O Caminho Para o Levantar das Mãos (Sobre Meditação)

Inicio esse texto com uma confissão nada orgulhosa. Descobri lendo sobre meditação que não fazia esse exercício como deveria, seja pela pouca frequência ou até mesmo pela maneira de fazer. Ah, e quanto perdi até aqui! Mas graças a Deus por Sua bondade que abre nossos olhos para as preciosidades e privilégios que ele põe em nossas vidas a fim de que desfrutemos de um melhor relacionamento com Ele.

Mas afinal, você já pôs em prática algum dia da sua vida a meditação? Não falo daquela técnica que ensina a não pensar em nada a fim de encontrar um estado de êxtase e bem-estar. Meditação cristã não deve ser isso. O cristão deve pensar, ruminar as verdades que lê e ouve. A meditação é o ato de refletir com intensidade sobre Deus, de forma séria e solene, a ponto de elevar o coração às afeições celestiais. Portanto, a meditação bíblica não esvazia a mente do pensamento racional, ela nos estimula a nos concentrarmos na glória e na graça de Deus.

Saborear um alimento que amamos ou até mesmo que seja novo ao nosso paladar é uma experiência muito agradável. Meditar é saborear espiritualmente as Escrituras, deleitar-se nelas, provando o gosto doce do ensino, sentindo convicção acerca do que elas nos contam sobre nós mesmos e louvando a Deus pelo que nos revelam sobre Ele. Ao saborear o alimento, inicia-se o processo de digestão e absorção dos nutrientes e, tomando isso como uma segunda metáfora, acrescento que meditar é absorver a verdade no fundo do coração até que nossas reações sejam moldadas para com Deus, nós mesmas e com os outros.

Um cristão maduro é alguém que medita. E assim como somos chamados a orar sem cessar, temos o chamado de meditar dia e noite. O mesmo Deus que nos chamou a crer nos chamou a meditar: Não cesses de falar deste Livro da Lei; antes medita nele dia e noite (Josué 1:8). Essas palavras, embora faladas a Josué, dizem respeito a todos, do mesmo modo que a promessa feita a Josué dizia respeito a todos os crentes. Não devemos alargar a promessa e estreitar o preceito.

Assim como a Palavra de Deus ordena, ore para que sua vontade seja obedecê-la. Meditar nas Escrituras nos leva do dever à alegria (Sl 104:34). As promessas bíblicas para a meditação são enormes. Falo isso, pois sei que da mesma forma que a meditação é um dever imposto, ela é um dever oposto, afinal é contrária à inclinação natural do nosso coração pecaminoso. Somos prontos para ouvir, mas lentos para meditar. E foi justamente nesse ponto onde fui encurralada pela verdade. Por vezes me deparei orando e perguntando a Deus porque não havia deixado certo pecado ou atingido uma maior maturidade espiritual. Eu estava atenta a obedecer apenas uma parte desse processo pensando ser a solução para aquilo ler a Bíblia e orar.

Em parte essa atitude é certa e boa, mas faltava a meditação, faltava o meio que toma as verdades lidas e as levam para dentro do próprio coração, até ser por elas influenciado, alegrado e transformado. A meditação é o afetar do nosso coração e mente pelo deleite e amor (1Pe 1:8). Há muita diferença entre uma verdade lembrada e uma verdade meditada. Por exemplo, que conforto pode trazer ao homem quando vier a morrer pensar que lembrou de muitos conceitos excelentes sobre Cristo, mas nunca teve a graça de meditar sobre eles ao ponto de por ele ser transformado? Querido leitor, um sermão lembrado, mas não ruminado apenas evidencia conhecimento, mas não a afeição. Entendi claramente que o propósito do estudo e da leitura é descobrir mais da verdade; o da meditação, o aproveitamento espiritual de uma verdade. Ambos devem andar juntos, uma dupla poderosa capaz de nos afastar das mentiras e falsas esperanças, e nos conduzir para uma oração sincera e verdadeiramente rica diante do  trono da graça.

Nos voltando agora diretamente às Escrituras, você já percebeu que o Salmo 1 nos mostra a porta de entrada para a oração? O Salmo 1 não é em si uma oração; o Livro que nos ensina a orar não começa com uma oração, mas sim com uma meditação. Te convido a abrir sua Bíblia e ler o Salmo 1. 

