Carta à minha Amiga Tentante

Querida amiga tentante,

Obrigada por compartilhar comigo as últimas notícias acerca de seu desejo de engravidar. Sei que esse é um assunto delicado e falar sobre ele nem sempre nos deixa confortáveis. Por esse motivo, agradeço sua confiança ao se abrir comigo. Eu sei que a caminhada não é fácil e por vezes aparenta ser trilhada em completa solidão, por isso quero reiterar que você pode contar com minhas orações e ajuda no que for possível.

Eu sei que é difícil ver o sonho ser frustrado a cada mês, que ver mães com seus bebês pode gerar um sentimento agridoce, que pensamentos de incerteza quanto ao futuro nos assolam. Não se culpe por sentir isso. Deus sabe que você gostaria de descansar plenamente nele e em sua vontade em todo tempo, mas que às vezes é difícil. Acredite, ele não fica decepcionado com suas crises de choro pelo medo do futuro, ele está com você em cada uma delas. Não carregue um fardo que Jesus já levou por você, não se culpe por não ter os sentimentos sempre estáveis enquanto vive o desejo de ter seus filhos nos braços.

Eu estava pensando um dia desses como é engraçado que num dia estamos brincando de boneca e escolhendo os nomes de nossos futuros filhos e alguns anos depois, é nossa vez de experimentar a maternidade. Mulheres engravidando é algo tão corriqueiro a nossa volta que podemos chegar a pensar sobre a maternidade como algo absolutamente natural. Mas, na verdade, gerar vida é sobrenatural, algo que só Deus pode conceder. É justamente por causa dessa visão trivial da maternidade que poucas vezes nos passa pela cabeça a possibilidade de que a caminhada possa ser difícil e tortuosa para nós. Eu confesso que não pensava sobre problemas de fertilidade até que me vi diante de meses de espera, exames invasivos, consultas e mais consultas… Uma rotina que você também conhece muito bem.

No início, não era incomum virem pensamentos como “Por que comigo? Por que eu preciso passar por isso se desejo tanto ser mãe? O que eu fiz para merecer?” Mas, querida, o que aprendi nesse tempo de espera foi que a maternidade não é um direito que nos foi outorgado. Ela é uma dádiva, uma graça que o Doador da vida concede quando, como e a quem quer. Você e eu não fizemos nada para merecer trilhar a estrada da infertilidade, assim como as mães não fizeram nada para merecer ter seus bebês. Não é sobre você, tudo é graça. Meditar sobre isso fez meus sentimentos passarem de inquietude frente às circunstâncias para mais quietude diante de Deus sabendo que ter ou não filhos conforme meus planos não é mérito, mas graça.

Mais do que filhos, Deus quer nos dar mais dele mesmo. Esse é o principal propósito de toda e qualquer circunstância que venhamos a enfrentar: sermos mais santos em Cristo. Por isso, quero reforçar algo que já te falei uma vez: não desperdice sua espera. Eu sei que quando desejamos muito alguma coisa é comum pensarmos nisso o tempo todo e até mesmo querermos moldar nossas vidas hoje a partir de eventos futuros e incertos que rodeiam o objeto de nosso desejo. Porém, lembre-se de que essa vida não é sobre nós e nossos desejos realizados ou não. Essa é a grande história sobre o Deus verdadeiro amando e redimindo seu povo. Nós somos importantes, mas não somos os autores principais dessa vida. Eu sei que isso pode parecer duro e contrário ao que muito se fala por aí, mas a verdade é quanto mais focamos em nós mesmas, em nossos desejos, nossos planos, em como nossa vida deveria estar… Mais sofremos porque nos deparamos com a realidade de que a vida não segue nosso roteiro (e louvado seja Deus por isso!).

Pensamos saber o que é melhor para nós, mas só Deus, que já vê o fim de nossa história desde o começo, sabe o que é melhor e rege nossa vida por amor a nós e para glória de seu Filho. Lembre-se: mais do que filhos, Ele quer te dar mais dele mesmo, mais intimidade, mais proximidade com o seu pai. Por isso, peça graça para fazer desse tempo de espera um momento frutífero em sua vida espiritual.

