Milagres de Jesus: A Ressurreição de Lázaro

“Onde está, ó morte, a sua vitória? Onde está, ó morte, o seu aguilhão?” (1Co 15:55)

Trabalhar com escrita é algo maravilhoso; às vezes, assombrosamente maravilhoso… A comunicação, seja ela pela fala seja pela escrita, torna tudo muito especial porque é uma conexão que estabelecemos com o ouvinte ou leitor sobre nossos conhecimentos, reflexões e emoções. É como se deixássemos um pouco de nós, escritores, em cada formação de raciocínio (e me incluo entre eles constrangida, porque ainda tenho muito o que aprender e aperfeiçoar). E, quando se escreve textos, cujo objeto de estudo e reflexão é a Palavra de Deus, isso é ainda mais enriquecedor, confrontador e redentivo.

Acredito que seja importante dizer a você, caro leitor e irmão em Cristo, que não foi muito fácil, nessa etapa da minha vida, escrever sobre esse milagre de Jesus, justamente porque ele relata a angústia e a incredulidade ante os pontos finais da vida, os processos que estão por acabar e não temos muito o que fazer para desacelerar ou simplesmente não permitir que o ponto final venha. Confesso que é uma dificuldade que ainda enfrento na minha caminhada cristã.

Quero iniciar essa reflexão com a perspectiva de quem entende que nenhuma solução virá, que o fim inevitável chegou, que passamos por todo o processo sem que Deus estivesse conosco e por isso não houve um final feliz; falo da perspectiva de Marta e Maria que, ao se dirigirem a Jesus, declararam: “Senhor, se estivesses aqui meu irmão não teria morrido” (Jo 11:21 e 32). Para elas, aquela circunstância era definitiva e imponente, afinal, quando Jesus chegou, Lázaro já estava morto havia 4 dias.

O pecado trouxe a degeneração da vida e estabeleceu o seu contraponto a ela: a morte. Nos relatos dos Evangelhos, não foi a primeira vez que Jesus ressuscitou pessoas mortas, pois já havia acontecido a ressurreição do filho da viúva de Naim (Lc 7:11-17) e da filha de Jairo (Lc 8:40-56), mas, na ressurreição de Lázaro, temos a prefiguração do que aconteceria ao próprio Jesus alguns dias depois de trazer seu amigo à vida. O fator tempo, como já mencionado, de 4 dias em um sepulcro onde o corpo já estava em processo de decomposição, nos mostra que Jesus, o Autor da Vida, estava face a face com o último inimigo: a Morte. 

Adoecer e morrer

“Então as irmãs de Lázaro mandaram dizer a Jesus: ‘Senhor, aquele a quem amas está doente.'” (Jo 11:03)

“Então lhes disse claramente: ‘Lázaro morreu.'” (Jo 11:14, grifos meus)

Nesses versos vemos a ação do pecado e da morte. No princípio do mundo, Deus criou tudo com perfeição e, ao colocar homem e mulher no Jardim do Éden, deu a eles vida, provisão, saúde e beleza. Mas, com a desobediência, nossos corpos se tornaram totalmente vulneráveis a qualquer deterioração: adoecemos e morremos. Lidar com essas realidades é desafiador, pois, sob a ótica humana, o propósito da existência é morrer; esse é o fim de toda a vida no universo.

Lembro-me das aulas de Medicina Legal, da matéria de tanatologia, que é a ciência que estuda a morte e seus mecanismos de mudanças corporais durante o tempo, após a paralisação das atividades cerebrais e da mecânica do coração. Nesse momento, quando as principais funções mantenedoras da vida cessam, o corpo entra no estado de morte e aos poucos tudo vai morrendo e entrando em processo de destruição.

Contemplar e lidar com o fim da vida é extremamente triste. As aulas eram tomadas por uma curiosidade e silêncio pesados. Se o professor tentasse trazer leveza para a aula alguns risos tensos eram soltos, mas nunca foi uma aula tranquila de assistir, pelo menos não para mim. Ver o fim naqueles termos e pensar, à luz dos textos bíblicos, que isso fazia parte da corruptibilidade do corpo por causa do pecado, sempre me fazia voltar para casa em profunda reflexão.

