Como lidar com a perda de alguém (Falando sobre o luto)

Há alguns anos, minha tia compartilhou comigo uma descrição bastante impactante do sentimento que lhe sobreveio no velório de sua mãe (e minha avó paterna). Ela lembrou que, no momento em que o corpo da minha avó estava sendo velado, apesar da comoção geral havia um grupo de pessoas, um pouco afastadas do salão, que estava sorrindo e dando gargalhadas, provavelmente por alguma piada que tinha sido contada. Naquele momento, minha tia disse que sentiu muita fúria e revolta. “Como alguém poderia sorrir no dia mais triste de minha vida?”.

Talvez esse sentimento seja bastante parecido com o seu neste momento, ou de alguém que você conhece. Por isso, lhe convido a passear pelo texto de João 11, para que, juntas, possamos aprender algumas valiosas lições da Graça através do luto.

Antes de iniciarmos, vale lembrar alguns fatos interessantes sobre essa narrativa. Jesus era muito próximo daquela família e a tradição diz que ele costumava repousar naquela casa quando passava pela região do Monte das Oliveiras. Maria foi aquela que ungiu os pés do Mestre com um perfume, e os enxugou com seus cabelos. Marta era a irmã atarefada e que aprendeu o prazer de permanecer na presença de Cristo, apesar das tarefas acumuladas no lar.

Nesta ocasião, Lázaro está muito doente e suas irmãs pedem para contar a Jesus, a fim de que Ele viesse visitá-lo. Porém, em Seus desígnios perfeitos, o Mestre decide ficar ainda dois dias no local onde se encontrava. Ao chegar na casa desta família, depois de mais dois dias de viagem, recebe a triste notícia de que Lázaro já havia falecido há quatro dias.

Imagino que, agora, já estamos todas familiarizadas com o contexto envolvido, então, vamos às lições:

“Senhor, se tu estivesses aqui”

Quantas vezes não olhamos para o nosso Senhor com decepção ou raiva, pensando que Ele poderia ter impedido o mal e a dor em nossas vidas? Se você está vivendo esse sentimento agora, saiba que não é a única.

As duas irmãs de Lázaro fizeram as mesmas declarações: se Jesus estivesse ali, se viesse mais rápido, se tivesse vindo na hora em que elas O chamaram, a morte não teria entrado naquele lar. Entretanto, a resposta de Jesus é clara como a luz: aquela situação serviria para que o Filho de Deus fosse glorificado. Ao contrário do que a nossa dor e o nosso pecado nos fazem pensar, Cristo não tem prazer no nosso sofrimento; mas Ele é Todo-Poderoso para transformá-lo em Graça.

Lembre-se: a morte nunca fez parte do plano de Deus. Seria incoerente se fizesse, já que o mesmo Jesus que chegou “atrasado” para impedir a morte de Lázaro, há pouco tempo havia declarado que veio para que tenhamos vida, e com abundância (João 10:10). De quem seria a “culpa”, então?

A Bíblia não nos omite essa resposta: o pecado é o vilão de nossas histórias. Ele é o culpado pela decadência da humanidade, pela maldade que provoca tantos males e pelo luto que vivemos e/ou viveremos (conforme nos ensinam os textos em Romanos 3:23 e 6:23). Em seu marcante livro “Decepcionado com Deus”, o autor Philip Yancey frisa esse mesmo ponto de vista que, creio eu, é a perspectiva correta sobre o sofrimento humano.

Ao ser questionado sobre a existência real da justiça, ele conta que percorreu os Evangelhos, imaginando como Cristo teria respondido. “Em lugar algum o encontrei negando a injustiça. Quando Jesus encontrava uma pessoa enferma, jamais fazia uma palestra do tipo ‘aceite a vida como ela é’; ele curava quem quer que o procurasse. E suas palavras incisivas quanto aos ricos e poderosos de sua época mostram claramente o que pensava das desigualdades sociais. O Filho de Deus reagiu à injustiça da vida de modo bem parecido como qualquer outra pessoa. Quando encontrava uma pessoa sofrendo, ficava profundamente tocado. Quando seu amigo Lázaro morreu, ele chorou. Quando o próprio Jesus se defrontou com o sofrimento, retraiu-se, três vezes perguntando se havia alguma outra saída. Deus respondeu à pergunta sobre a injustiça não com palavras, mas com uma visita, uma Encarnação. E Jesus oferece uma prova de carne e osso de como Deus se sente quanto à injustiça, pois ele vestiu a ‘matéria’ da vida, a realidade física no que tem de mais injusto”.

