Como as Redes Sociais Afetam Nossa Produtividade
Inicia-se mais uma semana. Você pega sua agenda ou lista de tarefas do dia e, na esperança de ser produtiva, acorda cedo para cumprir com seus horários e metas estabelecidas. Toma um belo café, senta-se à mesa para fazer seu devocional da manhã, e de repente seu celular toca. É sua amiga lhe desejando um excelente dia, mas também lhe perguntando sobre como foi seu final de semana e, então, vocês passam uma hora conversando por meio do aplicativo de mensagens instantâneas, o famoso WhatsApp.
Depois da longa conversa, você não conseguiu concluir seu devocional e percebe que já é hora de organizar a casa para em seguida preparar o almoço. Você organiza os materiais para uma rápida limpeza, dispõe o balde com água e algum produto, a vassoura, o rodo, um pano de chão, coloca seu avental para proteger a roupa e decide começar varrendo a casa, mas seu celular toca e você vê que recebeu uma mensagem no direct do seu Instagram.
É um amigo te enviando um daqueles reels engraçados, super divertidos com algum meme retratando alguma situação cotidiana. Você visualiza, ri muito e curte aquela publicação. Em seguida decide ver quantas curtidas recebeu naquela foto da viagem que você fez no sábado, responde a alguns comentários, decide em seguida olhar os stories, depois volta ao feed e começa a deslizar o dedo na tela fazendo aquele loop infinito.
E então? Você não limpou a casa, atrasou o almoço, ficou com uma leve dor de cabeça pela exposição demorada à luz da tela do celular e, o pior, depois tornou a olhar o celular mais uma e outra vez. O dia passou e você não conseguiu cumprir com sua lista de tarefas, deixou de ler aquele livro que queria tanto ler, não estudou para o exame da sua graduação, deixou de desfrutar um momento com sua família e… antes de dormir ainda deu mais uma olhada nas redes sociais e só foi conseguir dormir, de fato, de madrugada.
Seja no trabalho ou em casa, no trânsito ou (ainda mais triste) em um passeio com os amigos e a família, lá estamos nós, deixando de ser produtivos e presentes para nos distrair com as redes sociais. Ao final do dia, nos sentimos muito mal e a sensação de que fomos improdutivos aprofunda nossa culpa.
Isso quando não nos distraímos com as redes sociais apenas para não termos que lidar com atividades (do trabalho, físicas, acadêmicas, do lar), que julgamos difíceis de realizar, entrando em um ciclo maléfico de procrastinação e buscando refúgio nas redes sociais, nas conversas pelos aplicativos de mensagem instantânea, ouvindo alguma playlist de podcasts no Spotify ou assistindo a um vídeo que o YouTube recomendou como uma forma de recompensa ou alívio pelas tarefas difíceis ou demoradas que inevitavelmente deverão ser executadas. Então, saímos do conforto da distração para o pico do desespero. [1]
Sim, você se tornou um produto de consumo
Como cristãos precisamos refletir sobre estes ladrões de tempo e entender que quando nos dedicamos a passar muito tempo nas redes sociais estamos revelando que elas estão se tornando um deus para nós. E é importante entendermos também que nós nos tornamos o produto para a adoração a esse deus, alimentando-o com o que somos e ele não se cansa de ter mais e mais de nós.
Como no poema O Discípulo de Oscar Wilde sobre o mito de Narciso e o Rio, fazemos das redes sociais um verdadeiro espelho de preferências, contemplamos no espelho das águas do rio de algoritmos apenas o que queremos ver e gostamos de ver, assim somos moldados em nossos comportamentos, hábitos e emoções para nos tornarmos um produto consumido por algoritmos que se alimentam das nossas informações.
E o que são os algoritmos? Basicamente, são definidos como uma sequência de ações que devem ser executadas para resolver um problema através do processamento e organização de dados, mas para isso o algoritmo é programado para seguir instruções específicas. No caso das redes sociais, eles são programados para sempre requisitar mais e mais informações dos usuários e devolver para estes mesmos usuários soluções e resultados de busca por preferências, com o objetivo de que passemos mais tempo nas redes sociais.
Nós usamos as redes de forma “gratuita” desde que forneçamos as informações pedidas, muitas vezes por meio de sugestões. Nas redes sociais a lógica é: dê-me informações sobre você e eu te darei o que você quer e gosta de ver, assim conseguimos que você passe a maior parte do seu tempo conosco e lucramos com nossos patrocinadores. É o chamado Capitalismo de Vigilância, tese desenvolvida pela professora aposentada de Harvard, Shoshana Zuboff.
Esses algoritmos atualmente instruídos por códigos que a máquina obedece de forma precisa, já estão tão sofisticados que não apenas se alimentam da informação para fazer sugestões com o objetivo de gastarmos tempo nas redes sociais, mas também podem aprender com as informações passadas e se aperfeiçoarem para tomar decisões e fazer previsões, é o conceito de Machine Learning ou aprendizado de máquinas. Por meio da interação humana com os algoritmos, estamos ensinando a eles a como prender a nossa atenção nas redes sociais.