E podemos imaginar que, assim como todos nós que tivemos que lidar em algum momento com o luto na família, Marta e Maria, que eram amadas por Jesus, assim como Lázaro, estavam preocupadas e ansiosas pela chegada de Jesus porque sabiam que, se ele chegasse a tempo, Lázaro poderia ser curado e, sendo curado, a morte não seria mais um risco.

Ah, como é dura a angústia da espera pela melhora! Nos apegamos a cada pequena esperança porque, diante da realidade da doença, vemos nossa impotência revelada. Mas, em seus planos divinos, Jesus precisava “atrasar-se”, havia uma missão dada por Deus e ele não poderia ser manipulado pela urgência, precisava esperar o tempo certo. Ele sabia que Lázaro estava doente e morreria, mas aquela doença não era para morte, e sim para que Deus fosse glorificado.

Chorar

“Ao ver chorando Maria e os judeus que a acompanhavam, Jesus agitou-se no espírito e perturbou-se. ‘Onde o colocaram?’, perguntou ele. ‘Vem e vê, Senhor’, responderam eles. Jesus chorou. As pessoas que estavam por perto disseram: ‘Vejam como ele o amava!’. Outros, porém, disseram: ‘Este homem curou um cego. Não poderia ter impedido que Lázaro morresse?’”. (Jo 11:33-37, grifos meus)

Somos os únicos seres vivos que choram por emoções, embora possamos ver notícias de ativistas ambientais mostrando animais supostamente chorando em situações assustadoras ou passando por algum risco. A verdade é que chorar para expressar tristeza, aflição, medo, alegria, alívio, é uma função especificamente humana.

Quando Jesus chegou ao povoado de Betânia, encontrou todos angustiados, e o choro predominava. O que fazer diante do que não podemos resolver? E claramente era esse o contexto: Lázaro já estava morto havia 4 dias! O choro de Marta e Maria, bem como dos que as acompanhavam, revelavam que, diante do fim da vida, a esperança era algo ilusório sem nenhuma convicção ou perspectiva concreta de que Deus prevaleceria. Na prática, eles eram como aqueles que nunca conheceram a Deus (1Ts 4.13), não sabiam quem ele é e que foi revelado na pessoa do Filho. Ainda que Jesus anunciasse que Deus seria glorificado e que a doença de Lázaro não seria para morte, eles estavam perdidos em desesperança e incredulidade.

Jesus, diante desse cenário, chora e se perturba. Ele estava irado com o pecado e a morte e o que eles promovem na criação de Deus. Em um de seus sermões sobre o texto bíblico de João 11:35, Charles Spurgeon, nos lembra quão humano e emocionado Jesus foi no momento da morte de Lázaro: 

“Jesus chorou porque era verdadeiramente humano em sua empatia. Não apenas estava entre nós e tinha aparência de homem, mas tinha estabelecida uma relação conosco em inumeráveis pontos. Jesus estava sempre em contato com o sofrimento; felizes aqueles que estejam em contato com ele! Nosso Senhor viu chorando Marta e Maria e os que as acompanhavam e deixou-se contagiar pela dor: Jesus chorou. Tinha empatia para com os que sofrem e, por isso mesmo, seria homem de dores, e experimentado nos sofrimentos (Is 53.3). Jesus era muito mais terno para com a humanidade do que qualquer outro homem jamais conseguiria ser.” 

Jesus chorou porque era verdadeiramente homem e não tinha vergonha de demonstrar sua fraqueza humana. Ele chorou com os que choravam, e nisso nos instruiu, como também sabe nos consolar e nos deu exemplo de como agir nos dias sombrios. Mas, ao ver a morte e suas consequências, ao constatar a angústia e a incredulidade dos que estavam presentes e que tomaram a morte como verdade última da vida, como a verdadeira consequência da nossa existência, ele ficou indignado pelas atitudes dos que diziam crer em Deus e demonstravam que não eram orientados pelas verdades que o Pai revelou.

Em suma, Jesus não chorou por causa de Lázaro ou de suas irmãs, pois sabia que ele voltaria a viver e elas se alegrariam, mas “antes, o mesmo pecado e morte, a mesma incredulidade, que produziram seu ultraje, também geraram sua dor. Aqueles que seguem Jesus como seus discípulos hoje fazem bem em aprender a mesma tensão – que dor e compaixão sem ultraje reduzem-se a mero sentimento, enquanto que ultraje sem dor solidifica-se em arrogância e irascibilidade hipócritas” (CARSON. D.A. O Comentário de João, p. 416). 

