Como me abrir emocionalmente? (Graça Responde #16)

Tenho dificuldade de me abrir para as pessoas, principalmente em relação às minhas dúvidas e sentimentos, o que fazer?

Nenhum homem é uma ilha isolada; cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra” é uma frase atribuída ao poeta inglês John Donne (1572-1631) que já está disseminada no vocabulário popular. Porém, sua essência foi registrada muitos anos antes nas Escrituras Sagradas, e é sob essa ótica que vamos refletir juntas sobre a importância dos relacionamentos em nossas vidas.

Deus nos dá exemplo de relacionamento por meio da Trindade. Pai, Filho e Espírito Santo: três Pessoas distintas e individuais, eternamente juntas e em cooperação. Cada Um envolvido no que o Outro faz. Não pretendo discorrer sobre o assunto, mas apenas recordar o fato de que Deus, embora  onipotente, autoexistente e totalmente independente, é um Ser relacional.

Após criar o homem, “disse mais o Senhor Deus: não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma auxiliadora que lhe seja idônea” (Gn 2.18). Esse texto não fala apenas de casamento mas mostra a profunda necessidade que temos de nos relacionar – necessidade que Ele colocou em cada um de nós. 

Posteriormente, em várias de suas cartas, Paulo discorre sobre a unidade da Igreja em sua diversidade. Nisto está a beleza e a singularidade da Igreja do Senhor: diferentes irmãos, cada um com suas qualidades e defeitos que os tornam interdependentes, se relacionam entre si e com Cristo. O fato de ter dificuldade em se abrir não te exclui do corpo, querida irmã, e pode ter certeza de que sua ausência interfere no bom funcionamento dele.

Saindo do Éden, passando por Israel, pelos dias de Cristo, pelas primeiras igrejas e chegando à ilha de Patmos, vemos histórias construídas à base da parceria entre Deus e o homem, e este com seu semelhante.  Relacionamentos, por mais difíceis que possam ser, fazem parte do plano traçado para a humanidade.

Na contramão de tudo isso, temos em nossos dias a disseminação da ideia de que somos autossuficientes, completas em nós mesmas e não precisamos de ninguém. Sentir-se bem e confortável é o que importa. Por vezes, sem percebermos, raízes vão sendo criadas em nós e padrões antibíblicos se tornando aceitáveis.  

Não devemos nos conformar a este mundo, mas nos transformar pela renovação de nossas mentes, para que experimentemos a boa, perfeita e agradável vontade de Deus (cf. Rm 12.2). E isto não nos isenta de confrontação e dor, afinal, não é fácil sair da zona de conforto. O fato de ter reconhecido sua dificuldade e buscado orientação mostra que já está nesse caminho, portanto, olhe para dentro de si, identificando os reais motivos que te impedem de nutrir relacionamentos profundos. 

Examine suas motivações. Por que tem dificuldade em se abrir? Algum trauma do passado? Não consegue mais confiar nos outros? Ninguém está “à sua altura”? Sente-se inferior? Pensa que não precisa disso? 

Caso algum fato ocorrido no passado te deixe com medo de estabelecer novos laços, gostaria de te dizer que é possível recomeçar. Olhemos para Jesus: após ser traído por aquele que comia à mesa com Ele e ser abandonado pelos seus amigos (Lc 14.50), não deixou de ter misericórdia e dar uma segunda chance a esses. Dê uma nova oportunidade aos relacionamentos, desde que eles não tenham sido abusivos, e não deixe de ver o que te ocorreu como uma possibilidade de amadurecimento.

Para as relações passadas e as que venha a estabelecer, tenha em mente que todo homem é pecador. Isso é importante para que consiga se desvencilhar de fatos ruins que aconteceram e para que construa novas histórias com lucidez, ciente de que estarão sujeitas a falhas simplesmente porque o outro não é perfeito, como você também não é.

Embora seja difícil de admitir, verifique se a dificuldade não provém do orgulho. O desejo de não depender das pessoas, de parecer forte, não revelar suas imperfeições ou mesmo o comodismo de permanecer onde está. Pode ser também que se sinta inferior ou desinteressante. Muitas vezes nosso ego, inflado ou ferido, fala mais alto que a vontade de Deus e nós nem percebemos.

À luz da Palavra, percebemos que não basta apenas reconhecer e abandonar o pecado, é preciso fazer o que é certo também. Por exemplo, quando Jesus efetuava curas também perdoava pecados e dizia “vá e não peques mais”, ou seja, “seus pecados estão perdoados, mas mude de vida”. Uma vez reconhecendo o que te impede de estabelecer relacionamentos profundos é o momento de procurar estabelecê-los.

Deus te criou com habilidades e colocará em seu caminho pessoas que te ajudem a se desenvolver, cumprir o seu propósito e se aproximar dEle. Vejamos os seguintes exemplos: Moisés era um bom líder, mas não falava bem, Deus colocou ao seu lado Arão que tinha uma boa oratória (cf. Ex 4.10-16) e, juntos, participaram da libertação do povo de Israel do Egito. Paulo com os olhos cansados devido à idade contava com seus auxiliares para escrever cartas às igrejas. 

Seja corajosa. Os começos não costumam ser fáceis. Seu coração orgulhoso pode se mostrar resistente para iniciar uma conversa, se abrir, mostrar suas vulnerabilidades. Mesmo que gagueje, as palavras faltem ou fique envergonhada, siga em frente crendo que é da vontade de Deus que relacionamentos aconteçam. Procure ver além daquele momento de interação, tenha em mente o propósito que levou a tudo isso.

À medida que os diálogos fluem e os relacionamentos se intensificam, seja prudente. Pessoas são falhas e não são capazes de suprir todas as nossas necessidades, portanto, não as coloque no lugar que pertence ao Senhor em sua vida – isso configura idolatria. Esteja firmada em Cristo e coloque suas expectativas e sua confiança somente nEle. Por mais que amigos sejam bênçãos de Deus, lembre-se que são somente dádivas, não os coloque no lugar do Doador. 

Deus permite que nos relacionemos para que também abençoemos outros. Você tem características que outras pessoas precisam. Lembra-se da metáfora do corpo para falar da Igreja? As pernas precisam dos pés, que por sua vez precisam dos olhos. Você faz parte do povo de Deus e tem responsabilidades a cumprir. Não negligencie seu chamado. Jesus ficou Sozinho na cruz para que nós nunca mais ficássemos sós.

Querida amiga, acredite, sei que para muitos conseguir se abrir é uma luta grande a ser travada. Se olharmos somente para nós, nossa história e limitações, não sairemos do lugar e sempre encontraremos desculpas para permanecer onde e como estamos. 

Como tudo aqui não é sobre nós, olhe para Deus e Sua vontade revelada nas Escrituras. Saiba que a graça dEle é suficiente para que vença seus medos e é por meio de suas fraquezas que o poder dEle é evidenciado (cf. 2Co 12.9). Ele não espera que você seja perfeita, mas que comece do jeito que é porque é Ele quem te conduzirá e aperfeiçoará por meio de relacionamentos profundos.

Mais importante que métodos ou fórmulas para iniciar uma conversa é ter o propósito enraizado no coração, disposição para lutar contra as dificuldades que o pecado tenta colocar e ser intencional. Afinal, precisamos começar aqui algo que durará por toda a eternidade: a união dos remidos de Deus. 

Naquele que nos une em um só Corpo,

Jaqueline
Equipe Graça em Flor

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