, o que tem acontecido na prática? Estamos discutindo uns com os outros, validando-nos pela opinião dos outros, comparando-nos com os outros, idolatrando e cancelando uns aos outros. Em um grupo de whatsapp, se alguém responde à mensagem de outra pessoa e não comenta sobre a mensagem de “bom dia” que enviamos, nos sentimos excluídos e menosprezados. Nosso senso de comunidade está distorcido e corremos o perigo de nos tornarmos frágeis demais para interagir.

Como um amigo sempre me lembra, às vezes o óbvio precisa ser dito. Por mais vantajoso que seja utilizar o Facebook para “fazer amigos”, nós precisamos de amigos reais para viver uma vida real. Independente do número de seguidores no Instagram e no Twitter, são as pessoas de carne e osso que irão nos socorrer em uma emergência médica, e não os algoritmos do nosso último post. 

Ser e fazer parte de uma comunidade é mais do que concordar com determinado posicionamento ou opinião. Na verdade, nem é sobre concordar em tudo, e sim sobre amar e respeitar acima das diferenças. Não se trata de “nós x eles”, mas sim de “nós precisamos uns dos outros”. Essa ótica só é adquirida quando trocamos o “tela a tela” pelo “face a face”. Tony Reinke, autor do livro “12 Maneiras Como Seu Celular Está Transformando Você”, trata desse aspecto quando diz que “nossos dedos que digitam não sentem empatia na ausência de rostos vivos diante de nós. É mais fácil caluniar um avatar online que um irmão na vida real. 

No momento que este artigo é escrito, o Brasil está enfrentando um momento de extrema polarização de ideias, desde a política até a forma de disciplinar os filhos, passando também pelo que é feminilidade à luz da Bíblia. Como é que podemos adquirir uma ótica equilibrada no meio dessa constante guerra de opiniões? Creio que seja lembrando que, do outro lado da tela há uma pessoa feita à imagem e semelhança de Deus, por quem Jesus morreu, dotada de sentimentos, pertencente a uma família, que luta com dilemas e enfrenta problemas no dia-a-dia.

As lentes das redes sociais não são o espelho da vida real. A pessoa que admiramos é pecadora; não devemos idolatrá-la. A pessoa que nos irrita com suas opiniões e posicionamentos públicos, é amada por Deus; não devemos odiá-la ou difamá-la. A vida em sociedade pode ser menos pesada quando encaramos dessa forma, não é?

As motivações na interação social

Um artigo publicado em 2016 por Jacob Weisberg, no site The New York Review of Books, apresentava os seguintes dados: os americanos gastam, em média, cinco horas e meia por dia com mídia digital, sendo mais da metade desse tempo em dispositivos móveis. Após sair da cama, verificamos nossos telefones 221 vezes por dia. Passados 5 anos da publicação deste artigo, os números não devem ter diminuído, concorda?

Me pergunto, então: por que fazemos o que fazemos? De onde vem a necessidade de checar a vida de um desconhecido, de saber como foi o dia de nosso colega de trabalho, de acompanhar uma live sobre um assunto que pouco nos interessa, mas que será tratado por alguém que admiramos? O que é que tem motivado a sociedade a agir como age?

Bem, não há uma resposta exata. Cada indivíduo tem sua própria motivação para fazer o que faz, e a própria Palavra aponta para isto: “O homem bom, do bom tesouro do seu coração tira o bem, e o homem mau, do mau tesouro do seu coração tira o mal, porque da abundância do seu coração fala a boca” (Lucas 6:45). Não temos a obrigação de sempre dar nossa opinião sobre o assunto do momento para que nossa conta no Instagram permaneça ativa. Não precisamos twittar sobre a polêmica do dia só porque está nos trending topics. Entretanto, não há como negar: as redes sociais têm potencial manipulador.

Quando comecei a refletir sobre o tema central deste artigo, me deparei com um dilema: tudo está mudando tão rapidamente que é difícil definir o estado atual de nossa sociedade. Mais mudanças ocorreram nos últimos 30 anos do que nos 100 anos anteriores, e esse cenário completamente instável nos induz à instabilidade também. Em um dia, concordamos com determinado posicionamento e não é incomum que no mesmo dia mudemos de opinião ou discordemos da pessoa que nos inspirou algumas horas antes. Estamos, definitivamente, na era da “sociedade da areia movediça”.

Além do mais, não é novidade dizer que as redes sociais nos oferecem lentes distorcidas. Vemos aquilo que querem nos mostrar ou aquilo que querem que acreditemos. Há momentos em que chego a pensar que vivemos em uma época boa, em uma sociedade evoluída de pessoas bem resolvidas. A tecnologia nos trouxe benefícios maravilhosos e realmente parecemos caminhar em direção a um mundo mais consciente e menos injusto. Porém, basta olhar para a Palavra para “cair na real” e perceber que há um grande holofote alertando: o mundo está no maligno (1 João 5:19). Por trás das lentes distorcidas das redes sociais, há uma sociedade egoísta e absolutamente rebelde. Não nos falta mais igualdade ou evolução intelectual. Nos falta mais temor pelo Eu Sou, o Deus que não muda quando a sociedade muda.

Na Bíblia, quando Deus se apresenta como Eu Sou, a mensagem é clara: Ele está acima das circunstâncias, do tempo, do espaço, da pessoa com quem está falando e de qualquer poder que se apresente em determinada situação, seja uma calamidade ou um ser tomado por maldade. Sua definição é tão suficiente que não há espaço para refutações. Se Eu Sou diz, nós ouvimos. Ele é a voz acima de qualquer outra, é a autoridade em qualquer assunto e completamente digno de nossa atenção.

Talvez nosso maior dilema seja este: o que nos faz presas fáceis é a falta de discernimento sobre quem Deus é e quem nós somos, o que queremos, onde queremos chegar e a quem devemos nosso amor e devoção. A boa notícia é que não estamos em um caminho sem volta. Há uma luz no fim deste túnel sombrio. Ou melhor dizendo: o Pai das luzes está aguardando nosso regresso.

No mundo que não pára de mudar, podemos confiar no Deus que era, é e sempre será. Para além das telas ofuscantes que nos causam insônia e vício, está o Pai das luzes, em quem não há mudança nem sombra de variação (Tiago 1:17).

Irmã, não é tarde para nadar contra a maré. O Mestre nos faz o convite. Vamos atender ou continuar O colocando no silencioso?


Esse post faz parte da nossa série de postagens de Outubro com o tema “Redes Sociais”. Para ler todos os posts clique AQUI.