Casamento: O Divórcio à Luz da Bíblia

O divórcio é uma realidade presente em nossa sociedade, por causa do pecado original, e é um processo sempre bastante doloroso, confuso e profundo para todas as partes envolvidas. Tentaremos explorar neste artigo os ensinamentos de Jesus nas Sagradas Escrituras quanto ao tema. A perspectiva bíblica será a única abordagem aqui tratada.

O Plano Original para o Casamento

A Bíblia apresenta o casamento como a primeira instituição divina, criada para ser uma união duradoura e íntima entre um homem e uma mulher. No livro de Gênesis, encontramos o relato da criação do primeiro casal humano, Adão e Eva. Deus os uniu e estabeleceu o casamento como uma parceria vitalícia, baseada no amor, respeito e cuidado mútuo.

O ideal de Deus para o casamento definido em Gênesis 1 e 2, continuou a definir o padrão para as responsabilidades de marido e mulher um para com o outro ao longo da história da humanidade. Porém, a Queda alterou o relacionamento conjugal para sempre. O ideal divino de casamento foi rompido pela poligamia, pelo adultério, pela falta da diferenciação do papel de cada um, pela falta de estabelecimento correto de prioridades e pelo divórcio. 

A Bíblia nos ensina sobre o divórcio reconhecendo o potencial de falha dos homens e de sua facilidade em pecar no tocante às relações matrimoniais. No Antigo Testamento, a lei mosaica exigia o divórcio quando se tratasse de porneia, ou seja, um comportamento indecente ou imoralidade sexual. Vemos isso em Deuteronômio 24:1-4.

O Ensino de Jesus e do apóstolo Paulo sobre o Divórcio

No entanto, quando Jesus veio ao mundo, ele trouxe um entendimento mais profundo sobre o casamento e o divórcio. Em Mateus 19:3-9, o Mestre foi questionado pelos fariseus sobre a licitude do divórcio, e sua resposta ressaltou a importância de preservar a sacralidade e a indissolubilidade do casamento.

Jesus declarou: “Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem” (Mateus 19:6). Ele ensinou que o divórcio não é a vontade original de Deus, mas foi permitido por causa da dureza de coração das pessoas. Jesus não disse que o divórcio deve ser obrigatório, mas o permitiu caso o marido ou a esposa cometam adultério.

Ainda no Novo Testamento, Paulo também ensina que o divórcio pode ser a solução para quando o cônjuge não cristão abandona seu marido ou esposa. Paulo diz que “todavia, se o descrente separar-se, que se separe. Em tais casos, o irmão ou a irmã não fica debaixo de servidão; Deus nos chamou para vivermos em paz” (1 Coríntios 7:15).

O ideal seria que somente no caso de adultério a igreja seguisse os ensinamentos de Jesus e permitisse o divórcio. Mas, o que dizer de mulheres, ou homens,  que sofrem com relacionamentos abusivos e muitas vezes violentos? Como lidar com essas situações?

A Bíblia não traz nada em seus textos sobre o tema do abuso doméstico, de forma direta, mas como disse Francine Veríssimo Walsh, em seu livro “Ela à imagem dEle”, o coração de Deus é revelado em sua Palavra e podemos confiar que ele nos deixou nela orientações suficientes para tratar assuntos cinzentos como este.

Ao olhar a passagem de Efésios 5 vemos que o marido deve amar a esposa como Cristo amou a Igreja, e que a esposa deve se submeter ao marido da mesma maneira que a Igreja se submete a Cristo, ou seja, em amor. Note, que nada é dito sobre se submeter ao relacionamento abusivo e à violência de uma das partes. Deus quer que seus filhos vivam em paz, e não se sujeitando a maus tratos e outros malefícios que o pecado pode lhes trazer. Como Igreja, não devemos permitir que nossos irmãos vivam em situações de abuso. Devemos, sim, reconhecer que Deus odeia o divórcio, mas ele odeia todo e qualquer pecado, assim como o da manipulação e abuso. Por outro lado, Deus ama o casamento, mas ama ainda mais seus filhos e filhas.

Perdão e reconciliação

A abordagem bíblica do divórcio é profundamente enraizada no perdão e na reconciliação. Deus deseja que os casais se reconciliem, superem suas diferenças e trabalhem na construção de um casamento saudável e próspero. O divórcio não deve ser encarado como a única solução. Ele é uma evidência clara do pecado da dureza do coração. Ele não é o ideal de Deus para o homem e para a mulher. 

Para que a reconciliação aconteça, então, o arrependimento é necessário. Ele muda a situação. O reverendo Hernandes Dias Lopes diz que “o arrependimento é a disposição íntima de mudança e a determinação de voltar à aliança conjugal feita diante Deus”. Onde há arrependimento e perdão, não há divórcio. O perdão é muito melhor que o divórcio (novamente – casos de abuso se tornam a exceção a essa regra. Recomendamos a leitura do livro “Refúgio Bem Presente”, de Hannah Fordice, para aprofundamento).

Em Lucas 17.4, Jesus nos ensina sobre o caráter do perdão. Ao dizer que devemos perdoar sete vezes, ele nos mostra que o perdão deve ser ilimitado. E isto não é natural em nós. Nenhum de nós gosta de perdoar quem falha conosco. A nossa tendência natural é a da vingança. Acontece que perdão limitado não é perdão. O Salmo 103 diz que Deus não nos trata conforme nossas transgressões. Ele é rico em misericórdia. Jesus, ao nos ensinar a orar, diz que devemos perdoar nossos ofensores do mesmo modo como o Pai perdoa as nossas falhas. Sem um espírito de perdão, é impossível agradar a Deus. Por isso, o perdão é o melhor remédio para as tensões conjugais, não o divórcio.

O perdão é restaurador. O casamento simboliza a relação de Cristo com sua Igreja. Quando a Igreja peca, Cristo não nos abandona. Ele nos perdoa, nos restaura por completo. Esse perdão supera todas as dores, restaura o relacionamento desfeito e cura o coração.

Cuidando da comunidade

A igreja deve ser uma comunidade de cura para as feridas abertas do coração. Tratar os casais com legalismo e rigor não deve estar em pauta na agenda da igreja. Os fariseus agiam assim, mas Jesus agia de forma diferente. Jesus tratou uma mulher adúltera sem colocar mais peso de culpa em cima dela. Ela já havia sido humilhada o bastante sendo levada ao apedrejamento. Mas ele revelou os pecados de seus acusadores confrontando-os e dizendo-lhes: “Se algum de vocês estiver sem pecado, seja o primeiro a atirar pedra nela” (João 8:7). Que possamos ser, como Igreja, o lugar que os pecadores possam encontrar aceitação, perdão e reconciliação.


Bibliografia

LOPES, Hernandes Dias. Casamento, divórcio e novo casamento. United Press, 2005.

WALSH, Francine Veríssimo. Ela à imagem dele: a identidade feminina à luz do caráter de Deus. Episteme, 2022.

KOSTENBERGER, Andreas J. Deus, casamento e família: reconstruindo o fundamento bíblico. Vida Nova, 2015.


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