É correto o divórcio em casos de abuso emocional? (Graça Responde #10)

Oi queridas irmãs! Essa pergunta é sobre casamento, mas não no que se refere a mim, mas sim ao dos meus pais. Eles são casados há muitos anos, minha mãe é cristã e meu pai não. É muito difícil resumir toda a situação mas peço pra que vocês escrevam sobre divórcio em casos de traições, agressões verbais constantes e vício em pornografia (meu pai). Eu sinto que minha mãe está muito SOZINHA e não consigo ajudá-la, eu quero muito que ela vá embora e deixe meu pai pois a situação está insustentável! Me ajudem?

Querida irmã, me compadeço da inquietação do seu coração diante dessa situação no casamento dos seus pais. Sua família está em minhas orações e desejo profundamente que Deus restaure e vivifique seu lar conforme Sua vontade. Queremos que saiba que oramos muito sobre como responder a essa pergunta, pois é uma situação delicada. Desde o começo, gostaríamos de enfatizar que não somos aconselhadoras especializadas, mas apenas irmãs em Cristo tentando ajudar outras irmãs. Por favor, procure ajuda em sua igreja local, especialmente da liderança, pois eles sim poderão te ajudar de forma completa, pois te conhecem e conhecem sua situação de perto.

O divórcio é tema em discussões teológicas há bastante tempo, e esse tema do divórcio em meio a abusos tem sido especialmente discutido atualmente, sem que haja necessariamente um consenso entre os que o debatem. Entretanto, tentaremos humildemente trazer um ponto de vista aqui, reconhecendo que ele não seja o único.

Quando o casamento se torna algo difícil, o divórcio parece ser a única solução para o problema. Talvez sua mãe esteja em uma encruzilhada – o lugar onde você decide se deveria continuar ou desistir, ou quem sabe ela esteja sentindo que em breve estará ali tendo que tomar essa decisão sobre seu casamento. Mas, antes de considerar os pensamentos de abandonar o matrimônio, por favor, continue lendo. Assim como ouvi uma vez, quando você chega ao final da sua corda, faça um nó e segure-se nela. Minha vontade é que sua mãe abra a mente para a possibilidade de que, apesar de tudo, pode haver esperança para sua situação.

Sabemos que a Palavra de Deus é apta e completa para nos instruir em todo nosso caminho. Não podemos esquecê-la, afinal, ela é o poder de Deus. No livro de Mateus, capítulo 19, Jesus se viu mais uma vez questionado pelos fariseus, homens que sempre estavam a postos para fazer com que de alguma forma a autoridade e o saber de Jesus fossem questionados pelo povo. Perguntaram então a Ele se era lícito ao marido repudiar (que quer dizer “separar-se”) da sua mulher por qualquer motivo. Jesus iniciou sua resposta lembrando-lhes do propósito central de Deus para o casamento: o que Deus uniu, não o separe o homem. Ou seja, Jesus deixa muito claro que não é da vontade de Deus, não O agrada, quando o divórcio é feito sob qualquer pretexto.

Diante disso, Jesus continua sua explicação afirmando que devido ao pecado (a dureza do coração do homem – v. 8) Moisés trouxe uma situação na qual permite o divórcio. Jesus diz no verso 9 “eu porém vos digo: quem repudiar sua mulher, não sendo por CAUSA DE RELAÇÕES SEXUAIS ILÍCITAS, e casar com outra, comete adultério [e o que casar com a repudiada comete adultério]”.

Jesus dignificou o casamento muito acima do nível então aceito, declarando ser o princípio e plano divino, que o casamento seja indissolúvel. Porém, em caso de adultério por parte do cônjuge, nasce ao outro a permissão para o divórcio, bem como contrair um novo casamento. Jesus ao responder, superou as expectativas dos rabinos, assim como as regras civis. Ele os respondeu pelos princípios que Deus dotara o mundo ao criar o homem. Portanto, a intenção de Deus não é só que as pessoas casadas fiquem juntas para sempre, mas que também tenham em amor plena união de corpo e alma.

Esse texto é praticamente usado de forma unânime entre os teólogos para fundamentar a permissão do divórcio. No entanto, há outro texto que se encontra na primeira carta de Paulo aos Coríntios, onde ele, inspirado por Deus, fala no capítulo 7 a respeito da estabilidade da família. Aqui, Paulo aborda uma segunda possibilidade para o divórcio.

