Família, um Projeto de Deus: Marido e Mulher

Frequentemente, gosto de ouvir, ler ou assistir algo que está em alta. Faço isso para entender o que as pessoas têm pensado, como têm reagido e quais pautas estão em destaque. Por curiosidade, reservei um tempo para ouvir um episódio de podcast sobre casamento tradicional e relacionamentos não monogâmicos. As opiniões das convidadas sobre suas próprias verdades a respeito do casamento eram curiosas por um lado, mas, por outro, bastante… confusas.

Como cristãos, encontramos orientações claras na Bíblia sobre o relacionamento entre marido e mulher. Passagens como Gênesis 2:24 e Mateus 19:4-6 falam sobre a união inseparável entre esposo e esposa. Também há ensinamentos sobre os deveres mútuos no casamento (1 Coríntios 7:3-4) e sobre o papel de autoridade e submissão (Efésios 5:22-33). Além dessas passagens, toda a Palavra de Deus revela Seu plano para o relacionamento conjugal, centrado na aliança, uma palavra cada vez mais rara nos dias de hoje.

O que me chamou atenção nesse episódio foi perceber o quanto se tornou comum que casais queiram desfrutar dos benefícios de estar juntos, mas mantenham uma distância física e emocional sem compromisso. Mesmo entre casais que estão juntos há anos, cada um deseja viver em suas próprias casas, com seus pertences e rotinas separadas, e se unir quando convém. A justificativa para isso é que essa é a melhor forma de dar certo, já que cada um tem seu gosto, seu estilo de decoração e sua maneira de organizar as coisas. A afirmação veio de uma pessoa que se diz ser casada “de alma” com seu marido.

Um ponto alto da conversa — e motivo de minha risada — foi ouvir o relato de uma entrevistada que está há mais de uma década com seu parceiro e finalmente estão dando o próximo passo de morar juntos no mesmo espaço. O tom da fala era como o de uma noiva prestes a dizer “sim, eu aceito” no altar. Minha primeira reação foi pensar: “Quanto tempo será que dura esse relacionamento agora que vão morar juntos e conhecer ainda mais um ao outro? Há espaço para abrir mão? Para mexer na decoração intocável ou mudar a rotina confortável?”

Não somos ingênuos: é claro que o pecado distorceu toda a realidade e deixou as pessoas confusas e cada vez mais sedentas por seu individualismo e suas regras. O pecado proclama mentiras e distorce o que o Senhor instituiu, e vemos isso principalmente na formação de uma família.

O que observamos hoje é um formato de relacionamento que diz: “Ficarei com você até quando achar que esse relacionamento está bom para mim.” O “eu” é mais importante do que o “nós”. É um relacionamento egoísta, e não um relacionamento de aliança, que é o que o Senhor espera de um marido com sua mulher. Esse é o principal diferencial.

Compromisso

Tim Keller, em seu livro O Significado do Casamento, diz que o casamento é um vínculo legal solenizado por votos. O casamento não é tanto uma afirmação do amor presente, mas uma promessa de amor futuro. E esse é o ‘segredo’ para fortalecer as famílias.

É curioso como os votos revelam a forma que vemos o casamento. Em séries, livros, filmes e cerimônias reais, eles são, normalmente, compostos daquele discurso repleto de emoção, choro e da descrição de como foi a história dos dois até o altar, finalizada por uma incerteza do que virá. Claro, não podemos prever o futuro e, veja bem, não estou dizendo que o “correto” é ser dura como uma pedra, sem expressões e sem choro. Nada disso, até porque esse é um momento de alegria! Mas os votos carregam a importância de serem promessas de amor futuro, que podem ser feitas em meio a lágrimas de alegria, coração batendo forte e sorriso no rosto. Porém, a profundidade do que isso significa é grande e, às vezes, esquecemos disso.

A importância dos votos

Os votos são promessas de continuar fielmente amando aquela pessoa, mesmo não sabendo como ela será daqui a 5 anos. O marido será diferente, a esposa também, mas os dois permanecerão unidos nos dias bons e ruins. Sem a aliança, o marido e a mulher negligenciam os tesouros presentes em um amor que é comprometido.

Em dias difíceis — e, acredite, não são poucos, longe disso — meu marido e eu nos sentamos no sofá e relemos nossos votos. Temos anotados em um caderno que usamos no momento do nosso casamento. Olhamos um no olho do outro e relemos como se fosse a primeira vez. Após um tempo de conversa e oração, há a reconciliação e espaço nesse mesmo caderno para descrevermos mais promessas de amor futuro. Essa prática tem sido fundamental para continuarmos regando o solo do compromisso e sermos lembrados mais uma vez de que o que nos sustenta é o Senhor e não nossas forças.

