Marta e Maria: Hospitalidade

É tão prazeroso conviver com quem tem o dom da hospitalidade. Se você conhece alguém assim, certamente concorda comigo. Aquela pessoa que sempre recebe em sua casa, está com as portas abertas, com café e um bolo, uma sopa, uma pizza ou simplesmente um copo de água fresca. Esses momentos que partilhamos com irmãos são especiais e recebemos como uma boa demonstração de amor.

A palavra hospitaleiro vem do grego “filoxenoi” que significa “amigo de estranhos.” A hospitalidade evidencia o nosso relacionamento com outras pessoas, com outros cristãos ou não. Essa prática é essencial para o crescimento do corpo de Cristo. 

Nos tempos da igreja primitiva, vemos a hospitalidade quase como uma necessidade, principalmente no contexto em que os cristãos eram perseguidos, já que eles deixavam seus lares. Para os missionários, ela também era fundamental naquela época e segue sendo  até os dias atuais, pois eles precisam de abrigo enquanto espalham o evangelho por aí. Vemos, na terceira carta de João, uma referência exatamente a esse ponto: os ministros itinerantes também precisavam contar com a hospitalidade (3 Jo 5:8). A hospitalidade é algo tão prezado e relevante biblicamente que é levantada como uma característica necessária a um presbítero (1 Tm 3:2). 

Como a Bíblia fala de hospitalidade

Embora não seja tão explorada em pregações e na literatura quanto outros temas bíblicos, a hospitalidade nos é recomendada em muitas passagens bíblicas. Trata-se, portanto, de uma questão com a qual Deus se importa, o que já é suficiente para motivar nosso esforço. 

Em sua primeira carta, Pedro nos convoca a sermos hospitaleiros e sem murmuração (1 Pe 4:9) e o versículo que antecede essa orientação nos fala que devemos ter um amor intenso uns para com os outros. A palavra intenso aqui traz a ideia de um atleta que se esforça para alcançar o objetivo, ou seja, o amor cristão é algo pelo qual precisamos nos esforçar e a nossa hospitalidade virá como consequência desse amor. 

Em Romanos 12, Paulo nos traz recomendações sobre a prática da vida cristã e de como deve ser o relacionamento do novo homem com seus irmãos. Entre seus apontamentos de como melhorar nossa convivência, ele traz no verso 13: compartilhai as necessidades dos santos; praticai a hospitalidade O teólogo John Stott diz que um dos ingredientes da receita do amor é esse: sermos hospitaleiros com os visitantes e generosos com os que passam necessidade. 

Ainda falando em como evidenciar a fé, a carta aos Hebreus, no capítulo 13, verso 2, nos diz: Não negligencieis a hospitalidade, pois alguns, praticando-a, sem o saber acolheram anjos. O autor traz uma perspectiva da fé visível, da vida além da religiosidade, mostrando evidências de uma vida transformada pelo sangue de Cristo, principalmente no que se diz ao trato com o próximo. A passagem também nos traz recomendações para uma vida em comunidade, instruindo que o amor fraternal seja constante entre nós. Vemos mais uma vez a hospitalidade sendo a própria expressão desse amor. 

Citando novamente a terceira carta de João, destaco que o apóstolo, ao escrever a Gaio, o elogia por abrir a sua casa e acolher os servos de Deus, por demonstrar a sua hospitalidade a ponto de os próprios pregadores terem testemunhado isso na igreja. Mais um incentivo a nós registrado na Palavra de Deus. 

Por que para muitos a hospitalidade não é natural?

A hospitalidade (ou falta dela) demonstra o nosso desejo (ou a falta dele) em dividir momentos das nossas vidas. Abrimos nossos lares e para isso precisamos talvez de uma dose de coragem. Ao abrir nossa casa, nos tornamos vulneráveis, pois o nosso local mais íntimo se torna visível a pessoas que talvez não tenhamos tanta intimidade.

