Como as Redes Sociais Afetam Nossa Mente

Quando acorda, ainda sonolento, a primeira coisa que você faz é buscá-lo. Durante o café da manhã ele está ao seu lado, após o almoço é sua companhia e a noite é a última interação. Enquanto você trabalha ou estuda, lá está ele, e basta um sinal para que ele roube sua atenção por um bom tempo. Chega a ser impensável afastar-se dele por algumas horas. 

Você sabe sobre o que estamos falando.

O ser humano desenvolve tecnologia desde o Éden. A obediência ao comando feito pelo Senhor aos homens de sujeitar a terra (Gn 1:28) contém a premissa de transformar matéria-prima em ferramentas, artefatos, roupas etc. Criar produtos e desenvolver tecnologias são atividades que fazem parte da graça comum concedida por Deus.  

É simplista, e mentiroso, afirmar que a internet e as redes sociais são tecnologias maléficas em si. Uma faca pode ser usada para cortar alimentos que serão transformados em uma bela refeição, mas também pode ser usada para matar alguém. De maneira semelhante, as redes sociais podem ser usadas para conhecimento, edificação e lazer equilibrado, mas também podem ser instrumentos de comparações, ansiedade e descrença.

Ao passo que é superficial demonizar as redes sociais, é ingenuamente perigoso pensar que usar essas ferramentas de modo indiscriminado não afetam a forma como vivemos e pensamos. Como disse o professor Edward Tufte, citado no documentário “O Dilema das Redes” (Netflix): “Existem apenas duas indústrias que chamam seus clientes de usuários: a de drogas e a de software”. 

O tic-tac do relógio e a dopamina

Se a descrição do início desse texto tem alguma semelhança com a sua rotina, certamente você já se sentiu culpado pelo tempo que tem destinado ao uso do celular e das redes sociais. O problema é que a culpa é um motivador muito volátil quando se trata de tomar decisões a longo prazo.

Conforme pesquisas recentes [1], a média mundial de tempo de permanência das pessoas na internet gira em torno de 7 horas diárias. Considerando que a média de sono de um adulto é de 7 a 8 horas, significa que passamos quase metade do nosso tempo acordados usando a internet. Isso corresponde, ao longo de uma semana, a termos passado ao menos dois dias inteiros online. As estatísticas são mais alarmantes no Brasil (2º país mais conectado do mundo) – os brasileiros passam em média de 10 horas e 08 minutos por dia conectados, sendo 3 horas e 42 minutos desse tempo nas redes sociais. 

Por que é tão difícil desconectar? Por que temos a tendência de checar o celular a cada 4,3 minutos [2]? Como esse tempo empregado em redes sociais afeta nossas mentes? A resposta curta seria: neurotransmissores.

Existe um neurotransmissor chamado dopamina produzido pelo cérebro no sistema mesolímbico (o “circuito de recompensa”). A liberação de dopamina ocorre quando as pessoas sentem prazer decorrente de um estímulo externo – por exemplo, atividades físicas, jogos ou até consumo de drogas. Dentre esses estímulos externos temos um que está na palma das nossas mãos: as redes sociais.

Barra de rolagem infinita, curtidas, comentários, atualizações… tudo isso gera uma descarga de dopamina que nos faz querer voltar à fonte regularmente. Esses mecanismos são exemplos do que os especialistas comportamentais chamam de reforçadores de razão variável: fontes que prometem recompensas, mas nunca sabemos quando ou em qual quantidade essa recompensa virá, mecanismo semelhante a uma máquina caça-níquel.

Essa comparação não é por acaso. O pesquisador de Harvard, Trevor Haynes, diz que redes sociais como Facebook e Instagram fazem uso do mesmo circuito neural usado por máquinas caça-níqueis e cocaína [3]. Por funcionarem dessa forma, paulatinamente o usuário das redes sociais começa a portar-se como um apostador: impelido a checar seu celular constantemente a fim de buscar uma recompensa, ou seja, uma nova descarga de dopamina.

Como dito anteriormente, é ingenuidade fechar os olhos para o fato de que as redes sociais são feitas para que passemos o máximo de tempo nelas [4]. Quanto mais tempo conectados, mais lucro para empresas e patrocinadores. Talvez você pense: “Lucro? Redes sociais são gratuitas, eu não estou pagando nada para usá-las”. É verdade, não pagamos para usá-las porque somos, de certa forma, o próprio produto.

Tendo por base o que vimos sobre liberação de dopamina, é possível começarmos a delinear como as redes sociais afetam nossa mente. A dopamina, como dito, é um neurotransmissor liberado quando nos expomos a algum tipo de estímulo externo causador de prazer. Uma vez que temos nas redes sociais uma fonte fácil e sempre disponível de pequenas doses de prazer, nosso cérebro começa a interpretar que não precisa mais produzir quantidades habituais desse neurotransmissor.

Sendo assim, passa a ser preciso gastar cada vez mais tempo em atividades corriqueiras para alcançar níveis comuns de prazer e bem-estar. Pelo uso excessivo do celular, as pessoas passam a jogar mais, assistir mais, comer mais… Além disso, o uso excessivo de redes sociais também está relacionado ao aumento das taxas de ansiedade, depressão e déficit de atenção, podendo causar, inclusive, alterações na estrutura do cérebro.