Minha irmã, se há alguém que conhece sua tristeza, esse alguém é o nosso Jesus. E Ele nunca escondeu a presença do sofrimento durante nossa trajetória deste lado da eternidade: “Tenho-vos dito isto, para que em mim tenhais paz; no mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo” (João 16:33, grifo meu).

Nesses dias difíceis pelos quais você tem passado, passou ou ainda passará, lance mão das verdades fundamentais que germinaram o solo de sua fé. Enquanto vivermos, sofreremos. Mas, nosso Deus é um Deus de vida, de restauração, de esperança. Ele se fez carne para derramar em nossos corações o bálsamo que cura a devastação que a morte e o sofrimento causam. Não perca isso de vista, principalmente nos dias mais negros.

Não quero diminuir ou desprezar sua dor. Pelo contrário, creio que ela é genuína, e excruciante. Mas, tomo a liberdade de sugerir que, apenas por agora, volte os olhos para Cristo. As verdades da Palavra nos mostram o caminho da Graça.

O nosso Mestre chora

Philip Yancey também escreveu neste livro que “a cruz revelou que tipo de mundo nós temos e que tipo de Deus nós temos.” Na narrativa de João 11, também aprendemos sobre como Jesus lida especificamente com a morte.

Deus, em Sua humanidade, ficou sensibilizado e demonstrou empatia como se a dor fosse Sua (João 11:35). Ele mesmo ensinou sobre a bem-aventurança aos que choram. Sim, Cristo sofreu e sofre com os que sofrem. Ele choraria com você neste momento difícil, tenha certeza. Ele é SHAMAH, Deus presente!

Um dos detalhes mais esplêndidos do texto é que Ele sabia que iria operar o milagre, mas, mesmo assim, se comoveu pelo sofrimento de suas amigas. Infelizmente, no meio cristão há pessoas que reprimem e ensinam a reprimir as lágrimas, como se fosse sinal de fraqueza ou falta de fé. São pessoas muito rígidas, que estão fora da realidade e fora da Palavra. O nosso Mestre chora, por quê não podemos nós também chorar?

Noemi e Rute, duas grandes mulheres do Antigo Testamento, também passaram por momentos dolorosos de perda. Noemi sofreu ao ponto de mudar seu nome para “Mara”, que significa amarga. “Porque grande amargura me tem dado o Todo-Poderoso. Cheia parti, porém vazia o Senhor me fez tornar; por que pois me chamareis Noemi? O Senhor testifica contra mim, e o Todo-Poderoso me tem feito mal” (Rute 1:20,21).

Mas, a história delas não termina com o luto, assim como a sua também não termina desta forma. É importante lembrarmos que não devemos perder de vista que há um tempo para o pranto. Ele vai findar, junto com todo o clamor e as dores da vida (Apocalipse 21:4). Toda dor é por enquanto!

Há um tempo para o pranto. Ele vai findar, junto com todo o clamor e as dores da vida. Toda dor é por enquanto! Click To Tweet

Abra espaço para a Graça

A morte nos faz ter um vislumbre maior da brevidade da vida e, consequentemente, da beleza da Eternidade. Cá está mais uma verdade fundamental para fortalecer sua fé: a morte de Cristo tira nossos pecados, mas é a Sua Ressurreição que nos dá esperança. Se Cristo tivesse permanecido na tumba, o que poderíamos esperar do futuro? Quando nos apegamos à certeza da Vida Eterna, a morte perde seu poder.

E aqui, faço uma breve pausa para frisar a urgente necessidade de divulgarmos essa mensagem. O sacrifício de Cristo não pode ser uma história contada entre as paredes de nossas escolas dominicais e apresentações especiais de Páscoa. Não podemos guardá-lo como um tesouro intocável. Nossos queridos precisam ouvir dessa esperança!

