Missionárias que Marcaram a História do Cristianismo: Gladys Aylward

Você conseguiria dizer qual o seu maior sonho hoje? Algo pelo qual você daria sua vida, sem ressalvas, para conquistar? Talvez nossos sonhos envolvam coisas como carreira, filhos, família, igreja. Ver os filhos crescendo saudáveis e no temor do Senhor seria um grande sonho mesmo. Ter uma família financeiramente estabilizada não seria nada mal. Servir na igreja nas áreas que nos sentimos confortáveis seria um grande feito! Envelhecer bem ao lado da pessoa que amamos seria, realmente, um sonho realizado.

De qualquer forma, creio que nenhum de nossos grandes sonhos envolva uma viagem para China com pouco (ou nada) de dinheiro, sem um destino certo, apenas com uma mala com algumas roupas velhas, uma panela pendurada e uma grande Bíblia de capa preta. Não acredito que tenhamos sonhos que envolvam viagens arriscadas e perigosas, pessoas hostis ou mulas nos transportando em montanhas íngremes para uma província de pessoas que não nos desejam lá. Não consigo imaginar que daria minha vida para viajar por dias com muito frio, pouco descanso e quase nada de alimento, dormir sobre tijolos aquecidos com pessoas que nunca vi e menos ainda trabalhar como “inspetora de pés”.

Mas há uma mulher que, embora não tenha sonhado com essas coisas especificamente, estava inteiramente disposta a viver o que quer que fosse para realizar seu grande sonho – ser uma missionária na China. Gladys Aylward em nenhum momento pensou em recuar, mesmo tendo passado por todas essas situações e muitas outras tão piores que teriam feito qualquer pessoa desistir de tudo, até mesmo da fé cristã. Gladys aparentemente tinha cravado em seu coração as palavras do nosso Senhor: “Ninguém que põe a mão no arado e olha para trás é apto para o Reino de Deus.” (Lucas 9.62)

Gladys Aylward, a missionária perseverante

Gladys Aylward foi uma missionária cristã britânica, nascida em fevereiro de 1902 em Londres, na Inglaterra. Filha de operários, pobre e de pouca instrução, Gladys trabalhou como doméstica desde seus 14 anos. Embora tenha nascido em um lar cristão, o cristianismo só ganhou vida para ela em uma noite, aos 26 anos, quando visitou uma igreja que não era sua. Ela ouviu um jovem pregador falar sobre as muitas oportunidades missionárias maravilhosas existentes, em especial na China. Naquela noite, algo dentro de Gladys foi despertado, e ela soube que queria servir a Deus como missionária na China.

Gladys tinha certeza de seu chamado missionário, mas enfrentou muitos obstáculos e dificuldades de todo tipo – principalmente financeira –, e, além de tudo, a rejeição do China Inland Mission, a escola de treinamento para missionários da China em Londres. Ali, Gladys teve seu primeiro aparente “não” para algo que ela sabia que a resposta de Deus era “sim” – e foi isso que não a fez desistir diante de nenhuma dificuldade encontrada mais pra frente. A escola de treinamento a rejeitou porque Gladys não havia sido aprovada nas aulas de Bíblia, suas notas não eram boas o suficiente para ser missionária. Essa situação a levou a estudar a Bíblia sozinha, e também a história da China.

Gladys voltou a trabalhar como doméstica e passou a guardar cada centavo conquistado para comprar uma passagem de trem que a levasse até a China. Ela uniu duas armas poderosas: oração e trabalho duro. Gladys não apenas trabalhava e confiava em seus esforços, mas entregava cada situação ao Senhor e pedia para que ele a usasse com os recursos que possuía, exatamente na situação em que se encontrava. Ela nunca esperou as coisas melhorarem, porque ela conhecia o Deus que a tinha chamado.

Em 1932, aos 30 anos, após meses juntando dinheiro, Gladys tinha o suficiente para comprar sua passagem de trem. Ela trabalharia na China, em Yangcheng, com a senhora Jeannie Lawson, uma missionária idosa e viúva. Sua bagagem continha poucas roupas, quase nada de comida ou dinheiro, uma caneta e sua Bíblia – e assim ela iniciou sua perigosa e virtuosa jornada.

Depois de mais de 20 dias viajando de trem, barco e mula e tendo enfrentado incontáveis perigos, Gladys encontrou a senhora Lawson em Yangcheng, onde juntas fundaram a Pousada das Oito Felicidades, onde compartilhavam histórias bíblicas com os hóspedes. Assim, o número de cristãos dessa província aumentava cada dia mais, a ponto de caminharem pelas ruas e ouvirem o povo adorar a Deus com hinos de louvor.