Ressuscitar

Jesus, outra vez profundamente comovido, foi até o sepulcro. Era uma gruta com uma pedra colocada à entrada. ‘Tirem a pedra’, disse ele. Disse Marta, irmã do morto: ‘Senhor, ele já cheira mal, pois já faz quatro dias’. Disse-lhe Jesus: ‘Não lhe falei que, se você cresse, veria a glória de Deus?‘” (Jo 11:38-40, grifos meus)

Há tantas coisas interessantes nesse milagre! Segundo o apóstolo João, logo depois que Jesus ressuscita Lázaro e a notícia se espalha, Caifás se reúne com os fariseus e os chefes dos sacerdotes para determinarem a morte de Jesus. Ele dá a vida e então a dele é pedida em seguida. E o que dizer do próprio retorno de Lázaro à vida? Se ele disse algo sobre esse momento em que esteve morto por 4 dias, não nos foi permitido saber e, como as coisas que não foram reveladas são apenas para Deus e não para nós (Dt 29.29), podemos entender que a inspiração do Espírito ao escritor foi manter o texto bíblico fiel ao que ele se propôs desde o primeiro livro das Escrituras: falar sobre Jesus.

A ressurreição de Lázaro era um milagre incontestável porque, segundo o entendimento dos fariseus, a alma de um morto poderia retornar para o corpo em até 3 dias, mas Lázaro já estava morto há 4 dias. Diante desse milagre, Jesus ratifica sua declaração: “Eu sou a ressurreição e a vida” (Jo 11:25). Ele era o Messias tão aguardado, mas não queriam que fosse ele, não poderia ser um carpinteiro de Nazaré, muito menos alguém que contrariava tantos costumes e tradições que eles não viam como equivocados, ainda que o fossem.

No centro desse milagre está o Deus encarnado em todo o seu amor obstinado e enfurecido, com seus olhos derramando lágrimas e vencendo a morte: o grande ponto final da história de cada ser humano. 

Em 1Coríntios 15 lemos o que o apóstolo Paulo escreveu sobre a beleza da esperança da ressurreição. Ele nos lembra que nosso corpo é como semente que deve morrer para, então, nascer em uma outra forma; morreremos em corrupção, mas ressurgiremos pelo mesmo poder com que Cristo foi ressuscitado, em corpo incorruptível, glorioso e imortal. E a morte? Ela será apenas uma memória na eternidade, ofuscada diante da verdadeira realidade que viveremos ao lado de Jesus e de todos os santos. Mas até lá, muitos serão os fins com os quais ainda teremos que lidar.

Ah, os pontos finais! Eles são sempre tristes, principalmente no que concerne a todo bem que podemos experimentar nesta vida; seja o fim da saúde, o fim de uma amizade, de um casamento, seja o fim de boas fases na vida em igreja, no trabalho ou financeiramente. Como já dizia Salomão em sua sabedoria, melhor é o fim das coisas do que o início delas (Ec 7.8). O fim nos faz pensar sobre a mínima possibilidade de que um dia o que é bom acabará, que aquela alegria que temos vai acabar e faz-nos desejar nunca ter sentido, nunca ter amado, nunca ter conversado, nunca ter dado risada juntos, mas a sabedoria está em viver todo esse bem como se fosse o último dia e não é à toa que o tempo de agora se chama presente.

Eu não sei por quais pontos finais você tem passado, mas quero te encorajar trazendo à sua memória o que pode lhe dar esperança (na verdade, nos dar esperança!): estamos seguindo nos passos do Mestre para sermos transformados e, nesse processo, será necessário perder e nos despirmos do velho ser humano, pois de certa forma o cristão vive a realidade da ressurreição todos os dias e, certamente, depois do fim de cada etapa, não seremos mais os mesmos, mas seremos mais parecidos com o Amado de nossas almas. 

Oro, para que nosso Senhor transforme nossa incredulidade e desesperança em plena confiança no seu amor, pois, ao fim da jornada, ele, que chorou, enxugará nossas lágrimas e, então, seremos tomados de alegria e paz eternas.


Bibliografia consultada

CARSON. D.A. O Comentário de João. São Paulo: Shedd Publicações, 2007.

SPURGEON. Charles H. Milagres e parábolas de nosso Senhor: a obra e o ensino de Jesus em 173 sermões selecionados. São Paulo: Hagnos, 2016. 


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