Se abrimos espaço para Cristo em nosso luto, a Graça invade cada cantinho de nosso coração e não só trata feridas e ameniza a saudade, como também cria pensamentos e atitudes que revelam a esperança pelo reencontro, da ansiedade pela vida eterna com Cristo, e da certeza de que o dia da morte de nossos irmãos em Cristo é só um “até breve”.

A ressurreição de Lázaro foi só um vislumbre da magnífica ressurreição de Cristo. E hoje, é também um vislumbre glorioso do que Cristo pode fazer com nosso coração enlutado. Sim, Ele nos faz ressurgir das cinzas de nossas dores, perdas e decepções. Ele nos chama para fora, desata os nós da tristeza e diz “deixem-na ir”. Que liberdade encontramos em Cristo!

Como lidar com a perda que não é minha?

Creio ser de fundamental importância aproveitar este tempo juntas para falarmos sobre nossa postura, nossas palavras e nossa disposição em ajudar quem está enlutado.

Separei 5 conselhos, baseados em relatos de mães que perderam seus filhos, filhos que perderam seus pais, e outras dores que o luto causou em pessoas próximas.

Esteja presente. Certa vez, refletindo sobre o luto de uma pessoa querida, cheguei à conclusão de que estar é o jeito mais amoroso de consolar. Não precisa dizer nada. Apenas esteja lá.  No momento de dor, o simples fato de ver um rosto conhecido demonstrando carinho e dedicando seu tempo, já é um consolo divino.

Divida o choro. A Palavra nos ensina essa lição em Romanos 12, versículo 15, justamente por ser esta uma tremenda demonstração de compaixão por nosso próximo. A dor compartilhada é instrumento de Deus para a cura de nossa alma.

Ofereça apoio durante e depois. Ligue periodicamente, mande mensagens, se ofereça para fazer uma visita, ore por e com a pessoa, leve uma pizza, busque-a para tomar um sorvete. Ouvindo alguns testemunhos de mães que perderam seus filhinhos durante a gravidez, aprendi que a dor faz nossas forças vacilarem. É muito importante que amigos e familiares se apresentem como alicerces e não permitam que a pessoa permaneça prostrada na lama da tristeza. Mas, antes de agir, peça sabedoria a Deus para que essas atitudes não sejam vistas como inconvenientes. O propósito do apoio é abençoar, dividir o fardo.

Não lance conselhos vãos. Se a dor não é sua, não a defina, tampouco a classifique com base no que você conhece ou viveu. Esteja pronta para ouvir mais do que falar (Tiago 1:19). Evite lançar conselhos como “Deus está permitindo essa dor porque você é forte”. Minha irmã, nunca conheci alguém forte o suficiente para não se abalar com a morte. Quando puder falar, fale sobre esperança, sobre a vida eterna em Cristo, sobre o consolo que recebemos do Espírito. Busquemos o que nos ensina o Salmo 19:14 “Sejam agradáveis as palavras da minha boca […]”.

Não force a barra. Cada luto possui suas particularidades. Há quem prefira se cercar de pessoas para não sentir o peso da ausência, como fizeram Maria e Marta. Enquanto isso, há aqueles, como Jó, que preferem o silêncio, a solitude, os momentos de choro particular. Seja a amiga que compreende a dor do próximo, a ponto de entender que ele não está evitando a sua presença. Coloque-se à disposição, demonstre cuidado e amor, mas peça a Deus sabedoria para entender o momento de se afastar, se necessário.

Querida irmã, se há alguma palavra de esperança da qual eu posso me apropriar para concluir o assunto, é esta: a morte tem data certa para morrer (leia novamente Apocalipse 21:4, é glorioso!). Sua dor não é o seu fim, mas parte do processo de construção que Deus só finalizará em sua vida quando ouvirmos o eco das trombetas. E que dia glorioso será!

“Disse-lhe Jesus: Eu sou a ressurreição e a vida; quem crê em mim, ainda que esteja morto, viverá. E todo aquele que vive, e crê em mim, nunca morrerá. Crês tu isto?” (João 11:25 e 26)