Quantas vezes, por não saber ou apenas por falta de disciplina, passamos bruscamente de um estudo da Bíblia para a oração? Há uma ponte entre essas ações e ela é a meditação.

Timothy Keller, em sua obra intitulada “Oração”, nos mostra que a partir deste Salmo a meditação nos ensina três coisas. A primeira é estabilidade. Um cristão que medita tem seu coração enraizado na Palavra de Deus e assim não é levado pelo vento da adversidade ou grandes dificuldades, pois ele permanece firme, sabendo que ali, junto às águas, ele dará frutos e sua árvore será sempre verde. A meditação também traz a solidez para a vida cristã, ao contrário dos ímpios, levados como palha seca, o crente que medita é sábio em suas escolhas e pondera bem antes de tudo que faz. Por fim, a meditação traz bem-aventurança, paz e bem-estar em todas as dimensões. 

Não hesite em usar esse instrumento. Dê um recuo na sua pressa, no barulho ao seu redor, busque o silêncio que te leva à piedade. Seja por meio da memorização, fazendo anotações, parafraseando um texto lido, respondendo perguntas como “o que esse verso me ensina sobre Deus? E sobre Cristo? E sobre meu comportamento? Sobre a Igreja, ou a vida entre o povo de Deus?”, use o melhor meio que fixe seu pensamento nas verdades do Evangelho a fim de que elas sejam diluídas dentro do seu coração até que sua alegria e esperança repousem nelas de modo mais pleno.

A constância é o que trará aptidão a esse dever, mesmo que, de vez em quando, não importa o que façamos, não conseguimos nos concentrar, ou percebermos que nossos pensamentos não se tornam grandiosos e emocionantes. Talvez, naquele momento, você esteja exatamente precisando aprender mais sobre a sua própria fraqueza e insuficiência. A meditação nos faz pensar, depois inclinar e, por fim, desfrutar da presença ou reconhecer a ausência de Deus e pedir por sua misericórdia e auxílio.

Ao ler os Evangelhos fico maravilhada com a quantidade de versos fazendo referência a Jesus indo buscar um lugar deserto onde pudesse estar só para orar. Ele foi o grande meditador. Ele é aquele que se deleita em fazer a vontade de Deus. Jesus sabia que, sendo o próprio Verbo que se faz carne, fixar raízes nas Escrituras e meditar nelas até sangrar é o caminho de agrado ao Pai e o caminho de suprema expressão de amor. Foi assim que Ele nos ensinou, e chama você e eu a fazermos o mesmo.

Você poderia então pensar: não consigo olhar para mim, ao intensamente meditar na Lei do Senhor, e depois olhar para a perfeição de Jesus sem entrar em desespero. Estou realmente perdida.

Queridos, nosso Amado Jesus não é apenas um exemplo, Ele é infinitamente mais do que isso e nisso seu coração deve se alegrar: Jesus é o cerne de toda a Escritura. É sobre Ele cada verso a ser memorizado, cada minuto da sua meditação, toda a plenitude de alegria ao orar. A Palavra pode ser um deleite porque Jesus desceu dos céus, assumindo a forma de servo e foi obediente até a morte, e morte de cruz. Jesus Cristo assegurou perdão aos nossos pecados e fraquezas diante da Lei de Deus. Ele a obedeceu por completo de modo que ela é para nós um deleite, não um desespero eterno. Devemos meditar tanto sobre Ele quanto com Ele, e então o Salmo 1 se tornará vivo para nós.

É através do amor em que confiamos e não pelo que exercitamos que somos salvas.

Como não sentir seu coração em chamas ao trazer essa verdade à tona? Medite sobre Jesus porque Ele é a meditação de Deus. Medite em seu maravilhoso amor. Medite no Seu favor ao nos conceder Sua vida. Medite no cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Medite. No silêncio, ouça a voz do céu, olhe adiante do que seus olhos veem, contemple tamanha fonte de bondade e enfim Ele será “delícias perpetuamente” (Sl  16:11).


Esse post faz parte da nossa série de postagens de Fevereiro com o tema “Disciplinas Espirituais”. Para ler todos os posts clique AQUI.