Deus Conosco Desde o Princípio (Cristo no Antigo Testamento)

Nessa última série de textos do ano, trataremos acerca da Pessoa de Jesus Cristo. Nosso desejo é que você conheça mais sobre o nosso Salvador neste mês em que as pessoas ao redor do mundo recordam seu nascimento. Embora não se saiba a data exata em que Cristo se fez homem, a despeito do forte apelo comercial pelo qual esse período é marcado, é fato que Jesus nasceu. O Verbo se fez carne. O Messias prometido veio ao mundo. A promessa se cumpriu. Glória a Deus nas maiores alturas pela salvação da condenação eterna e pela restauração do relacionamento com o Pai realizados por intermédio de seu Filho!

Basta fazer uma rápida pesquisa entre os cristãos sobre qual a parte preferida da Bíblia e a maioria das respostas conterá livros do Novo Testamento. A justificativa geralmente é que falam sobre esperança, graça e Jesus. Mas será que Ele só aparece nessa porção das Escrituras? Após a promessa de sua vinda em Gênesis 3.15 houve um silêncio que só foi quebrado com seu nascimento no evangelho de Mateus?

Após a queda do homem e a proferição de maldições sobre o casal e o diabo, o Senhor fez a promessa de que viria Aquele que restauraria de forma perfeita a relação entre criaturas e Criador. Desde então, o povo de Deus passou a viver na expectativa da iminente chegada do Salvador. Embora Jesus tenha vindo à Terra em forma humana muitos séculos depois, nesse ínterim Ele apareceu de forma visível, em certos momentos, a pessoas específicas.

Teofania é o termo teológico que trata das manifestações visíveis de Deus ao homem no Antigo Testamento. Considerando que: 1) ninguém pode ver a face do Senhor e continuar vivo (Ex 33.20); 2) pessoa alguma jamais viu a Deus, Jesus o revelou (Jo 1.18); 3) quem vê o Filho vê o Pai (Jo 14.9); 4) Cristo é a imagem do Deus invisível (Cl 1.15) e 5) o Filho é a expressão exata do ser de Deus (Hb 1.3), muitos teólogos afirmam que é o próprio Cristo pré-encarnado quem aparece aos homens nos textos do Antigo Testamento, devendo-se, portanto, falar em cristofania.

Algumas menções sobre o Anjo do SENHOR se referem à 2ª Pessoa da Trindade – Jesus.  A maneira mais segura de identificá-las é recorrendo ao texto bíblico original, no qual a palavra traduzida para Anjo pode se referir ou ao Senhor, ou a um mensageiro enviado por Ele. Além disso, é preciso analisar o contexto e constatar se os atributos e o desenrolar da história podem ser aplicados ao Senhor. Por exemplo, Ele recebe adoração, os anjos, criaturas de Deus, não (Ap 22.8,9).

Mais importante que distinguir a forma como Cristo se revela é compreender a mensagem que é transmitida. Ele tem sempre um propósito em tudo o que faz. Não há consenso entre os estudiosos sobre a quantidade exata de cristofanias que ocorreram no Antigo Testamento, mas é fato que o Messias se apresentou a alguns servos antes de sua encarnação. O intuito aqui não é proceder a uma análise pormenorizada de cada passagem, mas evidenciar as principais aparições do Cristo pré-encarnado.

Antes do período dos patriarcas, temos relatos de Deus se comunicando e a ênfase recaindo apenas em sua voz (Gn 6.3,7, 13; 12.1). Após fazer a aliança com Abraão, o Senhor passa a aparecer ao homem (Gn 12.7).

“No todo, podemos dizer que a revelação, enquanto que aumentando em frequência, ao mesmo tempo se torna mais restrita e guardada em seu modo de comunicação. A sacralidade e a privacidade do sobrenatural começam a se fazer sentir.” (Geerhardus Vos em Teologia Bíblica – Antigo e Novo Testamentos)

Em Gênesis 16.7, após ter concebido de Abraão e fugir de sua senhora Sara, a serva Agar é encontrada pelo Anjo do Senhor, que a acode em sua aflição e promete que terá um filho. O texto bíblico diz que,

“então, ela invocou o nome do Senhor, que lhe falava: Tu és Deus que vê; pois disse ela: Não olhei eu neste lugar para aquele que me vê? Por isso, aquele poço se chama Beer-Laai-Roi; está entre Cades e Berede.” (Gn 16.13,14).

O Anjo aqui é o Senhor Jesus reconhecido e adorado por Agar. Ele é aquele que vê e está sempre atento às necessidades de seu povo. Em última análise, no contexto da antiga aliança, Cristo tem ciência do estado de miséria em que seu povo se encontra por causa do pecado e virá redimi-Lo em breve.

Moisés foi visitado pelo Anjo do Senhor que apareceu no meio de uma sarça ardente (Ex 3.2-6) para comissioná-lo a libertar o povo de Israel da escravidão do Egito. Posteriormente, em Êxodo 14.19, o Anjo os conduz e protege na libertação em direção ao mar Vermelho.

