Graça analisa: “Let Me Be A Woman”, Elisabeth Elliot, 1976

Há alguns anos eu fiz uma série de vídeos com o tema “o chamado de Deus às mulheres”, onde falei sobre o que nos era específico – nosso papel, nossa atitude, nossa aparência e nosso testemunho. A série foi trazida às leitoras em forma de vídeos e por causa deles aprendi a dura lição de que o YouTube não é a melhor plataforma para assuntos considerados polêmicos, sendo um lugar onde nos expomos tão abertamente. Muitos comentários brutais chegaram, e na época considerei parar todo o meu ministério. Afinal de contas, eu sou fraca e tão falha, e não me senti capacitada a defender ideias tão contrárias ao pensamento contemporâneo.

Os argumentos eram de que o que eu estava dizendo era arcaico e ofensivo às mulheres. Ou eu era muito burra, eles afirmavam, ou muito cega de não ver como aquele discurso era ruim a mim mesma.

A verdade é que o feminismo, hoje em dia, é tão abrangente, que se tornou a norma, de forma que a mulher que se opor a ele é considerada traidora de suas raízes, de sua existência como mulher. Triste a era em que vivemos em que tudo o que a Bíblia prega não é só tratado como mentira, mas também como ofensa, questão quase criminal.

Em um tempo como esse, só saberemos nos posicionar para defender nossas crenças se obtivermos conhecimento advindo de pessoas muito mais vividas e sábias do que nós. É necessário que nos aprofundemos na questão, porque infelizmente até no meio cristão o feminismo tem fincado suas raízes. Muitas cristãs se enrolam nessa filosofia crendo que ela seja a “salvadora das mulheres” – se esquecendo do Salvador verdadeiro que veio para não só nos livrar da opressão, como também de nós mesmas (do pecado em nós) e do inferno.

A verdade é que a mulher só será verdadeiramente mulher quando aceitar para si aquilo que o Grande Criador estabeleceu para ela.

Quando olhamos um belo barco à vela rasgando o mar, só podemos apreciar verdadeiramente sua beleza e destreza se seu condutor seguir à risca as leis da natureza e da navegação. Caso contrário, não só o barco não navegará, como também se tornará perigoso para aqueles que o utilizam. Assim também tanto a feminilidade quanto a masculinidade só podem ser admiradas em sua beleza e totalidade quando se submetem às leis divinas dAquele que as criou.

Mas, eu estou me adiantando. Afinal de contas todo esse parágrafo anterior só pôde ser escrito porque eu aprendi esses conceitos com uma grande mulher. Deixe-me te falar dela e de sua obra que tanto me ensinou sobre SER MULHER, verdadeiramente.

Comecei a ler o livro “Let Me Be a Woman” (Tyndale House Publishers – Deixe-me ser uma mulher, tradução livre minha), da grande Elisabeth Elliot, achando que seria mais um “manual da boa esposa”. Tenho lido muitos livros voltados para o público feminino nessa época pré-casamento, e estava preparada para encontrar mais uma obra com várias dicas práticas e um pouco rasa teologicamente (como a maioria do material que tenho encontrado…).

Mas, para minha surpresa e grande alegria, encontrei um tratado de defesa da feminilidade bíblica, tão profundo e firme em suas convicções que tive até vontade de parar a leitura muitas vezes, tão grande era o desafio de lê-lo.

Antes de olharmos um pouco mais para a obra, deixe-me começar introduzindo a autora, minha amiga Elisabeth, como eu gosto de chamá-la (eu e o noivo até usamos a hashtag MyFriendLis pra quando eu começo a citá-la…). Escritora e palestrante norte-americana, Elisabeth Elliot foi a viúva de Jim Elliot, um de cinco missionários assassinados por uma tribo indígena, no ano de 1956. Elisabeth ficou conhecida entre os cristãos protestantes dos EUA, e depois do mundo, tanto por sua escrita, quanto por sua notória atitude de retornar à tribo que assassinara seu marido e continuar como missionária entre eles por alguns anos. Ela foi a única mulher citada pelos principais líderes protestantes americanos contemporâneos quando perguntados quais autores mais influenciaram suas vidas.

