Família, um projeto de Deus: Pais e Filhos

Os relacionamentos na realidade pós-pandemia foram, de certa forma, transformados. De um lado, esperava-se que, daquele período de distanciamento e restrições, sairiam seres humanos melhores, que valorizam os encontros presenciais e o calor humano. Todavia, o que se verifica é que grande parte das relações acabou por se distanciar e esfriar, nos acostumamos à vida “via Zoom”. E isso, claro, afeta a interação com os mais próximos, aquelas pessoas do convívio diário, nos quais se incluem pais e filhos.

O período no qual vivemos, denominado pós-modernidade, é caracterizado pela defesa da inexistência de uma verdade absoluta, em razão de várias verdades relativas. Se somos contrariados ou não gostamos de algo, basta deixar de seguir. Mas, e quando é dentro de casa? Como dar unfollow nos pais ou nos filhos? 

Das situações em que somos confrontados e nos sentimos desconfortáveis, em geral resultam brigas, desentendimentos e falta de respeito. Perdemos a paciência para o diálogo olho no olho, em que se está somente ali naquele ambiente e com aquela pessoa. Preferimos as conversas digitadas ou via áudio – o que é melhor, pois podemos ouvir no modo acelerado e poupar tempo – enquanto fazemos outras coisas concomitantemente.

O texto registrado em 1João 4.20-21 diz o seguinte:

Se alguém disser: Amo a Deus, e odiar a seu irmão, é mentiroso; pois aquele que não ama a seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê. Ora, temos, da parte dele, este mandamento: que aquele que ama a Deus ame também a seu irmão.” 

Nossos pais/filhos são os “próximos” mais próximos que o Senhor nos deu. Infelizmente, hoje em dia é totalmente possível alguém erguer os braços em adoração na igreja e declarar o amor a Deus nas redes sociais, enquanto é totalmente negligente dentro de casa, seja desrespeitando os pais, seja provocando os filhos à ira. Nesse caso é válido um autoexame para verificar se o amor ao Senhor é verdadeiro. 

O Evangelho nos redime diante de Deus e dos homens também. Um coração genuinamente transformado irradia ações retas e justas em todas as direções, mesmo que o próximo não mereça. Afinal, não foi isso que Cristo fez em nosso benefício? Éramos seus inimigos e ele nos amou até o fim, nos concedendo perdão e salvação.

Voltando à esteira dos efeitos da pandemia temos uma outra faceta. Embora possa parecer que o fruto do nosso tempo são as relações conflituosas entre pais e filhos, encontramos também uma oportunidade de estreitamento dos laços. A disseminação e o acesso à tecnologia nos colocam em certa vantagem com relação às gerações anteriores. A distância geográfica pode ser superada por meio de ligações e chamadas por vídeo. Conseguimos estar presentes em vários eventos importantes, enviar recursos ou presentes para aqueles que amamos. Quando temos uma notícia, seja ela boa ou ruim, não precisamos mais esperar a carta ou o telegrama chegar. 

A pandemia, que tanto nos afastou, também nos deixou mais próximos do que nunca. Quantos filhos morando em uma cidade diferente da de seus pais ficam mais tranquilos e felizes por falar frequentemente com eles. Da mesma forma os pais, conseguem acompanhar com maior proximidade o desenvolvimento e as conquistas de seus filhos, independente da idade que estes tenham.

O que percebemos até agora é que, do mesmo contexto, podem sair relações boas ou ruins. A qualidade do relacionamento entre pais e filhos não é determinada pelo ambiente externo, pelo menos não de forma preponderante. Um convívio harmonioso ou desgastante depende daquilo que as pessoas nutrem dentro de si, do que as norteia na vida, da voz a qual ouvem para guiar suas ações. Nas palavras do Senhor Jesus:

“Pois a boca fala do que o coração está cheio. A pessoa boa tira coisas boas do tesouro de um coração bom, e a pessoa má tira coisas más do tesouro de um coração mau.” (Mateus 12.34b,35)

Um tesouro geralmente é algo protegido, bem guardado. Mesmo em um ambiente familiar hostil é possível manter o “tesouro de um coração bom”, desde que Cristo ocupe o trono dele e, como Rei, lhe dirija todos os passos. Não é fácil e simples, mas é realizável na força do Senhor.

Abaixo estão elencados alguns exemplos de pais e filhos registrados nas Escrituras e um breve relato do que podemos aprender com eles.

Exemplos de pais:

  • Isaque e Rebeca (Gn 25.28): cada um demonstrou preferência por um dos filhos. Resultado: engano na família e briga entre os irmãos Esaú e Jacó.
  • Jefté (Juízes 11.30-40): fez um voto precipitado ao Senhor. Resultado: sacrificou a própria filha.
  • A mãe cuja causa foi julgada por Salomão (1Rs 3.16-28): evidenciou renúncia e sacrifício por amor ao filho. Resultado: teve o filho restituído.
  • Ana (1 Sm 1.27-28): consagrou ao Senhor o filho que foi tão desejado. Resultado: Samuel se tornou um grande profeta, sacerdote e juiz.
  • Eunice e Loide (2 Tm 1.5): mãe e avó transmitiram a Palavra a Timóteo sem a ajuda do pai, o qual não era cristão. Resultado: Timóteo se tornou um proeminente líder na igreja primitiva.

Exemplos de filhos na Bíblia:

  • Hofni e Fineias (1 Sm 2.22-25): exerciam o sacerdócio de maneira relaxada, não se importavam com o Senhor e não ouviram os conselhos do pai, o sacerdote Eli. Resultado: foram mortos por causa de seus pecados.
  • Absalão (2 Sm 15.1-18): armou uma rebelião contra o próprio pai, o rei Davi. Resultado: foi morto em batalha.
  • Jônatas (1Sm 20.30-34; 2Sm 9.7): defendeu o amigo Davi diante de seu perverso pai, o rei Saul. Resultado: após a morte de Jônatas, seu filho Mefibosete desfrutou do cuidado do então rei, Davi.

O Senhor Jesus Cristo é nosso grande exemplo de filho. Foi totalmente submisso a Deus Pai quando sua natureza humana clamava por alívio do sofrimento que estava por vir na crucificação. Em relação à sua mãe, ele estando em sua hora mais sombria de agonia e dor, pediu ao discípulo amado que cuidasse dela como se fosse seu filho. 

Como vimos, a Bíblia retrata exemplos positivos e negativos, situações a serem seguidas e outras a serem evitadas. É interessante notar que ela traz boas ações e também o pior do ser humano. O Senhor deixou registrado ambos para mostrar do que qualquer um de nós é capaz e a diferença que uma vida pautada pelo Evangelho faz, não apenas em uma pessoa, mas em toda uma casa, região e nação.

Finalizo esse texto me dirigindo a todos os filhos, sejam eles pais ou não – afinal, todos somos filhos de alguém! Quando pequenos, provavelmente ouvimos de nossos pais sobre a importância de se aprender pelos exemplos dos outros para que não tenhamos que sofrer na pele certas dores. Deus, como nosso Pai, nos diz o mesmo por meio dos registros bíblicos. Cabe a nós decidir como aprenderemos a lição: se pela observação do que aconteceu aos outros ou se por nossa própria experiência.

Somente através de uma vida cativa à Palavra e totalmente dependente do auxílio do Senhor é que teremos condições de viver o mandamento:

“Filhos, obedecei a vossos pais no Senhor, pois isto é justo. Honra a teu pai e a tua mãe (que é o primeiro mandamento com promessa), para que te vá bem, e sejas de longa vida sobre a terra. E vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na admoestação do Senhor.” (Ef 6.1-4)


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