Os algoritmos têm em seu cerne a função de criar novos hábitos e trabalhar nossas emoções fazendo parte da liturgia da nossa vida; a retribuição e a força motriz desses novos hábitos de passar tempo olhando e interagindo com conteúdos é o prazer de apenas contemplar, discutir, debater, questionar, receber informações (muitas vezes superficiais e falsas, as famosas fake news), de nos fazermos conhecidos por desconhecidos, criando uma espécie de bem-estar e satisfação que precisam continuamente ser alimentados.
O hábito nos deixa prostrados em adoração, nos coloca na prateleira como produtos que alimentam, nutrem e são consumidos quando requisitados… nos tornamos adoradores da nossa própria criação, afinal, fomos nós, seres humanos que criamos os algoritmos para tê-los como ferramentas para facilitar o nosso trabalho e a nossa produtividade, mas acabamos como escravos do processo tecnológico e assim deixamos de produzir ou produzir pouco e com baixa qualidade, pois a tecnologia faz melhor, mais rápido e em alta qualidade — tudo está a um toque ou clique.
Essas ferramentas tecnológicas, na verdade, são uma extensão de nós mesmos. Precisamos lembrar que não somos criadores, apenas transformamos e otimizamos por meio de um modelo ou padrão já estabelecido naturalmente o que está ao nosso redor na criação. A questão com esses algoritmos é que, na busca pela otimização de tempo para sermos mais produtivos, delegamos a eles a função de organizar e processar informações que são buscadas e precisam estar disponíveis a nós. A princípio isso parece muito bom, e é de fato.
Porém, se você é como eu, do tempo das consultas em bibliotecas depois da aula, sabe que fazer uma pesquisa hoje é muito mais dinâmico e rápido, mas dificilmente vamos parar para ler grandes conteúdos porque simplesmente não temos paciência e com isso nos tornamos preguiçosos, já nos acostumamos a perguntar para o buscador da Google e termos as respostas em milésimos de segundos. Não temos tempo para apreciar o processo de busca, de reflexão e de construção, pois é mais legal olhar e interagir com o que está acontecendo no Twitter, no Facebook e no Instagram do que produzir algo.
A inteligência artificial, os algoritmos, as potentes memórias que armazenam informações, tudo foi produzido a partir da observação da complexidade da vida humana e de outros seres que habitam neste mundo que, apesar de caído, ainda carrega a beleza de seu Criador. Manipulamos os elementos, os transformamos e aperfeiçoamos para que sirvam a um propósito, mas mesmo os algoritmos que criamos para serem perfeitos e não errarem em sua cadeia de códigos nos revelam que nosso ideal de perfeição e controle é, na verdade, imperfeito. No fim, potencializamos os nossos pecados através da tecnologia e nos tornamos irresponsáveis no seu uso, nos entregando ao desequilíbrio — vamos do uso excessivo à demonização das redes sociais ou de qualquer outro meio tecnológico.
Devido aos estímulos de satisfação que recebemos a cada acesso às redes sociais acabamos por nem perceber quanto tempo gastamos ou deixamos de realizar tarefas importantes por preguiça, e é exatamente aqui que mora o perigo: na falta de percepção e reflexão sobre os nossos comportamentos e hábitos no uso das redes sociais. E, ainda pior, mesmo percebendo nossa conduta e os males gerados por ela, seguimos com o jargão de quem quer parar com um hábito ruim para iniciar um novo que sabemos ser necessário e que nos fará bem: “segunda-feira eu começo!”.
Redimindo nossa produtividade
É muito triste percebermos os efeitos da queda em nós, mesmo justificados pelo sangue do Cordeiro, mesmo livres do poder do pecado, ainda temos que viver a realidade como pecadores (na clássica expressão do reformador Martinho Lutero: simultaneamente justo e pecador) e com a dificuldade em estabelecer a nossa identidade livre de qualquer influência e, no caso do tema desse mês aqui no Graça em Flor, livre das redes sociais.
No livro do Êxodo, o grande ladrão do tempo dos israelitas era o Faraó que, com seu coração obstinado e endurecido, impedia, por meio do trabalho escravo, que os hebreus adorassem ao Senhor. Porém, mesmo depois da libertação da tirania, vemos em vários momentos reclamações expressas com saudosismos por parte dos israelitas que, ainda com a mentalidade de escravos, queriam estar no Egito, debaixo de escravidão, apenas porque tinham pão, água e um teto.
A liberdade perdia o valor, se tornava enfadonha e desnecessária, era melhor ficar escravo ou, no caso do tema deste texto, é melhor ficar na rede social servindo de produto para o “Faraó” que se encontra na tela do meu celular ou na tela do meu notebook por migalhas de alegria e deixar de servir ao meu Senhor e ao meu próximo com os dons que Ele me deu, por meio da minha nova identidade em Cristo, não produzindo frutos de louvor e honra para a glória do seu Nome Santo e perdendo o verdadeiro contentamento. Lembre-se: os tiranos apenas mudam no decorrer da história, mas a luta contra a escravidão precisa continuar.
