As vozes de uma pandemia

Um vírus que está parando o mundo e ensurdecendo a fé de muitos. Que sentimentos isto lhe causa?

Há algumas semanas, quando foi mencionada pela primeira vez a palavra “pandemia”, me vi como uma personagem dos futuros livros de história dos nossos filhos e netos. Daqui a alguns anos, seremos nós as responsáveis a contar como foi viver em confinamento, lidar com um inimigo invisível e reinventar a forma de trabalho para que pudéssemos manter nossos empregos. Quantas incertezas, não é, minha irmã? Quantas perguntas sem resposta, quantas notícias, quantos contrastes, quanta transparência e confronto em assuntos e tarefas que, há tempos, vinham sendo adiados.

E digo mais: quanto tempo gasto em redes sociais e em frente a TV! Como nunca antes, estamos enfrentando uma luta invisível com nosso desejo por entretenimento e ocupação. A qualquer hora do dia, vemos novas “lives” (transmissões em tempo real), chuva de fotos sobre todos os momentos do dia de nossos amigos, colegas e desconhecidos. São tantas opções de séries, filmes, vídeos sobre culinária, livros, que fica difícil escolher como ocupar as horas do dia. E aqui, do outro lado da tela, só aumenta a quantidade de vozes que nos influenciam. São especialistas em infectologia, em economia, jornalistas com diferentes linhas de pensamento e opinião política, comentaristas, professores, políticos, líderes de empresas, líderes religiosos, famosos, nossos amigos, nossa família. É muita gente pra pouco espaço na mente e no coração. É muito barulho, e muita confusão.

 Alguém que ouvia muitas vozes

Essa situação me faz lembrar da história de um homem que estava vivendo em meio a muitas vozes e precisou fazer uma escolha. Ele era Bartimeu, filho de Timeu, e mais conhecido como o Cego de Jericó. No livro de Marcos, capítulo 10, vemos sua história se desenrolar de forma muito feliz e até rápida. Mas, vale a pena entender um pouco melhor do contexto em que ele vivia. Naquele tempo, as pessoas com algum tipo de dificuldade de saúde (seja motora, de visão, de audição, ou infecciosa) eram desprezadas e viviam à margem da sociedade (muitas vezes, fora da cidade, como era o caso dos leprosos). Havia sobre elas um jugo pesado, não só pela rejeição das pessoas, mas pelos boatos de que aquelas enfermidades eram fruto de pecado deles ou de seus pais (Leia João 9: 1 a 3).

O que lhes restava era depender de esmolas e boas ações de quem ousava se aproximar. Talvez, aqui esteja um dos pontos mais importantes da história de Bartimeu. Ele não havia perdido a esperança de que sua vida poderia mudar. Apesar de depender de esmolas, não se apoiou nisso para chegar ao fim da vida. Não permaneceu sentado, esperando a morte. Ele ouviu sobre Jesus e tomou uma atitude.

E aqui faço uma pequena pausa para provocar uma reflexão: quantas vezes, em nossos momentos de maior dor e desespero, temos a ousadia de clamar pelo nome de Jesus, pelo auxílio que emana dEle, e pela intervenção divina em nossas vidas? É muito mais fácil, e digo por mim, ficar entregue ao vitimismo e esperar que alguém nos note, estenda a mão e nos carregue no colo. A Bíblia é clara em orientar-nos a ajudarmos nossos irmãos e quem quer que seja que esteja passando por dificuldades. Mas, e quando somos nós os necessitados? Será que nossa postura é mais tendenciosa a esperar que os outros venham até nós? Vale a pena refletir sobre isso.

O que fazer com os ruídos

Continuando com nosso personagem querido, o que mais vemos em sua história? Ah sim, ele foi corajoso! Bartimeu começou a clamar pelo Filho de Davi (mesmo sem vê-lo enquanto passava) e foi severamente reprimido para que se calasse. Foram muitas vozes tentando abafar seu desejo de encontrar com o Messias. Vozes de desprezo, opiniões contrárias às dele. Talvez, alguém dissesse “Ei, não vale a pena. Jesus tem coisas mais importantes para fazer”, ou “Bartimeu, você está ficando louco? Qual é a chance dele te ouvir?”, ou ainda “Não dê ouvidos a ele, Jesus, é só mais um mendigo pedindo dinheiro”.

A atitude dele foi muito ousada. Ao invés de se retrair com os ruídos, voltar a deitar no chão e lamentar por ser invisível na sociedade, clamou mais alto. E ele clamava por misericórdia! Querida, o quanto nós precisamos desse clamor! Se existe algo que pode acalmar nosso coração frente a uma pandemia, é a misericórdia do Senhor, causa de não termos sido consumidas pela doença, pelo desespero, pela ansiedade, pelo colapso de nossos pensamentos e emoções.

