O Poder da Ressurreição: Calendário Cristão

Desde a minha infância, sempre fui meticulosa em planejar cada detalhe das coisas. A última vez que me entreguei a esse processo foi no final de 2021. 

Lá estava eu, na véspera do Ano Novo, sentada à mesa, finalizando meu planejamento para o ano inteiro. Detalhe por detalhe, mês a mês, tracei meus horários de sono e despertar, selecionei os livros por tema e estabeleci a quantidade de páginas a serem lidas diariamente. Elaborei minha rotina de trabalho, com pausas precisas ao longo do dia, e reservei tempo para meu marido. Ao final, me deparei com uma planilha vasta, repleta de informações meticulosamente organizadas. Eu sei — doideira, né?

Mas o desfecho desse elaborado planejamento não poderia ser mais diferente: em Março, todo o controle que eu tanto buscara desmoronou. Eu não conseguia mais seguir aquele plano “perfeito”. Tudo o que obtive foi frustração, inquietação, um peso avassalador e uma culpa constante.

E você? Como tem sido sua relação com a agenda? Como tem administrado seu tempo? Quais os impactos dessa gestão em sua vida?

O que estamos registrando em nossas agendas?

Todos nós usamos o calendário para organizar o tempo, não é verdade? Seja para estudos, trabalho, descanso, momentos em família, atividades na igreja ou outras demandas. Os calendários estão lá, ditando nossos ritmos. Com eles, sabemos quando produzir, quando descansar, quando acelerar ou quando pausar por um momento.

Mas sejamos realistas? Do calendário mais organizado ao mais caótico, algo em comum prevalece: o que preenchemos em nossos planners físicos e digitais revela nossas ações e, muitas vezes, em que colocamos nossa confiança. 

Enchemos nossas agendas com tantas coisas que, às vezes, faltam linhas. Despejamos preocupações, ansiedades e nossa busca por autonomia em forma de tarefas. Algumas de nós têm agendas que gritam “Você precisa fazer isso!” ou “Você não precisa de ajuda. Vá! Você consegue dar conta!”. Ei, querida leitora, pare um momento e reflita: o que sua agenda está lhe dizendo?

O poder da ressurreição em nossas rotinas ordinárias

Acreditamos, ou somos influenciados a acreditar, que um bom dia é aquele em que acordamos cedo, realizamos “tudo” e, ao olhar para o relógio, percebemos que ainda é cedo. Muitas vezes, pensamos que precisamos de uma agenda cheia para alcançar nossos objetivos. Mas isso não passa de uma ilusão.

Devemos aprender, como seguidoras de Jesus, que não precisamos de agendas lotadas para sermos filhas amadas pelo Pai. Em Janeiro deste ano, 2024, tive a oportunidade de compartilhar uma reflexão no Frutíferas, nossa plataforma de estudos bíblicos. Em meio a um texto sobre redimir o tempo e gerenciar nossas agendas, mencionei algo que me impacta todos os dias:

“Quantas vezes corremos desenfreadamente em busca de realizações, muitas vezes centradas em nós mesmas, quando deveríamos desacelerar, deixar de lado a preocupação excessiva com a organização minuciosa? Quantas vezes deixamos a visão da nossa sociedade sobre falsa produtividade ditar nossos ritmos de tempo e descanso? Achamos que isso é administrar o tempo, quando na verdade é uma visão de agenda perfeita que nos é vendida. Esquecemos que Cristo não nos chamou para seguir regras no Reino de Deus. Não somos empregadas, somos filhas amadas.”

Esse é o poder da ressurreição e é assim que ele toca todas as áreas de nossas vidas, inclusive, nossas agendas: Cristo já nos deu tudo o que precisamos de forma gratuita. Por meio de sua ressurreição, temos esperança de que uma nova vida possa surgir de corpos antes escravizados pelo pecado. E agora, Nele, temos um novo estilo de vida: não seguimos mais os ritmos deste mundo, pois Cristo nos libertou. Os ritmos do mundo são de autonomia, mas, através do Evangelho, agora vivemos em um novo ritmo. Agora nossas estações devem ser vividas no calendário de Deus.

O que é o calendário cristão?

Muitos de nós não sabem, mas existe uma ferramenta valiosa criada pelos primeiros cristãos, por volta dos séculos III ou IV, que nos conecta com a história cristã em todas as épocas: o Calendário Litúrgico, também conhecido como Calendário Cristão ou Ano Litúrgico. Este calendário, usado por diversas igrejas ao longo da história, é mais do que um simples instrumento; é um guia pedagógico. 

Seu propósito fundamental é direcionar nosso olhar para Jesus e nos ensinar a nos relacionarmos com Ele em nossas atividades diárias, como acordar, trabalhar, estudar, relacionar e descansar, por exemplo. 

O Calendário Litúrgico possui seis estações principais: Advento, Natal, Epifania, Quaresma, Páscoa e Pentecostes. Essas temporadas, que abrangem aproximadamente seis meses, narram os eventos centrais da vida de Jesus e sua importância. Os outros seis meses, chamados de “Tempo Comum”, estão relacionados à história do Povo de Deus, à trajetória da Igreja e à nossa participação na missão de restauração de todas as coisas junto a Jesus.