Incialmente, assim como Jesus, Paulo fala que marido e mulher não devem separar-se. O princípio é conservar o casamento. Sendo o marido incrédulo – o caso do seu pai, minha irmã – este recebe influência direta do Espírito Santo pela forma como sua mãe se relaciona com ele (“é santificado no convívio da esposa” – v. 14). Todavia, no verso 15, se o descrente quiser apartar-se, ou seja, quiser abandonar sua esposa ou de fato fizer isso, em tais casos não fica a mulher (ou o homem, em alguns casos) sujeito à servidão.

Assim sendo, o crente não deve ter seu casamento com o descrente acima do seu relacionamento com o Senhor. A fé em Cristo não pode ser abandonada em favor da permanência do cônjuge. Isso se dá basicamente quando o descrente não aceita conviver com a conversão do outro, impondo ao crente a escolha entre sua permanência no lar ou negar a sua fé em Jesus Cristo. Se o cônjuge descrente deixar o outro em reação contra o Evangelho, o crente não tem culpa (Lc 12:51; 14:26; 21:16).

Minha querida, isso é o que a Bíblia nos instrui a respeito do divórcio, mas qual seja a decisão, antes de tudo, aconselho vocês a persistirem em oração pelo seu pai. Junte-se à sua mãe nessa luta espiritual tão árdua. Você afirma não saber como ajudá-la, mas saiba que ao ver você junto a ela em oração pela salvação da vida dele, suas forças para permanecerem firme nesse propósito serão renovadas. Junte-se a ela em clamor e fervor aos pés de nosso Deus Todo-Poderoso. Unam seus corações partidos ao coração perfeito de Jesus e intercedam por arrependimento, perdão, cura e transformação na vida do seu pai. Seja com ele permanecendo no lar de vocês ou não. Não desistam.

Somos também instruídos a perdoar uns aos outros da mesma maneira que Deus nos perdoa ao contemplar a justiça de Cristo em nós. As traições do seu pai, sejam elas por vias de fato ou através da pornografia, podem ser levadas a Deus em perdão. Incluo a pornografia, pois Jesus nos ensina em Mateus 5:28 que aquele que olhar para a mulher do próximo com intenção impura, em seu coração, já cometeu adultério com ela. Portanto, em um casamento, apesar de haver adultério, o cônjuge pode escolher perdoar à semelhança de Deus para com nossos pecados. O perdão não é um sentimento, mas uma decisão. É a decisão de oferecer graça. O perdão remove a barreira e abre a possibilidade para um renovo de vida, por vezes não de forma automática e instantânea, mas permite que a pessoa seja progressivamente restaurada, vendo Cristo no ato do perdão. Permanecendo ou não a união entre seu pai e sua mãe, o perdão é valioso e traz esperança.

Algo importante de enfatizar nesse caso, querida, é que vocês busquem apoio e ajuda de seus líderes na igreja local, no caso os pastores e presbíteros. É parte do papel deles protegerem as ovelhas, e para que isso aconteça é preciso que eles saibam o que tem acontecido. Espero que você faça parte de uma igreja local saudável e que a liderança seja firme e piedosa.

Em relação às agressões verbais constantes, violência emocional, não ignorem isso ou finjam que não acontece. Uma coisa posso dizer, minha querida – não há casamento com a morte. Portanto, é conhecido civilmente no Brasil a violência psicológica como qualquer conduta capaz de causar dano emocional e diminuição da autoestima ou que prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento de alguém ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões (art. 7º, II, Lei 11.340/06), razão pela qual, ainda que pouco difundida como agressão, é passível de concessão de medidas protetivas de urgência, como por exemplo a denúncia, por parte da vítima, e a retirada do abusador do seu convívio. As dolorosas cicatrizes feitas por palavras duras já são motivos pra se buscar um aparato civil.