Elliot faleceu em Junho do ano passado, deixando um legado de 24 livros, fora os artigos, palestras, programas de rádio, etc. Muitos foram influenciados por sua vida, inclusive o livro “Eu Disse Adeus ao Namoro” (Ed. Atos), de Joshua Harris, muito famoso aqui no Brasil, foi inspirado diretamente por sua obra “Passion and Purity” (Revell Publishing – Paixão e Pureza, tradução livre minha).

Agora vamos passar à obra da qual trataremos hoje – Let Me Be a Woman. Elisabeth a escreveu em 1976, época que, em suas próprias palavras, “foi o auge do forte movimento feminista que varreu nosso país [Estados Unidos da América].” O livro todo é uma compilação de cartas que Elliot escreveu à sua filha, Valerie, que se casaria 11 meses após a primeira carta ter sido escrita. Segundo Elisabeth, essas cartas vinham “não só da minha própria experiência com o casamento. [Mas] de uma vida, que em sua maioria foi vivida solteira (eu fui casada, como você já sabe, por apenas um sétimo de minha vida). Elas vêm do ser uma mulher, e do buscar ser – seja solteira, casada, ou viúva – uma mulher para Deus.” (p. VIII, tradução livre minha)

Esse presente de casamento de mãe pra filha acabou virando um livro que abençoou muitas mulheres, tendo vendido mais de 250.000 cópias. Em seu conteúdo, Elisabeth abrange áreas das quais poucas têm coragem de falar, desde submissão até sexo, tudo de forma extremamente bíblica.

Elisabeth começa o livro mostrando a intencionalidade da feminilidade – como Deus nos escolheu para sermos mulheres. Não foi acidentalmente que Ele criou a primeira mulher, e não é acidentalmente que cria ainda muitas hoje em dia. Ela diz, no capítulo “Uma filha, não um filho”:

Nós às vezes ouvimos a expressão ‘o acidente do sexo’, como se o fato de alguém ser homem ou mulher fosse uma trivialidade. Está muito longe de ser uma trivialidade. É nossa natureza. É a modalidade sob a qual vivemos nossas vidas; é o que você e eu somos chamadas a ser — chamadas por Deus, esse Deus que está no controle. É nosso destino, planejado, ordenado e cumprido por um Senhor todo-Sábio, todo-Poderoso e todo-Amoroso. (p. 8, tradução livre minha)

É usando essa intencionalidade como base de seu argumento que ela procede para falar de outros assuntos tão delicados em nossa era. É com essa convicção de que não foi por acaso que nascemos mulheres que ela afirma o que significa, então, ser uma mulher. Deus te quis mulher, te quis filha e não filho. E isso é valioso, precioso, algo pelo qual devemos louvá-lO.

Depois disso, Elisabeth nos mostra como não somente a mulher foi criada propositalmente, como também foi feita com um propósito. Eis o que ela diz no capítulo “Criação — A mulher para o homem”:

Deus podia ter dado a Adão outro homem para ser seu amigo, para andar e falar e discutir com ele, se isso fosse de sua vontade. Mas Adão precisava mais do que a companhia de animais e a amizade de um homem. Ele precisava de uma ajudadora, especialmente criada e preparada para servir àquele papel. (…) Você não pode fazer o uso correto de algo a não ser que você saiba para quê aquilo foi feito, seja um alfinete ou um barco à vela. Para mim, é uma coisa maravilhosa ser uma mulher sob [a vontade] de Deus — saber que, primeiramente, nós fomos criadas (“Criou Deus o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou”) e então saber que fomos criadas para algo (“Com a costela que havia tirado do homem, o Senhor Deus fez uma mulher e a trouxe a ele.”) (p. 13, tradução livre minha)

Quantas vezes você já ouviu isso dito dessa maneira? Nós sabemos que a mulher foi criada do homem, mas já paramos pra pensar que fomos criadas também para o homem? Isso faz diferença. Nos ajuda a compreender que não só fomos criadas DE PRÓPÓSITO, mas COM UM PROPÓSITO – sermos ajudadoras idôneas.