Ao final da história, Jesus literalmente pára o percurso que estava fazendo (e com Ele, todos os que o acompanhavam), e pede que chamem Bartimeu. Não temos estes detalhes na Palavra, mas gosto de imaginar que um dos homens que passou por ele e o desprezou, foi justamente quem Jesus mandou chamar a Bartimeu e dizer “Levanta-te, ele te chama”. Bartimeu, então, segue o comando do Mestre, e vai em direção à única voz que poderia transformar sua vida para sempre.

De forma muito amorosa, Jesus pergunta o que Ele queria que lhe fosse feito. Ah Senhor! Eu poderia pensar em uma lista de, pelo menos 20 pedidos! Mas, Bartimeu foi sincero em dizer qual era sua maior necessidade e anseio. Ao invés de pedir justiça pelos anos de desprezo e marginalidade, pediu visão. Uma grande lição para nós, a respeito de contentamento, não?

A resposta do Senhor atende a duas áreas: a terrena e a eterna. Primeiro, Jesus diz que a fé de Bartimeu o salvou (ou seja, ele ganhou a Eternidade), e em seguida, a Bíblia nos relata que ele ganhou a visão (ou recuperou, não temos este detalhe revelado). E, em resposta a este milagre duplo, Bartimeu o seguiu pelo caminho.

Silenciando as vozes

Pouco antes deste relato, que se inicia no versículo 46, Jesus e seus discípulos haviam encontrado com um jovem muito rico e dono de muitas propriedades. Ele procurou Jesus e correu a seu encontro para fazer uma pergunta muito pertinente: como herdar a vida eterna?

Jesus, em Sua onisciência, conhecia o coração daquele jovem e foi direto ao ponto: “não importa o quanto você sabe dos mandamentos. ‘Falta-te uma coisa: vai, e vende tudo quanto tens, e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem e segue-me’” (v.21).

O jovem se entristeceu, e foi embora. A Bíblia relata que ele possuía muitas propriedades e, possivelmente, entendeu que andar com Jesus exigia um preço muito alto a ser pago.

Em seguida, Jesus se dirigiu aos seus discípulos e disse “Quão dificilmente entrarão no Reino de Deus os que têm riquezas!”

Trouxe à nossa lembrança esse outro encontro de Jesus, pois ficou faltando mencionar uma parte importante da história de Bartimeu: o momento em que ele deixou sua capa (v.59).

De acordo com alguns estudos a respeito dos costumes daquela época, a capa era algo muito valioso para os enfermos que viviam à margem da sociedade. Com ela, podiam se proteger da chuva, cobrir o rosto da vergonha e do desprezo, e até do medo que sentiam. Possivelmente, a capa de Bartimeu era velha, suja e com muitas avarias, pois ele a estendia no chão para se deitar, ou para recolher as ofertas. Era, ao mesmo tempo, a representação de sua pobreza, e sua única riqueza.

Em contraste com o jovem rico que não quis deixar seu conforto para seguir a Jesus, Bartimeu tem uma atitude de fé em abandonar sua única riqueza, pois sabia que de Jesus viria algo muito melhor. Ele não precisaria da capa, depois que Jesus o curasse e mudasse sua vida. Naquele momento, com aquela atitude, Bartimeu silenciou todas as vozes do medo, do desprezo, das dúvidas, da zona de conforto e da miséria espiritual.

A única forma de silenciar as vozes que temos ouvido por aí e que tem coberto nossos olhos e nossos corações de medo e insegurança, é lançá-las aos pés de Jesus, clamando por Misericórdia.

Não é a quantidade de notícias que você tem ouvido que pode proporcionar mais segurança. Não é a quantidade de álcool em gel que você passa nas mãos que protegerá seu coração do medo do amanhã. Não é direcionando sua mente para entretenimentos variados, desde livros a redes sociais, que você terá paz para atravessar o caos.

O que precisamos, todos nós, é de Misericórdia e ela só pode ser obtida em uma fonte: Jesus.

Finalizo lhe estimulando a colocar as vozes do medo no modo mudo* e ouvir a voz do Mestre. Como? Pela Palavra viva e eficaz, que penetra a alma e o espírito, as juntas e medulas, e é apta para discernir nossos pensamentos e intenções do nosso coração (Hebreus 4:12). Também lhe estimulo a usar a poderosa arma da oração. Fale com seu Papai, clame por Misericórdia aos enfermos, aos governantes (independentemente de sua posição política), à nossa nação e demais nações do mundo. Conte a Ele seus planos, frustrações, preocupações e desejos. Não esconda nada, pois Ele conhece seu coração e, ah, como é prazeroso sermos sondadas por Ele.

Proponha-se a passar um tempo específico por dia na presença dEle, estudando Sua Palavra (sozinha e com amigas), em oração silenciosa ou escrevendo orações em um caderno pessoal, cantando louvores que O glorifiquem e a façam lembrar que Deus, o nosso Abba, continua reinando soberano, no trono que é só dELE, e detém o controle de toda a situação em Suas mãos.

Escolha ouvir a voz do Senhor e abandone esta capa de vozes que tem te perseguido.

*Expressão da música “Muita calma nessa alma”, de Marcela Taís.