Hoje em dia, ser hospitaleiro tem se tornado cada vez mais desinteressante, porque até mesmo entre a nossa família substituímos o partilhar a mesa de casa com uma reunião num restaurante, que não propicia tanta intimidade. Um lugar público não nos permite ter níveis mais profundos de conversa, e o exercício da hospitalidade requer tempo de qualidade, diálogo intencional com o coração e os ouvidos abertos para acolher, trocar as experiências e evidenciar os feitos de Cristo nas nossas vidas e na vida das nossas famílias.  Por conta do ritmo e hábitos com os quais temos vivido, a hospitalidade pode ser surpreendente para quem é acolhido e uma excelente oportunidade de mostrarmos Cristo e apresentarmos na prática o que é o viver no evangelho.

Deixamos nos levar pela exigência da produtividade, da correria e de relacionamentos rasos e convenientes e ainda ficamos buscando vantagens nesses relacionamentos. O que eu tenho a ganhar com essa amizade, com essa aproximação? Você talvez já tenha se feito essa pergunta ao recusar um convite ou se negar a receber alguém. Relacionamentos demandam tempo e esforço e o que Jesus fez quando esteve entre nós foi investir em pessoas. 

Temos muitas justificativas para não recebermos (muitas desculpas, na verdade):  dizemos que a nossa casa é pequena, que nossas louças não são tão bacanas, que não temos dinheiro e nem tempo, ou que não sabemos cozinhar. Porém, a essência da hospitalidade não tem relação com exibir a casa ou o que sabemos fazer. Muitas vezes também somos tomadas pela preguiça, sendo que, se nos planejássemos e preparássemos minimamente, conseguiríamos fazer isso de forma tranquila. A hospitalidade é mais do que comida e um ambiente de foto de rede social, é proporcionar aos visitantes que saiam melhor do que chegaram.

Sendo essencialmente uma atitude do coração, será que o nosso não está nos enganando? Será que estamos olhando a prática da hospitalidade somente pelas lentes da vaidade, do conforto e do orgulho? Ela é uma via de transformar estranhos em amigos. Quando expomos nossas vidas e nosso lar temos a oportunidade de dar testemunhos de tantas coisas, da vida simples, do cuidado, de viver uma fé que não é só de palavras (Tg 2:15-16), a vida de um amor não fingido (1Pe 1:22). Devemos buscar conversas positivas e edificantes e aproveitarmos a chance que temos de testemunhar o que Deus tem feito. Quando nosso lar voltar a ser o centro da vida em família, isso se refletirá na prática da hospitalidade.

Coragem, minha irmã!

A hospitalidade não é algo natural em mim, confesso de forma muito sincera. Um dos meus pecados é a preguiça e Deus tem me confrontado sobre isso nos últimos tempos, inclusive enquanto eu  me dedicava ao estudo desse tema. Deus incomodou profundamente o meu coração: a preguiça tem me impedido de obedecer, de ser hospitaleira e sem murmuração. 

Nós devemos nos esforçar em desenvolver essa habilidade, tomar uma decisão e desenvolver a alegria em relação a vida das pessoas. E demonstramos essa alegria servindo-as em amor, providenciando o que Cristo nos pediu, que é amar ao próximo. 

As pessoas estão carentes de Jesus Cristo e ser hospitaleiro é um caminho de sucesso para apresentá-lo  a elas por meio  das nossas vidas sem filtros. 

Somos mordomos aqui e o nosso lar pertence ao Senhor; portanto, ele deve ser um instrumento nas mãos de Deus. Precisamos nos empenhar em sermos fieis, tanto no simples quanto no cotidiano da vida.

O Senhor Jesus passou por muitas casas, evidenciando a importância que dava aos relacionamentos intencionais. Cada um que recebemos é alguém que foi criado à imagem e semelhança desse Deus, por isso não podemos permitir que o mundo nos afaste da responsabilidade que temos no amor fraternal.

A Palavra é tão viva que, como consequência do que aprendi em tudo o que li e consultei para a produção desse texto, decidi chamar algumas mulheres para um café na minha casa. Marquei com antecedência, para que eu tenha tempo de me organizar. Como vou fazer? Ainda não sei direito,mas confio no Deus da Bíblia, no Espírito Santo que habita em mim e que me habilita a obedecer apesar de mim. Que bênção é se dispor a obedecer.

Minha oração é que o Senhor também mova o seu coração em mostrar aos demais o amor que um dia lhe alcançou.


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