Já nos profetas, temos o episódio em que Isaías tem a visão do Senhor assentado sobre um alto e sublime trono (Is 6.1-5) chamando-o para ser seu representante perante os povos. Ele exclama que seus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos.  

As aparições a Moisés e Isaías nos comunicam que Jesus é aquele que chama, em todas as épocas, discípulos para aprenderem com Ele e serem seus imitadores, seguindo pelo caminho designado por Deus Pai. Por meio de seu sacrifício, Ele guia seu povo em segurança, em meio aos perigos da jornada até a Jerusalém celestial.

Passando à Babilônia, quando os amigos de Daniel não quiseram se prostrar ante o rei Nabucodonosor, este os lançou na fornalha ardente aquecida sete vezes mais. Eles não se queimaram e foram vistos passeando dentro do fogo acompanhados de um quarto homem, “semelhante a um filho dos deuses” (Dn 3.25). Ele é identificado como sendo Jesus.

O povo de Israel estava amparado por Cristo. Embora Ele viesse séculos mais tarde, não estavam sozinhos.  O Homem que andou com aqueles jovens naquele momento de aflição é o Emanuel, que está conosco todos os dias, até a consumação dos séculos. Ele caminha conosco.

Em Malaquias 3.1 temos uma promessa:

“Eis que eu envio o meu mensageiro, que preparará o caminho diante de mim; de repente, virá ao seu templo o Senhor, a quem vós buscais, o Anjo da Aliança, a quem vós desejais; eis que ele vem, diz o Senhor dos Exércitos.”

O Anjo da Aliança é identificado por Deus Pai como sendo o Senhor Jesus Cristo que virá para seu povo, o qual o aguarda. Cerca de 400 anos se passaram desde que essa palavra foi proferida até que em Belém de Judá, nasceu o Messias prometido e aguardado. Agora ele não era mais uma imagem ou um lampejo, mas veio encarnado o Descendente da mulher que esmagaria a cabeça da serpente.

Esses são alguns exemplos de cristofanias. Há outros textos que falam sobre o Anjo do Senhor, mas ainda existe a dificuldade de se chegar a um consenso no que diz respeito a se tratar ou não do nosso Senhor Jesus Cristo.

Por que essa foi uma das formas nas quais Cristo escolheu se manifestar no Antigo Testamento?

Fica claro em Gênesis que o propósito do Senhor ao criar o ser humano é se relacionar com ele. Com a queda, essa convivência ficou comprometida, uma vez que os pecados fazem separação entre Deus e o homem (Is 59.2). O Senhor fez a promessa de redenção e, na sequência, estabeleceu alianças com seus servos, reafirmando seu compromisso.

Conhecendo a falibilidade da raça humana e a constante necessidade de relembrar seu povo das promessas feitas, Deus Pai sempre procurou meios de estar com ele durante a jornada, inclusive para livrá-lo de se desviar do caminho.

Jesus, ao vir até seu povo, evidencia que é sua propriedade e, portanto, cuida dele com atenção. Os eleitos da Antiga Aliança estavam seguros nAquele que no tempo futuro viria de uma vez por todas resgatar o Israel espiritual a preço de sangue. O Bom Pastor que não permitiria que ninguém os arrebatasse de suas mãos (Jo 10.28,29).

Em todas as eras podemos ver Cristo trazendo para Si aqueles que o Pai lhe deu, aproximando-se deles e atraindo-os com laços de amor e benignidade. Em sua multiforme graça Ele se tornou acessível ao ser humano, de modo que sua grandeza pudesse ser apreendida pela pequenez e limitação de seus servos.

Ele apareceu de forma esporádica e breve a poucas pessoas em períodos de tempo espaçados porque a revelação de Deus se dá de forma gradual. Conforme sua vontade soberana Ele se apresenta e se deixa conhecer pelos seus. No Antigo Testamento ele prepara o povo, constrói o cenário para a vinda do Filho e, enquanto faz isso, permite que se tenha amostras de como será, clareando o entendimento. Tudo o que acontece é sombra do que está por vir, isto é, da encarnação.

É preciso ressaltar que na cristofania Jesus assume a aparência angelical ou humana, mas não se torna homem e nem é um anjo. Ele era, é e sempre será Deus. Essas manifestações são um prenúncio de que o povo não pode salvar a si mesmo, a salvação vem de fora.

“Deus aplica a obra de Jesus tanto no passado quanto no futuro. Eles creram na promessa futura; nós confiamos na promessa cumprida” (R. C. Sproul , Estudos bíblicos expositivos em 1 e 2 Pedro).

Cristo é Deus conosco desde o Éden, passando pelo hoje e seguindo em direção à Nova Jerusalém. É Ele quem garante:“E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século.” (Mt 28.20)


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