No livro Dez Argumentos Para Você Deletar Agora Suas Redes Sociais do autor Jaron Lanier, há uma espécie de conclamação a uma revisão ou redenção das redes sociais, sobretudo dos algoritmos que foram programados para exercer essa manipulação sobre nossas emoções e hábitos nos levando ao vício e a uma vida mórbida. Jaron Lanier pontua que:
“Se formos capazes de nos livrar apenas desse modelo de negócio degradante, a tecnologia que o sustenta pode acabar não sendo tão ruim. Temos que tentar, senão seremos obrigados a jogar fora todo um universo da tecnologia digital. A tecnologia era o último ‘deus que não falhou’, o último bastião de otimismo. Não podemos nos permitir abandoná-la. (…) Na verdade, minha esperança é de que nós — tanto a indústria quanto as pessoas — encontremos uma maneira de manter e melhorar aquilo que amamos simplesmente sendo precisos em relação ao que deve ser rejeitado. Deletar suas contas agora aumentará suas chances de ter acesso a experiências melhores no futuro. (…) pessoas inteligentes devem deletar suas contas até que variedades que não sejam nocivas estejam disponíveis. Falo como cientista da computação, não como cientista social ou psicólogo. Dessa perspectiva, vejo que o tempo está se esgotando. O mundo está mudando rapidamente sob nosso comando, portanto não fazer nada não é uma opção.” (destaque meu) [2]
Não pretendo entrar em discussões políticas neste texto, se essas declarações soam conspiracionistas ou sensacionalistas e embora não concorde com tudo o que Jaron Lanier diz, como também não acredito que o caminho para sermos mais produtivos necessariamente implique em deletar todas as redes sociais, compreendo a preocupação que ele expressa de forma legítima: precisamos sair do desequilíbrio a fim de não perder tudo de bom que obtemos da tecnologia digital.
Uma vez que entendemos que as redes sociais estão roubando nosso tempo, mediante as informações que fornecemos a cada clique nas sugestões dadas pelos algoritmos, comprometendo nossa produção em prol da edificação da sociedade e de nós mesmos, como cristãos redimidos em Cristo e libertos do poder do pecado (leia Romanos 6), tal qual os hebreus que saíram da escravidão do Egito e receberam uma nova identidade e também as Leis do Deus Trino para se tornarem uma nação separada das demais, temos a responsabilidade moral baseada nessas mesmas Leis eternas de Deus e no poder do Evangelho de Jesus de sermos o paradigma moral no meio tecnológico e conscientizarmos a todos, pelo exemplo, que nossas atividades produtivas não devem ter como foco a tecnologia, mas a glória de Deus.
Sempre devemos nos relacionar com a criação com a plena consciência da nossa situação de queda e assim seguirmos engajados a redimir e levar todas as coisas ao senhorio de Cristo, para trazer soluções que tornem o ambiente das redes sociais mais saudável. Portanto, cuidado com as mentiras que você conta para si mesmo como desculpa para sempre estar usando o celular e procure usar o essencial como ferramenta de produtividade ou entretenimento, mantendo sua atenção no tempo e com quais informações você está alimentando os algoritmos. [3]
Acima de tudo, valorize sua vida real. Você não é uma composição de algoritmos. Você é amado por um Deus eterno que te fez digno no sacrifício de seu Filho Unigênito para que você não pereça e não definhe como um produto na prateleira, mas tenha vida, produza vida e a tenha eterna e em abundância! Saia da prateleira e que o Senhor abençoe o fruto do trabalho das suas mãos! Amém!
P.S.: Trabalhei este texto com indicações de livros e links de temas interessantes para te incentivar a buscar meios e formas de conscientização no uso das redes sociais para sua produtividade. Acredite, também fiz-me de cobaia e convidei três amigas para um experimento de 15 dias na busca por melhorar nossa produtividade mesmo com as redes sociais e… estamos progredindo a cada dia! Obrigada Ruth, Gi e Flavinha.
[1] Uma observação importante: é necessário entender as causas da procrastinação que nem sempre estão atreladas à preguiça de fazer algo, mas a alguma situação emocional que nos afeta e que pode ser melhor tratada com terapia. Todavia, quanto a este tema, indico a leitura do livro Procrastinação, da autora Lilian Soares. Tem me ajudado muito!
[2] Lanier, Jaron. Dez argumentos para você deletar agora suas redes sociais (31-32). Intrínseca. Edição do Kindle.
[3] Outra leitura que vai te ajudar para melhorar sua produtividade é a do livro Faça Mais e Melhor do autor Tim Challies.
Esse post faz parte da nossa série de postagens de Outubro com o tema “Redes Sociais”. Para ler todos os posts clique AQUI.
3 Comments
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