Quando Nos Tornamos Ídolos (Sobre Pornografia e Masturbação)

“Lembrem-se de todo o caminho pelo qual o Senhor, seu Deus, os guiou no deserto durante estes quarenta anos, para humilhar vocês, para pôr vocês à prova, para saber o que estava no coração de vocês, se guardariam ou não os seus mandamentos.”(Deuteronômio 8:2 – NAA)

A fábrica de ídolos no coração humano começou quando o pecado da desobediência gerou a queda da humanidade. Satanás disse à mulher que a quebra da regra estabelecida de não provar do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal a tornaria como Deus (Gn 3.5) e então  os primeiros ídolos já vistos foram produzidos, os egos de Adão e Eva. 

Desde então, a humanidade luta por independência de seu Criador, mas Ele nos fez para sua Glória e para que nos deleitássemos Nele eternamente, logo, como podemos viver longe da nossa fonte de vida e alegria e acreditar que isso é uma boa ideia? Depois de expulsos do Éden, o Jardim das Delícias, homem, mulher e seus descendentes passariam a adorar o novo deus, o Ego,  que exigiria deles mais do que poderiam imaginar, pois para adorá-lo seria necessário o orgulho e a cobiça, meios pelos quais ele pode ser satisfeito. Eis o drama da humanidade ao longo de toda a sua existência — o ego é um deus que nunca está satisfeito.

A fábrica de ídolos no coração do homem não cessa. Depois do ego outros ídolos foram produzidos e deixamos de adorar ao Criador para adorar a criação em busca da auto glorificação (Rm 1.25). O pecado da desobediência abriu portas para toda sorte de males e tudo o que era bom foi manchado pelo pecado. No relacionamento entre homem e mulher o pecado foi especificamente devastador, Deus havia feito ambos da mesma essência — sua imagem e semelhança — porém complementares em relação um ao outro, para uma ligação íntima baseada no amor e no cuidado mútuo onde ambos se uniriam para refletir a Glória de Deus. Eles foram criados para transbordar amor, tal qual a relação da Trindade.

A sexualidade que Deus criou é uma das formas de expressão dessa ligação íntima de transbordar de amor e que também foi atingida pelo pecado. O que foi criado para uma celebração entre o homem e a mulher, para também gerar vida, passou a ser um fim em si mesmo, um deleite egoísta onde um é saciado e o outro é consumido, a objetificação da imagem de Deus para um sacrifício profano ao deus Ego. Olhando apenas para o corpo, uma vez que a alma é desconsiderada, tornam-o em um objeto,  distorcendo a boa sexualidade que Deus planejou através do orgulho e da cobiça.

Os efeitos dessa deturpação são vários e todos podem levar à morte do corpo e da alma, mas aqui trataremos da pornografia e da masturbação como um dos efeitos mais nefastos da egolatria no que tange à sexualidade e também dada a relevância que estes assuntos têm para os cristãos, principalmente, durante este período de isolamento com a consequente impossibilidade da reunião da Igreja de forma física em decorrência da pandemia do Coronavírus. 

Sem dúvida alguma, neste momento de pandemia estamos atravessando um deserto de mortes, tristezas, incertezas, separações, solidão, porém como dizia Elisabeth Elliot, “o sofrimento nunca é em vão”, e com certeza podemos dizer que Deus está sondando os nossos corações para saber o que há dentro deles, quem reina dentro deles. Espero que com este texto possamos refletir melhor sobre essas deturpações da sexualidade  que infelizmente atingem a muitos cristãos do nosso tempo, que o Espírito Santo nos ajude a combater esses pecados ocultos que se desenvolvem no meio da Igreja.      

Os sacrifícios escolhidos para satisfação do “eu”

A pornografia é considerada pelo sistema mundano uma arte da expressão do prazer, a palavra deriva do grego porneía que siginifica prostituição, neste caso, seu significado é a representação de relações sexuais ilícitas por meio de imagens. Já segundo a cosmovisão cristã é considerada como uma deturpação da sexualidade criada por Deus, a verdadeira expressão da deslealdade quando a idolatria está em foco e assemelha-se à própria apostasia da fé, quando deixamos a fé verdadeira para abraçar crenças estranhas, um completo mundanismo.

Não se trata de uma prática nova, ao longo de toda a história da humanidade a pornografia existiu. Em civilizações mais antigas foram achados registros entre os sumérios, egípcios, gregos, romanos, chineses, indianos de casais mantendo relações sexuais, gravados em objetos, esculturas e em construções que supostamente funcionavam como prostíbulos. Com o avanço dos meios tecnológicos, a indústria pornográfica foi criada e se mantém em ascensão, sendo um dos mercados mais lucrativos do mundo, começando com imagens fotográficas, revistas, livros de contos eróticos até chegar nos filmes pornôs.  

Segundo os sites de notícias atuais o número de acessos e buscas por pornografia vem crescendo ao longo do período da pandemia do Coronavírus. Na Amazon, os principais e-books vendidos são os de contos românticos eróticos. Devido ao isolamento social muitos estão cada vez mais cansados, desanimados e frustrados, logo recorrem à pornografia como uma espécie de sistema de recompensas para alívio das pressões pessoais e para o prazer. 

