Sobre dor que gera vida, e a força que eu nunca tive

Nobody said it was easy
No one ever said it would be this hard
Oh, take me back to the start
(The Scientist – Coldplay) 

Desde que meu visto foi aprovado, em Julho, meu coração já começou a se despedir do Brasil. Comecei a fazer as malas emocionais há muito tempo, e fui aos poucos dizendo adeus a tudo que sempre me foi familiar – os lugares, as cores, os sabores, e os rostos. Por causa desse processo demorado, eu percebi que ir embora tem sido mais fácil do que eu imaginava, e não chorei com nenhuma despedida até aqui.

Mas hoje, enquanto revirava o baú da memória – figurado e literal – e folheava álbuns antigos de fotografias, meu coração começou a chorar. Eu percebi que, de fato, tudo o que sempre me foi familiar e confortável estava acabando. Era hora de abandonar aquele abraço quentinho chamado conforto, e pular nas águas geladas do desconhecido. Não só figurativamente! Estou deixando uma cidade muito quente, com temperaturas de quase 40° C no verão, para uma cidade onde o inverno mais rigoroso tem sensação térmica de -40° C!

E é tudo muito doido. Ainda não parece realidade, e talvez por isso o baque não esteja sendo tão forte. Talvez assim que meus pés pisarem em solo americano, meu coração caia em si, e eu chore descontroladamente por uns três dias (vamos todos orar para que não!). Entretanto, por agora, o Senhor tem me dado paz na maior parte do tempo, e um grande peso no peito bem de vez em quando.

Mas, queria compartilhar com vocês duas frases que me marcaram durante esse processo de despedidas.

A primeira foi quando fui à Campinas me despedir dos meus amigos de lá. Passei 2 anos na Igreja Batista Central, e amo cada pessoa que conheci. Que igreja mais cheia de Cristo, de amor e de alegria! Eu posso verdadeiramente tomar para mim o slogan que eles têm: eu AMO minha igreja (todas elas – a de Campinas, a da minha cidade natal, e a da cidade para onde estou me mudando! Deus foi bom para mim nesse sentido!). No momento em que estava me despedindo do pastor Sillas (Campos – conheça mais dele aqui ó), eu perguntei como era para eles ter 3 filhas morando fora – se o coração de pai ficava apertado. E ele me disse:

Diz assim pros seus pais: o adeus é como a dor de parto – uma dor que gera vida.

Dor que gera vida. Quando eu paro para pensar no que isso significa… Dor que gera vida é o significado da Cruz, puro e simples. Quando Deus decidiu morrer por homens, Ele criou dor que podia gerar vida. Agora a morte não mais define nosso fim. Existe uma regeneração maravilhosa que gera vida – e vida eterna.

Cruz e casamento. Como os dois são parecidos. A dor da morte que gerou vida eterna; e a dor da separação da família inicial, que gera uma nova vida, uma nova família. Ambos nos levam a algo maior, algo preparado para nós pelo próprio Deus, para que nos aproximássemos mais dEle. Desde o namoro, e agora ainda mais no noivado, eu posso ver o quanto um relacionamento amoroso exige sacrifício, entrega, dor, recomeços. O casamento, eu já antecipo, será tudo isso de forma ainda mais profunda. Uma intimidade que eu nunca conheci, uma entrega que eu nunca vivi, uma alegria que eu ainda estou por experimentar. Ah, como o casamento é, de fato, uma dor que gera vida!

E por mais que doa agora, eu mal posso esperar pela alegria vindoura e por tudo o que vou viver – assim como Jesus suportou a dor da Cruz, tendo em vista a alegria vindoura de ter Seus amados consigo na glória.

Dor que gera vida é algo que quero levar para sempre, e me lembrar nos momentos mais doloridos. Saber que tudo o que faz sofrer traz em sua raiz uma esperança nova, pronta para renascer, que sempre gera crescimento. Assim como frutos que morrem e viram sementes novas na terra, sem morte, sem perda, não há como nascer nova vida, como amadurecer… Ficamos estagnados.