Gladys Aylward, a missionária inspetora de pés

Mas como nada era fácil na jornada de Gladys, logo a senhora Lawson faleceu, e Gladys ficou sem direção e provisão financeira. Novamente, por meio de uma vida de oração, trabalho duro e confiança em Deus, Gladys pôde contemplar a boa mão do Senhor conduzindo todas as coisas, quando o mandarim, um alto funcionário do governo chinês lhe ofereceu (ou a obrigou gentilmente) um trabalho inusitado: ser inspetora de pés. 

Havia um costume chinês: desde bebês, as meninas tinham seus pés enfaixados com firmeza com ataduras de linho. Assim, eles se curvavam para baixo conforme iam crescendo até que os dedos e a metade da frente dos pés ficassem escondidos embaixo da metade de trás dos pés. Então, aos 12 ou 13 anos de idade, os pés ficavam permanentemente dobrados. As garotas não podiam brincar ou correr como os meninos. Naquela cultura, não era desejável que meninas tivessem “pés grandes”, mas, na época de Gladys, havia um novo governo, que estava proibindo essa prática, e a amarração de pés deveria ser, portanto, interrompida naquele distrito.

Os homens não podiam olhar os pés das mulheres, e uma mulher chinesa não era apta para este trabalho, porque tinha os pés pequenos demais para viajar inspecionando pés. Gladys era a única que poderia realizar o trabalho. Quando Deus deseja que façamos algo, pode usar qualquer coisa a favor de seu Reino, qualquer coisa mesmo, inclusive nossos pés – todo nosso corpo serve ao seu Criador. Grandes coisas podem acontecer por meio de situações inusitadas. Certamente Gladys jamais imaginou que seria uma inspetora de pés, viajando todos os dias para compartilhar a mensagem do evangelho de Cristo enquanto libertava os pés de meninas chinesas. 

Cada dia mais, Gladys ganhava o coração daquele povo, e em uma de suas viagens, descobriu que crianças eram vendidas como escravas. Assim, ela se tornou mãe: comprava e adotava essas crianças, até que a pousada ficou cheia delas. O testemunho da inspetora de pés era tão impactante que o mandarim (aquele que lhe oferecera o trabalho) se tornou um amigo pessoal, até que um dia organizou um jantar com pessoas importantes, tendo Gladys como convidada de honra, e lhe disse na frente de todos, as seguintes palavras:

“Àiwêidé (era assim que passou a ser chamada, o que significa mulher virtuosa em chinês), minha querida amiga. Eu vi tudo o que você é e tudo o que você faz, e eu gostaria de me tornar um cristão como você.” (Gladys Aylward, A Aventura de Uma Vida, Shedd publicações, página 163).

Gladys Aylward, a missionária virtuosa

Por seu extraordinário testemunho, Gladys foi carinhosamente chamada pelo povo de Àiwêidé, e em 1936, ela foi oficialmente naturalizada como cidadã chinesa. 

Mas foi em 1938 que ela realizou seu ato mais notável. Durante a invasão do exército japonês em Yangcheng, Gladys liderou mais de 90 crianças em fuga pelas montanhas por 21 dias de fome, exaustão e medo, até finalmente encontrar um lugar seguro para elas.

Em 1943, ela foi oficialmente reconhecida como missionária. Anos depois, em 1957, Gladys compartilhou com uma amiga: “Eu nunca fui a primeira escolha de Deus para o que fiz pela China. Havia outra pessoa. Não sei quem era. Deve ter sido um homem maravilhoso e muito instruído. Não sei o que aconteceu com ele. Talvez tenha morrido ou não se dispôs. Deus olhou para baixo e viu Gladys Aylward.”

Gladys morreu aos 67 anos, da mesma forma como viveu a maior parte da sua vida: servindo ao Senhor e amando pessoas. Em uma noite, enquanto cuidava de um bebê recém-nascido que ficara órfão, Glayds dormiu e nunca mais acordou.

Que a história dessa virtuosa missionária possa simplesmente nos inspirar a confiar que o amor de Deus conduz a nossa vida e que vale a pena viver para amar aqueles a quem Jesus ama. Olhar para a vida de Gladys me faz orar para que, em algum momento, eu também ouça: “por tudo o que você é, e por tudo o que você faz, eu também desejo me tornar um cristão”. Que tudo aquilo que somos e tudo aquilo que fazemos, aponte para tudo o que Cristo é e faz. Que a nossa vida seja mais parecida o possível com a vida do Cristo que anunciamos. 

Se você deseja saber com mais detalhes a história de Gladys, eu recomendo a leitura do livro Gladys Aylward, A Aventura de Uma Vida. 


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