O que fazer em cada estação do calendário cristão?

  • Advento: lembramos das promessas relacionadas ao envio do Messias, que um dia viria para nos libertar dos nossos pecados. É o momento em que nós preparamos nossos corações e nossos lares para essa chegada. Seja decorando, fazendo devocionais e tendo conversas intencionais em que relembramos umas às outras dessa promessa. O Advento acontece nos meses de novembro e dezembro, especificamente começando no quarto domingo antes do Natal.
  • Natal: Nós celebramos o nascimento de Jesus, que veio como um bebê. Tempo de deixar que Cristo nasça no nosso interior de uma nova maneira. Tempo de celebração com pessoas queridas, de abrirmos as portas da casa e recebermos mais gente. De termos a mesa cheia de conversas e alegria. Começa no dia 25 de dezembro até 5 de janeiro.
  • Epifania: Nos lembramos das obras de Jesus enquanto ele viveu aqui na Terra, especialmente dos três anos de seu ministério. É tempo de aprendizado; tempo de, em comunidade, aprendermos sobre Jesus; tempo de sermos discipulados e de fazermos discípulos. Tempo de acompanhamento, estudo e de caminhar juntos. A Epifania começa no dia 6 de janeiro.
  • Quaresma: É tempo de arrependimento por meio do autoexame e de renovação através da identificação com a jornada de Jesus. Um tempo de juntos nos dedicarmos à oração, ao jejum e à doação. E também nos dedicarmos ao silêncio. É tempo de juntos lembrarmos uns aos outros que precisamos de um Salvador, e de, no círculo de amigos de alma, confessarmos pecados e orarmos uns pelos outros. Começa na Quarta-feira de Cinzas e termina no sábado antes do Domingo de Ramos, geralmente em fevereiro ou março.
  • Páscoa: Nós celebramos que ele morreu, mas ressuscitou, pagando o preço pelos nossos pecados. É tempo de celebração. É tempo de todas as conversas à mesa apontarem para essa verdade: Jesus ressuscitou. É celebrado por 50 dias.
  • Pentecostes: Celebramos a descida do Espírito Santo, que hoje habita em nós. É um tempo para reconhecer a Igreja, a importância de pertencer ao Corpo de Cristo e a nossa necessidade uns dos outros. O Pentecostes ocorre 50 dias após a Páscoa. Como a data da Páscoa varia de ano para ano, o Pentecostes também varia. Geralmente acontece entre maio e junho.
  • Tempo ordinário: O tempo ordinário é o tempo da igreja. Nessa temporada, nos concentramos na vida da Igreja à medida que ela cresce no meio do mundo. A missão da igreja é a mesma missão que Deus entregou a Abraão. Somos abençoados para sermos bênçãos para outras pessoas na Terra. Essa temporada dura até o início do próximo Advento, que começa no quarto domingo antes do Natal.

A proposta é que, ao longo de cada estação, dediquemos tempo à reflexão sobre passagens bíblicas, livros, conversas com amigos, estudos e leituras, captando as principais lições que cada período nos oferece. 

Você pode fazer isso por meio do Lecionário, uma ferramenta que anualmente desenvolve materiais devocionais, artigos e até playlists para celebrar cada estação. Em suas devocionais, que podem ser realizadas individualmente ou em grupo, são selecionados textos bíblicos específicos para orientar mentes e corações a atravessar cada estação com propósito e significado.

Propósito

Falando sobre propósito, por que adotar esse novo calendário? Lembra quando comecei falando da minha frustração em ser excessivamente organizada? Estava tão focada em fazer tudo para ter um relatório pessoal de realizações que esqueci o essencial: ter relacionamento com Deus em todos os momentos, compreendendo que Ele não criou o tempo para uma corrida incessante. Ele o criou para sermos coparticipantes do Seu trabalho de transformação e redenção de todas as coisas. 

Aqui no Graça em Flor, gerencio várias agendas, incluindo a de entrega de textos. Gosto de lembrar às escritoras que gerencio agendas imperfeitas e graciosas. Isso me permite ser mais graciosa também. Se algo falhar, se não puder marcar no planner em um dia caótico, confio não em minhas realizações, mas no Senhor.

O que faço agora, olhando para cada estação do calendário, é para apontar para o Evangelho e lembrar que embora as coisas aqui sejam imperfeitas, Deus é dono do Universo e teceu meus dias. Confio nele, não no que faço.

Percebe como isso impacta a vida das pessoas ao nosso redor? Deus nos abençoa, nos convida a experimentar o tempo redimido para sermos bênçãos na vida daqueles ao nosso redor. 

Talvez você seja o único Evangelho que alguém vai ler. Por isso, querida, desfrute desse tempo redimido, refletindo calma em meio ao caos para aqueles subjugados pelo ritmo frenético. É nosso privilégio e responsabilidade. 

Agora, pertencendo a Jesus, não precisamos mais criar planilhas intermediárias. Podemos descansar e trabalhar pelo Reino e pelo Rei.


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