O marido e a mulher que plantam seu relacionamento no solo do compromisso, ao fazerem isso desde o namoro, passando pelo noivado e, principalmente, no casamento, colherão um relacionamento frutífero e centrado no Senhor. É como se estivessem afirmando um para o outro: “Eu me comprometo a ficar com você e te dar apoio.”

Mas e quando ficar difícil amar?

Mais uma vez, não somos ingênuos certo? Sabemos que, em uma união de dois pecadores com suas bagagens, suas percepções, seus pecados, suas dificuldades e limitações, o dia a dia do casamento imperfeito pode ser difícil. Num capítulo chamado “O casamento cristão”, em sua obra Cristianismo puro e simples, C. S. Lewis escreve:

“As pessoas tiram dos livros a ideia de que, se você casou com a pessoa certa, viverá ‘apaixonado’ para sempre. Como resultado, quando se dão conta de que não é isso o que ocorre, chegam à conclusão de que cometeram um engano, o que lhes daria o direito de mudar — não percebem que, da mesma forma que a antiga paixão se desvaneceu, a nova também se desvanecerá.”

Percebe como os relacionamentos de hoje agem por meio de sentimentos, impulsos de paixão e não por meio de um amor comprometido em todas as estações da vida?

Quando os sentimentos parecerem se esgotar — e vão, ainda mais em fases que são assustadoras — o marido e a mulher devem se lembrar que a essência do casamento está no fato de ele ser uma promessa de amor futuro, e não um termômetro do sentimento presente. Tim e Kathy Keller trazem um conselho que guardo até hoje:

“Realize as ações de amor, apesar da ausência de sentimentos. Talvez você não se sinta carinhoso, solidário e desejoso para agradar, mas em suas ações deve ser carinhoso, compreensivo, disposto a perdoar e a ajudar. E, se o fizer, com o passar do tempo essas fases de “estiagem” não apenas passarão, mas serão menos frequentes e profundas, e você se tornará mais constante em seus sentimentos. É isso que pode acontecer quando você toma a decisão de amar.”

À primeira vista, pode até parecer algo mecânico demais para se fazer. Mas não se trata de meras ações. Paulo diz que “Maridos, cada um de vós ame a sua mulher, assim como Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela.” Ele também ordena que pensemos enquanto agimos.

Cristo não se entregou na cruz porque éramos encantadores e agradáveis a Ele. Naquela rude cruz, em agonia, ele olhou para nós que o negamos, abandonamos e traímos, e ele permaneceu. Esse é o maior ato de amor de toda a história.

Em tempos de relacionamentos tão vazios de significado e voláteis, em Cristo, encontramos a rocha para sustentar a família. Em contextos nos quais sentimentos e ações autocentradas guiam corações confusos, em Jesus, temos o modelo e o poder para amarmos e edificarmos nossos lares em um amor que serve um ao outro. Em meio às tempestades que aparecem nas estações mais difíceis e desérticas, temos o Espírito pairando sobre nós, nos consolando e nos capacitando a suportar e permanecer. E, nessas tempestades, vemos o sopro do Senhor conduzindo-nos para a direção certa.

Jesus Cristo morreu na cruz não porque éramos seres agradáveis, mas porque ele assim o fez para nos tornar agradáveis. Ele permaneceu, e nEle o marido e a mulher podem permanecer também.

Quando terminei de ouvir o episódio do podcast citado, pensei como seria a vida dessas entrevistadas se elas tivessem o Evangelho como centro de suas vidas, em vez de viver suas vidas a partir de seus sentimentos, desejos e autoverdades. Pensei também na oportunidade que os casados têm de mostrar casamentos imperfeitos, com a união de dois pecadores sendo transformados à imagem de Cristo. Seria um verdadeiro testemunho de um amor comprometido e frutífero, refletindo o projeto divino de Deus para a família.

Fontes usadas:

  • KELLER, Timothy. O Significado do Casamento. São Paulo: Editora Vida Nova, 2013.
  • LEWIS, C. S. Cristianismo puro e simples. Tradução de Gabriele Greggersen. São Paulo: Martins Fontes, 2012. (Nota: O trecho mencionado está no capítulo “O casamento cristão”, em inglês: Mere Christianity).

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