Eu prefiro sofrer e ser mais como Cristo, do que viver para sempre em água morna, e ser um servo inútil e imaturo.

Como minha amiga Elisabeth tão bem disse,

“Nós não fomos criados para morrer meramente a fim de ficarmos mortos. Deus não poderia querer isso para suas criaturas a quem Ele deu o sopro da vida. Nós morremos a fim de viver.” (Elisabeth Elliot, Passion & Purity, tradução minha)

Prefiro sofrer e ser mais como Cristo, do que viver pra sempre como um servo inútil e imaturo. Click To Tweet

Pode parecer tão “estrangeiro” esse sentimento para alguém que casou e mora perto dos pais, ou que, infelizmente nunca teve um contato muito próximo com seus pais. Mas, para mim, o processo de passar de filha para esposa, e a transição de sair da minha realidade e entrar em outra, têm mostrado minhas fraquezas, e feito brotar todo tipo de pecado – insegurança, desconfiança, descontentamento, medo, amargura,…

Por isso, as palavras de uma tia me marcaram profundamente. Ela é uma pessoa que já viveu tanta coisa, já venceu tanta coisa. Atualmente está lutando contra um câncer de mama, e continua com o sorriso no rosto, ainda que abatida pelo cansaço. Fora as outras lutas que ela enfrenta diariamente.

Essa tia, quando foi se despedir de mim, pegou meus braços, olhou fundo nos meus olhos e disse:

Seja forte. Não seja essas mulherzinhas fracotes. Seja forte. E quando tiver medo, lembre-se que Deus está do seu lado.

Wow. Ouvir isso de alguém como ela é algo profundo, marcante. Ser forte é algo que, como vocês sabem, não vem naturalmente para mim. Eu sou vulnerável, sou chorona, sou medrosa, sou… bom, eu sou uma dessas mulherzinhas fracotes. Mas, minha tia guerreira me lembrou daquilo que Deus já tinha me dito: seja forte (cf. Js. 1:6). Entretanto, como fazer isso quando o futuro me parece completamente desconhecido, e eu estou entrando em um lugar onde nunca estive? Como ser forte quando a sombra do “e se…” me assombra, e eu não terei aqueles refúgios que sempre tive e conheci? Como ser forte quando penso que meus filhos crescerão longe de tudo o que eu sempre tive como precioso?

Seja forte porque Eu crio novos começos.
Seja forte porque Eu te darei nova família.
Seja forte porque Eu estarei contigo, mesmo que tudo desabe.
Seja forte porque Eu ainda sou Deus nos EUA.
Seja forte porque Eu ainda estou assentado no meu trono, e reino.
Seja forte porque Eu, Deus de todo o Universo, te amo.
Seja forte, filha minha, porque Eu te trouxe até aqui, e vou continuar te levando pela mão.

E então meu consolo é ouvir, Filha minha, a dor que você está vivendo hoje vai gerar vida e frutos e bênçãos futuros, como você nunca provou antes. Seja forte, porque você está prestes a viver um quebrantamento, lutas e um crescimento dolorido que também nunca viveu. Seja forte e corajosa, porque EU SOU CONTIGO por onde quer que fores – seja Brasil, seja EUA, seja qualquer outro lugar.

Adeus, meu querido Brasil. Te deixo, mas continuo te amando, continuo orando por tua salvação, por tua humilhação perante Jesus Cristo, por teu governo, por teu povo. Por mais que, possivelmente, eu viverei mais tempo da minha vida como americana do que como brasileira, meu coração sempre será verde e amarelo, coxinha e guaraná, sol e mar.

E adeus querida família. Agora deixo de ser filha para ser esposa. E preciso aprender exatamente o que isso significa ainda… Preciso crescer e fortalecer os ombros para essa transição. Mas, já estou alegremente antecipando o momento em que as duas famílias se misturarão em um serzinho precioso que vai ter a personalidade forte Veríssimo, e os olhinhos azuis Walsh.

assinatura