A Fonte de alegria e as cisternas rotas

Sobre o uso excessivo das redes sociais, a psicóloga e pesquisadora Anna King disse: “Geralmente quem busca muito acessar tecnologias em busca de prazer procura preencher algo que falta nele” [5]. A busca constante por doses de bem-estar nada mais é senão nosso coração ansiando pelo que sentimos falta: a real fonte de alegria, prazer, aceitação e identidade – o Senhor (Sl 4:7; Sl 92:4; Sl 119:16; Lc 1:4).            

Talvez você saiba de todos os dados citados anteriormente e ainda assim se sinta preso a um padrão difícil de romper. Dados e conhecimento são importantes, mas não mudam vidas. Podemos ver documentários, ler livros, analisar números e com base em tudo isso tomar decisões que não durarão mais que duas semanas. Isso acontece porque a disciplina de que precisamos para usar as redes sociais de maneira equilibrada está apenas na liberdade de uma nova vida controlada pelo Espírito. Somente em Cristo encontramos real sabedoria para fazer o uso adequado das tecnologias de que dispomos.

E não se engane: nossa tendência caída de investir tempo em “máquinas caça-níqueis” vai muito além das recentes redes sociais. No início da década de 40, C. S. Lewis escreveu em seu livro Cartas de um diabo a seu aprendiz sobre a “Estratégia do Nada”. Segundo Lewis, essa seria uma estratégia usada por Satanás para ludibriar os homens e fazê-los chegar ao fim da vida com o peso do desperdício: “Você poderá fazê-lo perder tempo não apenas em conversas que lhe agradem, mas também em conversas com pessoas para as quais ele não dá a mínima, sobre assuntos que o entendiam. (…) E a estratégia do ‘Nada’ é bem forte: forte o bastante para roubar os melhores anos de uma pessoa, não em doces pecados, mas num sombrio devaneio da mente sobre sabe-se lá o quê nem por quê, na satisfação de curiosidades tão débeis que o homem se torna apenas semiconsciente delas […] ou em um longo e turvo labirinto de fantasias que não dão nem prazer nem satisfazem a ambição para lhe dar algum sabor, mas que, tendo sido iniciadas pelo acaso, a criatura estará fraca e inebriada demais para se livrar delas” (grifo meu).

Somos mordomos dos bens concedidos pelo Senhor, sendo o tempo um dos principais. As coisas nas quais investimos nosso tempo irão moldar nossas mentes e ações e podem nos levar para mais perto ou mais longe do grande alvo de nossas vidas: sermos parecidos com Cristo.

O maior problema não está nas redes sociais, mas sim em nossos corações. Quando nossos afetos não estão cativos a Jesus, a real fonte de alegria, somos presa fácil para qualquer hábito escravizador. Não podemos trocar a Fonte da Vida por cisternas rotas (Jr 2:13) e deixar que nossas mentes sejam moldadas pelos padrões gerados em horas e horas diante de telas. Precisamos usar as redes sociais de maneira intencional e responsável, sabendo que prestaremos contas a Deus pelo uso do tempo que nos foi dado.

Reflita: se soubesse que tem pouco tempo de vida, você decidiria empregar suas horas em acompanhar vidas de pessoas desconhecidas apenas por curiosidade, opinar ferrenhamente sobre assuntos sobre os quais não sabe o suficiente e passar horas contemplando o que não edifica? Como disse Tony Reinke em seu livro 12 maneiras como seu celular está transformando você: “Nada põe a mídia social e os hábitos no celular mais em perspectiva do que a dura realidade de nossa mortalidade. Deixe-o de lado um pouco. Dê-se conta da brevidade da vida, e isso fará com que você se sinta plenamente vivo” [6].

Nosso profundo desejo por alegria e conexão só será genuinamente satisfeito aos pés da cruz. Redes sociais, assim como trabalho, comida, lazer, quando usadas de maneira responsável, são bênção! Mas Jesus, e apenas Ele, é a real fonte de alegria, aceitação e pertencimento.

Quanto mais nossos corações estiverem escondidos em Cristo, mais capacitados seremos pelo Espírito para trocar as migalhas das máquinas caça-níqueis pela verdadeira recompensa do tesouro eterno. 

E até o Grande Dia, quando o veremos face a face, acordaremos dia após dia e, ainda sonolentos, buscaremos estar com Ele (Sl 5:3). Desde o café da manhã até o cair da noite, Ele será nossa companhia e fonte de alegria (Sl 3:5). No trabalho ou escola, nos alegraremos ao saber que nosso Amigo e todo o seu consolo estão a uma oração de distância (Sl 145:18). Você sabe sobre quem estamos falando. 

Cristo é a nossa liberdade! 


[1] https://www.linka.com.br/analytics/relatorio-global-do-digital-2021

[2] Reinke, Tony. 12 maneiras como seu celular está transformando você (p. 15). Editora Concílio. 

[3] https://estrategiasdedecisao.com/smartphone/ https://sitn.hms.harvard.edu/flash/2018/dopamine-smartphones-battle-time/

[4]  https://www.ufsm.br/midias/arco/como-redes-sociais-hackeiam-sua-mente/

[5] https://www.ufsm.br/midias/arco/como-redes-sociais-hackeiam-sua-mente/

[6] Reinke, Tony. 12 maneiras como seu celular está transformando você (p. 41). Editora Concílio.


Esse post faz parte da nossa série de postagens de Outubro com o tema “Redes Sociais”. Para ler todos os posts clique AQUI.