Como amar a terceira idade

A chegada dessa pandemia redirecionou nosso foco para prioridades que há muito tempo vinham sendo deixadas de lado. Essa semana li uma frase, de autor desconhecido, que dizia algo como “Antes, tínhamos as pessoas, mas não tínhamos tempo. Agora, temos o tempo e não temos as pessoas”. Como é duro o distanciamento, não? Mesmo que você tenha um perfil mais tímido e introspectivo, como eu, é difícil demais estar longe das pessoas. Além da saudade e da crescente necessidade de compartilhar a vida, somos alvos fáceis do egoísmo, do esquecimento e da falta de comprometimento com o outro, simplesmente pela falta de convivência.

Esse foi um dos motivos que me levou a participar de um novo ministério em minha igreja, chamado “Ligações de amor”, que nada mais é do que um grupo de irmãos comprometidos a amar os idosos de nossa igreja por meio de ligações, palavras de encorajamento, orações e, se necessário, apoio às necessidades materiais. Antes, este trabalho era feito quase que exclusivamente pelos pastores, e louvo a Deus pelos irmãos que se levantaram para atender a estes servos fiéis que estão sofrendo tanto com o isolamento. Os aprendizados são inúmeros e não quero guardá-los para mim. Por isso, lhe convido a conversar sobre o amor à terceira idade e as diferentes formas de praticá-lo.

Abismo de gerações

Não tenho a intenção de generalizar o comportamento do corpo de Cristo, mas gostaria de compartilhar o que observo na comunidade que me cerca: adolescentes e jovens adultos (mulheres ou homens) têm certa dificuldade em lidar com idosos. Entendo como algo normal, uma vez que as realidades são diferentes, e não somente isso mas também a linguagem, as perspectivas sobre a vida e as próprias experiências. Quem convive com idosos em casa ou na família parece ter mais facilidade em lidar com a “melhor idade” (como é popularmente conhecida), do que quem se relaciona apenas em ambientes públicos, como na igreja.

Entretanto, esse abismo entre as gerações não deve ser desculpa para que negligenciemos aqueles que vieram antes de nós e “pisaram o barro” do caminho que nos trouxe até aqui. Mesmo que haja certa dificuldade na comunicação, devemos considerar que estes irmãos e irmãs merecem o mesmo nível de respeito e amor que oferecemos aos demais. Desde o início recebemos essa diretriz do Senhor, quando Ele ensinou o povo a “honrar a face do ancião” (Levítico 19:32).

Não tive o privilégio de conhecer minha avó paterna, mas fui direcionada por meus pais a oferecer um tratamento diferenciado aos meus avôs e minha avó materna, de quem lembro com extremo carinho. Quando criança, meus pais ensinaram a pedir a benção a todos os meus tios e avós (novamente, ressalto que não tenho a intenção de generalizar ou evidenciar uma forma correta de agir) e lembro muito bem de como a falta deste gesto gerava punição, como uma chamada de atenção por esquecer de “pedir a bença”. Entendo que não se tratava de uma liturgia ou um ritual, mas uma forma de tratá-los com consideração especial. Foi como meus pais decidiram ensinar a mim e a meu irmão que aquelas pessoas inspiravam maturidade e mais experiência que eu, portanto precisávamos prestar a devida reverência.

Antes de prosseguir, preciso lembrar que nem todas as crianças, adolescentes e adultos possuem boas relações com seus avós ou com outros idosos. Não faço vista grossa a experiências negativas e tristes em relação a estes que deveriam ser um ponto de referência em nossas vidas. Porém, independente de quem seja o idoso, qual sua história, quais são seus pecados e suas dores, não há uma brecha no mandamento de amar. Cristo nos ensinou a amar os inimigos, e isso diz mais sobre obediência a Ele do que merecimento das pessoas. “Nós amamos porque Ele nos amou primeiro” (1 João 4:19). Compreendo e sinto muitíssimo se você tem uma experiência negativa com os idosos de sua vida, mas lhe encorajo a amá-los de forma prática e cristã, como poderemos aprender adiante.