O psicólogo Alvin Coope, citado no livro cristão “Com Toda a Pureza: livres da ponografia e da masturbação” de Tim Chester, estabelece como impulsionador da busca por cibersexo o “motor triplo-A” que compreende o alcance, o anonimato e a acessibilidade dos materiais tornando-os atraentes para seus espectadores. É a certeza da privacidade, da ocultação, que garante o alto consumo desse tipo de material disponível em grande quantidade e acessado em um clique. Tudo é buscado nas trevas, mas nós fomos feitos para luz.

A pornografia faz do outro o sacrifício para satisfazer nosso ego, a cobiça substitui o amor, sendo sua rival, e o contrário do amor é a cobiça, é tomar para si o que não é seu para satisfação pessoal. Enquanto o amor doa para buscar o interesse do próximo, a cobiça toma para si ainda que isto custe a destruição do outro. O corpo como imagem de Deus deve ser tido como inviolável, ainda que não haja contato físico, pois Cristo nos advertiu que os maus desejos procedem do coração (Mt 15.19) e que desejar em pensamentos o outro para fins de relação sexuais ilícitas já é cair em pecado (Mt 5.28).

A indústria pornográfica promete dar uma solução a uma vida conjugal apática, um momento de deleite quando se está estressado por meio da contemplação ou descrição da nudez de um corpo e de atos fantasiosos que não fazem parte da realidade de um relacionamento íntimo, mas a verdade é muito mais sombria e dolorosa. Não há prazer e deleite reais nas cenas protagonizadas, tudo é criado com dor e muita humilhação, aos poucos e com a frequência do consumo de materiais pornográficos desperta-se a perversão no espectador que acaba desenvolvendo um vício baseado no orgulho que não admite o problema da própria imoralidade com a consequente destruição da saúde, da família, da relação com Deus, enfim, da própria vida, pois o salário do pecado é a morte.

O sacrifício de si mesmo

A outra face da egolatria que deturpa a sexualidade que Deus criou é a masturbação. Se na pornografia busca-se o prazer na deterioração do outro através da contemplação da nudez em sua forma mais humilhante, na masturbação sacrifica-se a autoimagem por meio da violação do próprio corpo feito à imagem e semelhança de Deus, este mesmo corpo que para os cristãos é templo e morada do Espírito Santo.

Segundo a visão mundana centrada no homem e na sua busca por felicidade e autoconhecimento, é consenso que a prática da masturbação é considerada sadia e incentivada por psicólogos e médicos, por conta mesmo da liberação de dopamina no organismo, neurotransmissor responsável pelo prazer e aumento da motivação, ou seja, da alegria, da sensação de bem-estar.

A questão não repousa sobre o desejo sexual ou o próprio neurotransmissor em questão, todas essas funções naturais foram criadas por Deus, mas para que fossem celebradas em amor, dentro do casamento, na satisfação do casal, um para o outro e ambos para Deus. A prática da masturbação, assim como da pornografia, leva à liberação desregrada de dopamina no organismo criando um vício igual ao das drogas, e esse prazer em desequilíbrio se torna uma cisterna rota onde a sede nunca é saciada, pois é um prazer apenas momentâneo.

Porém, mesmo na ciência secularizada, há correntes da psicologia que alertam para os danos que a prática da masturbação pode oferecer como prejuízos à vida conjugal, devido ao costume de se obter satisfação sexual de forma rápida, logo, no casamento o outro cônjuge terá suas necessidades de satisfação sexual desconsideradas de forma egoísta e muitas vezes será objetificado, tratado como apenas um corpo desprovido de alma e sem necessidade de afeição. E não só isso, há casos em que o vício se torna tão forte que a pessoa já não tem mais interesse em buscar pelo casamento, em se relacionar com alguém, pois se considera auto suficiente. Ídolo e sacrifício se tornam um.

Então, alguém pode supor que a moderação seria a chave para que a prática da masturbação seja benéfica em algum sentido, mas a mente transformada e renovada por Cristo não raciocina assim. O autodomínio como fruto do Espírito não nos é concedido para praticar o pecado com moderação, mas para não praticá-lo em absoluto. Enquanto o pecado, o mundo e o Diabo nos diz que é errado suprimir e reprimir os desejos sexuais e que praticar a masturbação e consumir pornografia é o caminho ideal para “não pecar”, para satisfazer a nós mesmos, Cristo nos diz: 

“Se alguém quer vir após mim, negue a si mesmo, dia a dia tome a sua cruz e siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida a perderá; e quem perder a vida por minha causa, esse a salvará. De que adianta uma pessoa ganhar o mundo inteiro, se vier a perder-se ou causar dano a si mesma?” (Lc 9:23-25).

