Marta e Maria: Priorizando as PrioridadesAmando O Mais Importante

— Marta, Marta, você está agitada e preocupada com muitas coisas, mas apenas uma é necessária! Maria escolheu a melhor de todas, e esta ninguém vai tomar dela. 

(Lc 10.41-42, destaque meu)

O que é importante para você neste momento em que inicia a leitura desse texto? Seja sincero, por favor, e não precisa me contar nos comentários (mas se quiser compartilhar conosco, vai ser muito bom). Em um mundo onde há muitas coisas importantes para nós, fica difícil definir o que é, de fato, o mais importante.

Sim, eu sei, somos cristãos e esse tipo de raciocínio não deveria nem ser formado, afinal, você e eu sabemos o que é mais importante… pois é, sabemos, mas temos uma imensa dificuldade em manter o mais importante na prática diária. É por isso que quis provocar vocês, caros irmãos e irmãs, a lidar com a realidade do que de fato tem se tornado a prioridade na sua vida, porque essa tem se tornado uma pergunta alarmante para mim também.

Digo alarmante porque mesmo sendo uma mulher solteira de 35 anos tenho muito trabalho. Seja na igreja, escrevendo textos aqui para o Graça em Flor, ajudando no ensino da Palavra, em aconselhamentos, além dos estudos e do trabalho na empresa onde lidero o setor administrativo, tenho também minha casa onde moro com minha mãe e com isso todos os serviços do lar. Com uma rotina apertada é importante também praticar exercícios, cuidar da alimentação, dormir bem, enfim, a lista de afazeres não para e fica cada vez mais longa. 

E como cristãos sabemos que todas essas coisas devem estar coroadas com o lema: para a glória de Deus! Ele deve ser a fonte de toda motivação para as tarefas diárias, e precisa estar no protagonismo, na centralidade das nossas vontades, pois é a conexão com o divino que mantém o vínculo de amor perfeito, a base irradiadora de graça e misericórdia para lidarmos com todas as áreas da nossa vida.

Pare para olhar e ouvir

Ao lermos o capítulo 10 do Evangelho segundo Lucas, podemos perceber uma organização na ordem do relato que nos aponta para a necessidade que todo discípulo de Jesus tem: ouvi-lo e contemplá-lo, ter a atenção indispensável no seu modelo de Servo do Senhor e assim internalizá-lo, com a consequente transformação do seu coração. O cerne da fé ativa é a contemplação do Santo, que faz com que todas as áreas da nossa vida permaneçam diante dele e para a Glória dele, ou seja, o conceito de coram Deo.

Vemos nesse trecho, sobre a missão dos 72 discípulos, a questão sobre o mandamento mais importante, a parábola do bom samaritano e a visita de Jesus à Marta e Maria. Todo o capítulo está unido pelos exemplos práticos do ponto central do relato, a citação da Shemá Israel, isto é, a lembrança do que era importante ouvir, guardar e praticar: o amor a Deus e ao próximo. 

No início do capítulo, vemos Jesus Cristo ensinando sobre a missão dos discípulos, como eles deveriam agir na pregação do Evangelho, na libertação das almas aprisionadas por Satanás e na cura dos enfermos; era necessário ser movido pelo amor ao próximo para executar a missão e assim eles tiveram êxito em tudo o que fizeram e o Senhor Jesus alegrou-se com eles. A euforia dos discípulos consistia que, na autoridade de Cristo, eles tinham poder sobre os demônios, porém Ele os lembra de que o mais importante era que seus nomes estavam escritos nos céus, diante de Deus, e que muitos profetas e reis do passado desejaram contemplar o que eles estavam vendo e ouvindo.

Na parábola do bom samaritano, o Mestre trouxe mais uma vez a importância do amor ao próximo, de que toda vida formada e trazida à existência por Deus tem um valor inestimável e de que não se trata de diferenças de classes sociais, religiosas, étnicas-culturais, pois nada deve nos deter quando o assunto é o auxílio a quem precisa. Precisamos agir mesmo que isso custe algo de valor ou importante para nós.

Entretanto, é no relato da visita à Maria e Marta que vemos a explicação prática da primeira parte do grande mandamento: “Ame o Senhor, seu Deus, de todo o seu coração, de toda a sua alma, de toda a sua força e de toda a sua mente” (Lc 10.27). Em Marta, somos lembrados de que o serviço na colheita dos campos do Senhor é importante, como pregar o Evangelho e ajudar o próximo em suas diversas necessidades. No entanto, só conseguiremos executar a missão no exemplo e na instrução de Cristo se, primeiro, amarmos o mais importante, pois sem esse relacionamento com o divino, todas as outras obras se tornam palha. Sem o Senhor não podemos fazer nada que o glorifique e honre verdadeiramente. 

Siga contemplando o mais importante

Não se trata, portanto, de uma crítica do Senhor Jesus à Marta pelas várias demandas que esta executava, mas o Mestre chamou sua atenção pelas muitas preocupações, pela mente agitada que a impedia de experimentar da paz e do amor do Senhor e a fazia enxergar de forma distorcida a escolha de sua irmã Maria em estar aos pés do Messias e ouvi-lo. 

E na era contemporânea esse tem sido um grande desafio para a Igreja de Cristo, principalmente em uma sociedade onde as demandas excessivas nos fazem entrar em uma repetição infinita de atividades que podem prejudicar nosso relacionamento com o Senhor. Neste sentido, a teóloga Norma Braga em seu artigo O Reino da Interioridade enfatiza que: 

“Mergulhados no ativismo que caracteriza nossa época, não damos o devido valor ao aprendizado pontual, à contemplação, à oração a portas fechadas, à reflexão ponderada, à leitura, ao cultivo dos relacionamentos, ao diálogo. Isso não é novidade do capitalismo, como muitos pensam: Jesus já chamava a atenção de Marta para a ‘melhor parte’ escolhida por Maria, que é aprender aos pés do Senhor. E aprender aos pés do Senhor deveria ser algo cotidiano, priorizado pelo estudo da Palavra, claro, mas também vivido no dia a dia, em conversas abençoadoras, em momentos de oração e comunhão.”

O grande mandamento do qual depende toda a Lei e os Profetas é um par bem equilibrado que conecta o transcendente e imanente com a vida comum e todas as pessoas, nossos semelhantes, que participam dela; somos ferramentas de Deus, vasos na mão do Oleiro, mas para que nossa vida esteja de acordo com sua boa, perfeita e agradável vontade precisamos, acima de tudo, estar e fluir em amor da verdadeira fonte inesgotável do Amor perfeito e eterno. 

Que possamos amar o mais importante, que é estar na presença de Deus em cada segundo do nosso dia, na preciosa e bendita contemplação dessa realidade ativa e sobrenatural que nos direciona e nos guia em seus propósitos. Só assim, finalmente, experimentaremos o verdadeiro descanso, mesmo em meio às diversas tarefas normais do dia a dia.


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