Fomos criadas mulheres DE propósito e COM propósito. Click To Tweet

E quantas de nós dirão que isso nos limita? Que isso não honra a plenitude de tudo o que podemos ser? Que é mais do que nosso direito irmos atrás de tudo o que os homens têm para sermos tudo o que eles são? Elisabeth rebate: todas as criaturas que Deus criou – desde o leão até a formiga, O louvam por serem quem são, e se submetem a serem exatamente o que são, sem buscar serem mais nem menos. Todas as criaturas exceto duas – os anjos, dos quais alguns caíram, e os homens. Para esses, não foi suficiente ser quem Deus havia designado que fossem. Eles queriam ser mais, queriam ser Deus. Elisabeth pondera: o que será que teria acontecido se, ao invés de agir assim, Eva tivesse se submetido a ser exatamente quem era?

Que tipo de mundo poderia ter existido se Eva tivesse recusado a oferta da serpente e, ao invés disso, dito a ela: “Deixe-me não ser como Deus. Deixe-me ser o que eu fui criada para ser — deixe-me ser uma mulher”? (p. 16, tradução livre minha)

Ser exatamente quem fomos criadas para ser. Que privilégio! E quantas de nós pensa ser isso um grande fardo… Queremos ser muito mais. Elisabeth explica no capítulo “O peso das asas”:

Toda criatura de Deus recebe algo que poderia ser reconhecido como uma inconveniência, eu suponho, dependendo da perspectiva do qual é visto. O elefante e o rato podem reclamar de seus tamanhos, a tartaruga de seu casco, o pássaro do peso de suas asas. Mas, (…) o presente especial e a habilidade de cada criatura define suas limitações especiais. E o pássaro facilmente aceita a necessidade de carregar asas quando descobre que, de fato, são elas que o carregam, (…) assim também a mulher que aceita sua feminilidade descobre naquelas limitações seus verdadeiros presentes, seu chamado especial — asas que, na verdade, a carregam para cima, para uma perfeita liberdade, dentro da vontade de Deus. (p. 23, tradução livre minha)

Aquilo que pensamos nos limitar é, na verdade, o que verdadeiramente nos torna livres. Que discurso mais contrário à nossa era, não é mesmo? Somos o que somos, porque Deus quis, e nos submeter à Sua vontade é necessário para estarmos em paz com nossa criação, nosso chamado — a feminilidade.

***

Na verdade há muitas outras lições preciosas que eu aprendi com esse livro, e que gostaria de poder trazer nesse texto. Como vocês perceberam, essa análise não passou da página 23, e o livro tem 175! Elisabeth disse muito sobre solteirice (e como ela não contradiz o chamado de Deus a sermos ajudadoras), submissão, o papel da esposa, a masculinidade, o casamento em si (fidelidade, união, conflitos, etc…). Penso que esse post ficaria gigantesco se eu tentasse abranger tudo isso, por isso tentei falar aqui do que acho ser a lição mais importante desse livro, sua base: a aceitação da feminilidade como um dom de Deus, e a confiança de dizer “Deixe-me ser uma mulher”. Tentarei, na medida do possível, trazer posts específicos sobre outras lições que aprendi nesse precioso livro.

Minha única crítica? Penso que a divisão de capítulos foi um pouco infeliz, em alguns momentos. Por vezes ela começava um capítulo com “e a terceira coisa mais importante no casamento é…” e eu tinha que voltar para entender quais eram as duas coisas anteriores. Fora esse pequeno detalhe, livro maravilhoso, em minha opinião. Merecedor da nota máxima.

(Orando forte para alguma editora cristã publicá-lo em Português!)

5review

assinatura

P.S.: Que acharam da nossa primeira análise de livro? Achei que ficou grande, mas penso que uma análise deva ser algo que nos faça compreender as ideias contidas na obra… Me digam o que pensam nos comentários! 🙂