Deus Proverá o Cordeiro (Sobre Isaque)

Em um tempo como o nosso, em que habilidades como liderança e altruísmo parecem constituir parte fundamental da receita do sucesso, como nos sentimos quando temos que obedecer? E se, além disso, não sabemos o que nosso superior planejou para a nossa trajetória? Como barco à deriva, em que somos convidados a remar sem ter ciência do destino, será que nos sentimos confortáveis? Mas e se o capitão é Deus? É sobre esse desafio que te convido a refletir hoje.

A história de Isaque começa a ser contada cerca de 25 anos antes de seu nascimento. Seu pai, Abraão, já em idade avançada, recebeu de Deus a promessa de um filho, a partir de quem surgiria uma nação numerosa como as estrelas no céu. Sua mãe, Sara, já era idosa e o tempo biológico de engravidar havia passado.

Os fatos não eram favoráveis ao cumprimento da promessa, mas Abraão creu contra a esperança (Rm 4.18) e o Senhor, fiel em sua essência, tornou realidade suas palavras – o bebê nasceu. Isaque, como o próprio nome anuncia, trouxe riso àquela casa!

“E disse Sara: Deus me deu motivo de riso; e todo aquele que ouvir isso vai rir-se juntamente comigo” (Gn 21.6).

Sim, Sara, nós nos alegramos por ver que Deus cumpre suas promessas e não se esquece dos seus. Por quanto tempo você e Abraão não devem ter lamentado por não terem filhos? Quantos sonhos e planos deixariam de ser concretizados? Talvez se lembrar da promessa divina e deparar-se com a realidade oposta fosse cruel, mas vocês permaneceram firmes.

O nascimento miraculoso de Isaque nos encoraja a crer em Deus e esperar pelo riso que vem pela manhã, pela a notícia boa ao abrir uma mensagem, mesmo quando tudo ao redor aponta para o contrário. Nosso Pai é poderoso para cumprir suas promessas e fazer o impossível, Ele ainda está no trono do universo dirigindo todas as coisas soberanamente.

O menino cresceu e, um dia, foi chamado pelo pai para irem juntos fazer um sacrifício ao Senhor em outra cidade, caminho de três dias. Obediente, arrumou suas coisas e eles seguiram rumo à terra de Moriá, acompanhados de dois servos. O filho levava a lenha, e o pai o fogo e o cutelo. Percebendo que faltava o cordeiro a ser imolado, Isaque questiona Abraão que se restringe a dizer que o Senhor haveria de prover.

Chegando ao lugar designado, Abraão fez um altar sobre o qual colocou Isaque amarrado e pegou o cutelo para sacrificá-lo. Não dá pra imaginar o sentimento do garoto ao perceber que havia carregado a lenha que serviria de palco para sua própria morte – ele era a oferta. Mas antes que a faca chegasse ao seu pescoço o Senhor intervém e diz que aquilo era um teste no qual o patriarca havia sido aprovado: ele mostrou que amava o seu Deus mais que o tão aguardado filho da promessa. Um carneiro aparece preso nos arbustos para substituir o menino no momento do holocausto.

Isaque confiou em seu pai quando este disse que o Senhor haveria de prover o cordeiro e foi obediente quando, com o corpo amarrado, percebeu que ele era o sacrifício. Como um jovem rapaz não se rebelou ou questionou, mas se submeteu até à morte. Isso nos faz pensar sobre como reagimos quando o Senhor pede duras coisas de nós. Nem sempre é fácil nos entregarmos totalmente à vontade divina, anularmos nossos sonhos e confiar em nosso Pai, aquele que nos ama com amor eterno. Confiança e obediência são virtudes que se desenvolvem nos árduos momentos que a vida traz.

Isaque testemunhou aqui uma lição preciosa de que Deus deve ocupar o centro de nossas vidas e orientar todos os nossos passos. A fé de que o pai tanto falava, tornou-se visível ali no monte Moriá: Deus era mais importante que o tão aguardado filho da promessa e importa, antes, obedecê-Lo. O Senhor é melhor que qualquer outra coisa ou pessoa, mesmo que essas sejam frutos de sonhos que cultivamos a vida toda. A forma saudável de sermos amados por alguém se dá quando este ama a Deus em primeiro lugar.

Ainda nesse episódio, Isaque aponta para Cristo que seguiu como ovelha muda para o matadouro, sabendo quão sofrida seria sua morte, submisso à vontade do Pai. Antes disso, aquela lenha estava preparada para nós, mas o Cordeiro de Deus assumiu nosso lugar e sofreu a sentença de nossos pecados. Ele é nosso substituto, o sacrifício perfeito que nos livra da condenação eterna.

O tempo passou e, estando Abraão com idade avançada, chamou seu servo e pediu que fosse até sua terra natal encontrar uma esposa para seu filho, pois não era da vontade do Senhor que o rapaz se unisse com uma cananéia, mas com alguém de seu próprio povo. Rebeca foi a escolhida e, aos 40 anos, Isaque se casou.

Mais uma vez a obediência e a submissão aos comandos do pai são ressaltados na história. Isaque confiou na sabedoria da escolha de Abraão. Nossos pais terrenos são pecadores imperfeitos e às vezes falham em alguns conselhos, ou não os dão baseados na perspectiva bíblica. Mas temos um Pai celeste que detém todo o conhecimento e tem para seus filhos caminhos de paz e não de mal (Jr 29.11).