Nessa ideia, realço: se há agressões emocionais, não se demora para que essas se encaminhem para agressões físicas. E mesmo que não se encaminhem dessa maneira, não hesite minha irmã, busquem ajuda. Estar envolvida numa igreja local é muito importante para que vocês possam compartilhar sobre essa situação com uma conselheira confiável ou com o pastor. Talvez sua mãe possa se sentir envergonhada e se isole das fontes de apoio, com medo de saberem o que acontece dentro da sua casa. Porém Deus nos diz “levai as cargas uns dos outros” (Gl 6:2). Ajude ela nesse aspecto para que, compartilhando com a igreja, ela tenha encorajamento e conselho sobre como responder às reações do seu pai até mesmo de modo civil. Ela tem uma promessa em 1 Pe 3:1,2 de que mesmo seu pai se recusando a ouvir o Evangelho por meio dela ou da igreja, ele pode ver o Evangelho sendo vivido através do serviço favorável e piedoso a ele.

Viver dentro desse relacionamento pode estar sendo opressivo e exaustivo. Por isso mais uma vez a faço lembrar que a força pra enfrentar tudo isso vem do relacionamento com Deus. Jesus ama sua mãe e compreende sua fraqueza e dor. Por Ele compreender completamente as suas aflições, não hesite em se achegar “confiadamente junto ao trono da graça, a fim de receber misericórdia e achar graça para socorro em ocasião oportuna” (Hb. 4:16).

A solidão que normalmente existe em virtude das dificuldades no casamento pode ser substituída pela abundante alegria e contentamento em Cristo, lembre sua mãe disso. Não há verdadeira felicidade fora de Cristo. Mesmo que o seu pai viesse a ser transformado e se dispusesse a fazer tudo o que pode para agradar e satisfazer todo o sentimento de vazio na vida da sua mãe, ele falharia nessa busca. Existe apenas uma pessoa que pode fazer isso e Seu nome é Jesus. Não estou dizendo que desejar um bom casamento, um marido fiel, gentil e amável seja errado. Mas a ideia que essas coisas satisfarão num nível mais profundo, a ponto de nunca se sentir sozinha, é um erro. Esperar que o marido em algum momento da vida traga satisfação completa é idolatria, pois não se pode esperar dele algo que somente Deus pode fazer.

Cristo ajudará sua mãe enquanto ela clama a Ele por força. Para confiar em Deus durante as dolorosas circunstâncias da vida, é preciso ver sua vida pelos olhos da fé. Você deve crer que Deus está no controle e que a ama perfeitamente. O mal não pode tocar seus Filhos a menos que Ele permita. Podemos nos surpreender questionando o controle de Deus porque não entendemos o que Ele está fazendo. Mas nossa falta de entendimento não muda o fato de que Deus é Todo- Poderoso. Todo o sofrimento em nossas vidas tem significado e propósito no plano eterno de Deus, que é para nosso bem final e Sua glória (Rm 8:28-29).

A nossa união com Cristo é um relacionamento vivo, Ele sonda todo o seu coração, minha irmã. Vocês não estão nessa jornada sozinhas. Deus mostrará o Seu poder e graça. Coloque sua esperança nEle, naquele que traz a paz que excede todo conhecimento. Coragem em Cristo, minhas queridas.

O que posso dizer, por fim? Nós, do Graça em Flor, não temos como dizer que sua mãe deve ou não separar-se de seu pai. Para ajudar na tomada dessa decisão seria preciso um contato direto com vocês, um acompanhamento diário e de perto. Por isso nós não trazemos uma conclusão ou resposta final a vocês. Mas oramos que essas diretrizes gerais acerca do tema as ajudem. Por favor, busquem ajuda de pessoas locais, confiáveis e capacitadas. Busquem conhecimento cívico dos direitos de sua mãe na situação em que está. Novamente, por favor busquem ajuda. Abuso no casamento é seríssimo e deve ser tratado e nunca ignorado.

Por fim, querida irmã, lembre-se que você é a filha deles, e isso significa que não é seu papel social ou espiritual solucionar os problemas que eles têm vivido. Claro que você quer vê-los bem e especialmente proteger sua mãe. Mas não coloque sobre os seus ombros um peso maior do que você pode, ou deve, carregar. Confie no Senhor – Ele sim é Salvador, você não. Coloque todos os seus fardos sobre Ele, porque Ele tem cuidado de vocês (cf. 1 Pe. 5:6).

Orando por vocês.

Luana
Aconselhadora da Equipe Graça em Flor

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