Amando em ações

Ao conversar com um pastor já idoso, perguntei-lhe como podemos demonstrar amor a pessoas tão diferentes de nós no aspecto cultural e de idade. Compartilho estes conselhos como uma forma de incentivar-lhe:

  • Valorize a pessoa, sua sabedoria e experiência, principalmente se for um cristão;

Nós não temos conhecimento de tudo o que esses idosos já viveram, o que sofreram, pelo que choraram e quem já perderam na vida. Mesmo que tenhamos ressalvas quanto a alguns comportamentos, a Palavra nos ensina a sermos sujeitas a eles, ouvindo-os com paciência e respeito, considerando-os como nossos semelhantes. “Rogo igualmente aos jovens: sede submissos aos que são mais velhos” (I Pedro 5:5).

  • Não trate-os como crianças, desconsiderando os anos de experiência e maturidade;

Talvez esse conselho seja mais “prático” para quem lida com idosos na família e se envolve nos cuidados pessoais. Há momentos em que a vontade do idoso é ignorada e ocorrem repreensões como se fosse uma criança que não tem condições de cuidar de si próprioa. Mas, a Palavra nos direciona para uma admoestação amorosa: “Não repreendas ao homem idoso; antes, exorta-o como a pai; […] às mulheres idosas, como a mães” (1 Timóteo 5:1,2).

  • Demonstre que pode aprender com eles e seja bom ouvinte;

Nós nunca paramos de aprender. Por mais estudiosos e bem preparados intelectualmente que sejamos, sempre teremos pontos de aperfeiçoamento em nossa vida, e os idosos são grandes professores. Tenha paciência com as longas conversas, as pausas entre frases, o provável saudosismo e os conselhos “fora de época”. Deixe de fora a prepotência e o orgulho e ouça com amor, como você faz com seus amigos. Mesmo com limitações físicas, há algo de grande utilidade que eles podem fazer pelo próximo, que é repassar ensinamentos. Apesar da referência familiar, o conselho de Salomão se aplica bem neste caso, mesmo se o idoso não for seu parente: “Ouve teu pai, que te gerou, e não desprezes tua mãe, quando vier a envelhecer.” (Provérbios 23:22).

Eu não gostaria de ver alguém fazendo pouco caso de uma história que minha mãe está contando com o maior carinho. Então, por que eu faria isso com a mãe, tia ou avó de alguém, não é mesmo?

  • Ame de forma prática;

Devemos encontrar tempo em nossa agenda atarefada para amar o próximo. Precisaremos abrir mão de alguns minutos ou horas de descanso ou reprogramar um ou outro compromisso, mas esta é a única forma de amar com ações e não somente com palavras. Via de regra, idosos sentem muita solidão e podemos apoiá-los com telefonemas, orações com e por eles, demonstrando interesse em suas histórias de vida, perguntando sobre suas necessidades e fazendo o que estiver ao nosso alcance para supri-las, seja fazendo visitas durante a semana, indo ao mercado fazer compras básicas, levando a consultas médicas ou até mesmo presenteando-os com um pedaço de bolo fresquinho. Se forem cristãos, pergunte sobre as experiências com Deus e você se surpreenderá com a alegria que eles têm em compartilhar as histórias e ensinamentos.

Um exemplo bíblico desse amor prático é o próprio Jesus. Por observar Seu jeito amoroso em lidar com as pessoas mais frágeis, posso imaginá-lO parando para apertar a mão de um idoso que O observava à distância e prestando reverência a uma idosa que vinha até o monte ouvir Seus ensinamentos. Em Seus últimos momentos de vida, notamos Sua preocupação em não deixar Maria desamparada ao pedir a João que cuidasse dela como sua própria mãe. “Vendo Jesus sua mãe e junto a ela o discípulo amado, disse: Mulher, eis aí teu filho. Depois, disse ao discípulo: Eis aí tua mãe. Dessa hora em diante, o discípulo a tomou para casa.” (João 19:26,27).

Se há algo que você pode fazer por um idoso de sua igreja ou de sua convivência, faça-o hoje. Ame-o como Cristo nos ama e se sacrificou por nós. Não meça esforços para fazer com que se sintam valorizados. Esses queridos irmãos são tão parte do corpo quanto você e eu.

Lembremos que um dia, se Deus assim permitir, chegaremos na melhor idade. Eu não quero ser deixada de lado e perder meu valor com o passar dos anos. E você? Sejamos, então, intencionais em nossos relacionamentos com a terceira idade. Vale a pena o esforço!