Nesse momento você poderá se perguntar: como ouvir a voz de Deus? Não há fonte mais segura que a Bíblia, a Palavra que Ele deixou escrita para nós. Nela encontramos respostas e princípios norteadores para o que enfrentamos. Todas as nossas situações podem ser analisadas sob sua perspectiva.

 “Depois da morte de Abraão, Deus abençoou a Isaque, seu filho” (Gn 25.11a).

Isaque herdou a bênção que o Senhor havia derramado sobre seu pai e foi próspero na terra, tornando-se um homem rico e poderoso. A presença de Deus era tão nítida na vida dele que as pessoas a reconheciam (Gn 26.26-29). Acredito firmemente que o melhor legado que podemos deixar nesta terra é o de uma vida totalmente entregue ao Salvador, exalando o bom perfume de Cristo.

Isaque permaneceu na aliança porque seu pai o havia instruído ao longo da vida com palavras e atitudes. Isso nos leva à reflexão: o que temos ensinado aos nossos filhos ou àqueles que convivem conosco? Será que nossa vida motiva outros a seguirem Jesus Cristo? Temos responsabilidade sobre os que estão em nosso convívio, precisamos nos atentar ao tipo de exemplo que estamos dando e aos valores que temos transmitido.

Após o casamento, o entrave enfrentado pelos pais se repete agora na história de Isaque: Rebeca era estéril. Mais uma vez, a promessa de uma descendência numerosa parece encontrar um obstáculo. Ele ora ao Senhor que lhes concede não apenas um filho, mas gêmeos – Esaú e Jacó, após 20 anos de casados.

Desde o ventre, Deus havia dito que o mais moço seria maior que o mais velho (Gn 25.23). Esaú tornou-se um bom caçador e Jacó um homem pacato que habitava em tendas. Rebeca amava este e Isaque amava aquele porque se saboreava de suas caças. Esse favoritismo dos pais desencadearia problemas familiares.

Estando Isaque já velho e sem enxergar, chamou Esaú, pediu que lhe preparasse uma comida saborosa e lhe trouxesse para que o abençoasse. Naquela época, quando alguém se encontrava à beira da morte era costume abençoar o primogênito, que se tornava o principal herdeiro da fortuna da família – no caso da família da aliança, incluía a promessa de Deus a Abraão de uma descendência numerosa e posse da terra. Tal bênção era proferida somente uma vez e não podia ser transferida.

Rebeca ouviu a conversa e traçou um plano com Jacó, para que ele se passasse pelo irmão e recebesse a bênção em seu lugar. Foi o que aconteceu. Isaque reconheceu que a voz era do filho mais novo, mas as mãos cheias de pêlos eram parecidas com as do mais velho. Baseando-se nisso ele o abençoou.

Tendo Jacó acabado de sair, Esaú chegou com tudo pronto para o pai, mas era tarde demais. Eles se comoveram muito, todavia não era possível voltar atrás ou dar uma bênção semelhante ao outro filho. Esaú passou a odiar o irmão por conta do episódio e ameaçou matá-lo após a morte do patriarca.

No fim de sua vida Isaque teve que lidar com a guerra em sua própria família. Jacó fugiu para a casa dos parentes de sua mãe e anos depois os irmãos se reconciliaram. Não podemos mensurar a tristeza de Isaque por não ter dado a bênção ao filho do seu amor, mas percebemos aqui que o Senhor é poderoso e nenhum dos seus planos pode ser frustrado (cf. Jó 42.2). Os meninos ainda estavam no ventre e Ele anunciou que o mais velho serviria ao mais moço. Isso era parte do seu grandioso plano.

Não adianta tentarmos fugir da presença de Deus ou fazermos as coisas conforme a nossa vontade, contrariando a dEle. A atitude de Jacó trouxe-lhe muitas consequências, posteriormente ele foi enganado por seu sogro e até por seus filhos, sentindo na pele o que fez seu irmão passar. Mas também isso foi usado para que o propósito soberano do Senhor fosse levado adiante. Ele governa cada detalhe e vê o fim desde o começo.

Isaque foi o filho da promessa, amado e bem cuidado, aquele que trouxe riso a seus genitores. Foi escolhido para ser parte do povo santo, herdou a fé de seu pai a ponto de o próprio Senhor se identificar como o Deus dele:

“Eu sou […] o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó” (Ex 3.6).

Comparada à dos outros dois patriarcas, a história de Isaque é a que ocupa o menor número de capítulos e a que transcorre com menos provas e testes. Todavia, do mesmo modo que esses, ele também fez parte do plano de redenção do Senhor, foi usado para que o bom propósito se cumprisse e culminasse com a vinda de Cristo. Deus usa diferentes pessoas e contextos, pois a verdade é que a grande história é sobre Ele.

A vida cristã nem sempre é marcada por acontecimentos grandiosos e fatos de tirar o fôlego, mas é construída no cotidiano. Fé, obediência, confiança se desenvolvem através da vida comum. Deus é glorificado no ordinário.  

“Porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. A ele, pois, a glória eternamente. Amém!” (Rm 11.36)


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