Timothy Keller ensina em seu livro Ego Transformado uma lição que foi muito importante em meu processo de espera (depois posso te emprestar o livro, se quiser). Não lembro bem das palavras exatas, mas ele ensina nesse livro que encontramos uma bendita alegria quando pensamos menos EM nós mesmos. Veja, não é pensar menos DE si mesmo, ver-se como a pior, menosprezar-se. É pensar menos EM si. Não desperdice sua espera focando apenas em sua dor. Eu sei bem como ela é real, genuína. Por isso, sinta-a diante da cruz e compartilhe-a com amigos leais, mas não faça da usa infertilidade sua identidade. Em Cristo, você é bem mais do que isso. A dificuldade para engravidar faz parte de sua história, mas não é sua identidade. Você não é uma tentante, você uma filha amada cuja história foi bela e amorosamente escrita por um pai bondoso. Você não vive na sala de espera da vida aguardando os filhos chegarem para então ser feliz, você já tem, em Cristo, o que precisa para encontrar a verdadeira alegria, que vai além das circunstâncias. 

Em uma de nossas conversas falamos sobre como as dores das tentativas para engravidar podem ser agravadas por palavras duras daqueles que nos cercam, lembra? Acho que foi antes de você fazer aquele último exame. Eu gostaria de reforçar, querida, que essas palavras de cobrança são mesmo dolorosas, mas que podem ser um poderoso instrumento nas mãos do Senhor para nos fazer crescer em santidade. Afastar as vozes ruins nem sempre é possível, mas podemos, na dependência do Espírito Santo, aprender a filtrar o que chega a nossos corações e escolher a quem dar ouvidos. Para isso, mergulhe cada vez mais, como tem feito, em conhecê-lo e aprender dele. Quanto mais ouvimos a voz de Deus, mais reconhecemos as mentiras que dizem sobre nós. Você não é incompleta por não ter filhos, Cristo te fez completa nele. Você não é menos valorosa por não ser mãe, seu valor é imensurável, basta olhar para o preço de sangue que Jesus pagou em seu lugar. Seu casamento não está fadado ao fracasso por não terem filhos ainda, vocês são a unidade perfeita de uma família e o que os sustenta é o amor a partir de Cristo. Não dê ouvidos às vozes internas ou externas que digam qualquer coisa contrária a isso. Você é quem ele disse que você é: completamente amada e aceita em Cristo!

Querida, como o salmista costumava fazer, converse frequentemente com sua alma e relembre a si mesma quem Deus é e o poder que ele tem. Não caminhe no piloto automático ou cairá facilmente no desespero. Seja intencional em trazer à memória o que pode te dar esperança! (cf. Lm 3:21-24). O Deus a quem você pertence pode fazer da estéril mãe de filhos (cf. Sl 113:9), o Deus que te ama e sustém pode fazer o mesmo em sua vida que fez com Sara (cf. Gn 16), Rebeca (cf. Gn 25:19-27), Ana (cf. 1Sm 1) e Isabel (cf. Lc 1:7). No entanto, se em seu plano soberano sua resposta for negativa ao seu desejo de engravidar, lembre-se que tudo coopera para o seu bem e que Deus também é igualmente poderoso para suprir qualquer falta em sua vida.

Me despeço por ora relembrando que você está sempre em minhas orações e pensamentos. Não hesite em mandar uma mensagem, ainda que no meio da noite, para orarmos juntas. Como diz a música de Sarah Sparks “não esconda suas lágrimas de mim e eu também te darei as minhas, não me poupe de nada, o seu fardo é meu”.

Com amor, 

Sua amiga 


Esse post faz parte da nossa série de postagens de Março com o tema “Cartas às Minhas Amigas”. Para ler todos os posts clique AQUI.