Restauração do Altar ao Único Deus

Certamente falar sobre pornografia e masturbação não é uma tarefa fácil, sobretudo em um mundo mergulhado no relativismo onde não há verdade absoluta e tudo depende do ponto vista de cada indivíduo. Na Igreja, enfrentamos dificuldades para tratar sobre o tema entre os meios mais legalistas onde a sexualidade se tornou um tabu, mas o que não é falado à luz da Bíblia e consequentemente da cosmovisão cristã se tornará uma imensa brecha para que o pecado, o mundo e o Diabo atuem ora relativizando de acordo com o mundanismo ora ocultando, negligenciando, sob o manto do falso moralismo encontrado nos meios legalistas.

Estamos em uma guerra que precisamos fazer contra nós mesmos e é importante que se diga que o primeiro inimigo que temos que enfrentar é o pecado que ainda habita em nós, mas que pelo poder da Graça pode ser dominado. Iniciamos o texto falando exatamente sobre o cerne do nosso problema porque em Adão fizemos do ego um deus, idolatrando nossos sentimentos e vontades, mas em Cristo recebemos o poder para transformar o ego e não mais sermos reféns de nossos sentimentos e vontades maculados pelo pecado.

O ego por si só não é ruim, ele também foi criado para adorar a Deus, sendo o âmago da nossa alma, e com o pecado se viu vazio por estar longe do Criador e procurou ser preenchido com as coisas criadas. Por isso mesmo nos dez mandamentos Deus nos disse: “Não tenha outros deuses diante de mim” (Êx 20:3), pois Ele nos tirou da escravidão do pecado e da morte, portanto, Ele é o nosso Deus, nosso Rei, nosso Salvador, nosso Libertador, nosso Aba, Nele vivemos, nos movemos e existimos (At 17.28), não há deus como Ele, nunca houve e nunca haverá.  

Precisamos entender que muitas vezes as circunstâncias despertarão e darão forma ao pecado, mas elas não são a origem dele. O pecado nasce em nosso coração e em nossos desejos. Pecamos quando passamos a crer nas mentiras do Diabo sobre Deus e nos esquecemos do que Ele nos deu como preceitos para a vida em sua Palavra, e assim O substituímos por ídolos. Se o problema fosse nossos olhos ou mãos apenas, para evitarmos a cobiça, bastaria controlá-los, mas o problema se origina no coração e então é necessário sondá-lo, se auto-examinar, para entender as reais motivações do coração que demandam a procura e o consumo pela pornografia e a prática da masturbação.

A partir desse auto-exame é hora de agir. Entenda que você precisa de auto esquecimento, abnegação, precisa evitar, correr, fugir, adquirir hábitos e tomar a decisão de dizer NÃO todos os dias para o pecado. Nessa guerra você terá que ser um cristão radical. Se necessário for, abstenha-se de aparelhos eletrônicos por longos períodos de dias ou meses; livre-se de qualquer entretenimento que possa despertar gatilhos; mantenha-se cercado de seus familiares e amigos piedosos que possam discipulá-lo; intensifique sua vida de oração e leitura da Palavra e louve, cante ao Senhor. A música é uma arte que expressa os afetos mais profundos da alma e esses afetos direcionados ao Criador do Universo envolverá você em uma plenitude de amor e paz onde sua alma cansada e manchada pelo pecado poderá encontrar pastos verdejantes e águas tranquilas.

Caros leitores, meus irmãos, nós fomos feitos para a adoração, templos e moradas, altares e sacrifícios vivos para louvor e glória do Único Senhor e Deus das nossas almas. Orem pelas almas destruídas dos homens e mulheres que participam da indústria pornográfica, muitas vezes forçadamente via a indústria do tráfico sexual; ajudem aqueles que estão escravizados por si mesmos e, se você que está lendo este texto se encontra na prática desses pecados, corra para seu Senhor pois só Ele pode te libertar da necessidade de amor, só Nele você poderá se deleitar e ser pleno sem que outros sejam destruídos e até mesmo você seja destruído pelo pecado. Segundo Tim Chester, no livro “Com Toda a Pureza: livres da ponografia e da masturbação”:

“Quando a fé domina meu coração, satisfaço-me em Cristo e em suas promessas. Foi isso que Jesus quis dizer quando falou: ‘o que crê em mim jamais terá sede’ (Jo 6.35). Quando minha sede por alegria, significado e paixão é satisfeita pela presença e pelas promessas de Cristo, o poder do pecado é quebrado.”

Jesus fez de si mesmo um sacrifício, dando seu corpo e sangue para salvar a muitos do pecado, mas o homem quando se torna um ídolo se torna um tirano para si e para outros. É por isso mesmo que sair da nossa condição de adoradores para a de ídolos gerou a morte, não apenas das coisas que estão ao nosso redor, à nossa disposição, mas a nossa própria morte. Somente quando refletimos sobre essa realidade é que entendemos o quão miseráveis, pecadores e necessitados da Graça de Deus nós somos.

Mas ainda que nossos pecados sejam mais vermelhos que o escarlate, Deus nos tornará brancos como a neve (Is 1.18) porque onde abundou o pecado, superabundou a Graça do Filho de Deus (Rm 5.20). Estamos em uma guerra, façamos guerra contra o pecado e que Deus nos livre de nós mesmos!


Esse post faz parte da nossa série de postagens de Abril com o tema “Sexualidade”. Para ler todos os posts clique AQUI.